Capítulo 2

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ELLIE

Não sei dizer quanto tempo permaneci apagada.

Éffie, penso. Por quê? Como? Isso não deveria acontecer. Como pude permitir?

Em intervalos esporádicos, consigo escutar uma voz fina tagarelando ao redor.

Ainda imersa em uma espécie de limbo, meio adormecida, meio acordada, sinto vozes me trazerem de volta para a realidade.

— Lucy, me empresta o vidro com a pomada? – ouço a estridente voz feminina pedir.

Uma tampa é desenroscada e uma substância formigante e pastosa entra em contato com uma área dolorida logo abaixo do meu tórax.

Uma lâmpada incandescente ilumina o ambiente. Pisco para me acostumar com a claridade. Vejo uma garota loura sentada de pernas cruzadas, com meias de abacaxis sorridentes que sobem até as panturrilhas.

É a garota loura daquele dia. A luz ambiente reflete em seus olhos de duas cores. Está concentrada em espalhar uma espécie de creme na minha barriga, não percebendo que despertei. 

Ao seu lado, uma menina de cabelos escuros e lisos a auxilia, em silêncio. Ela tem um olhar doce e um sorriso gentil. Seu rosto é fino e ela é bem mais magra que a garota loura. Usa um grande laço vermelho preso atrás da cabeça e um avental sobre seu vestido também vermelho.

Tento me mover, mas então percebo que meus braços estão amarrados à cabeceira da cama. Desesperada, começo a me espernear, tirando a loira de sua concentração.

— Graças aos espíritos você acordou, já é a terceira vez que tenho que renovar essa pomada – diz ela, sorrindo.

Continuo a tentar me soltar.

 — Desculpe por isso. - Ela me desamarra cuidadosamente. - Suas unhas são afiadas, gata.  

— O-onde...estão meus irmãos? – Massageio os pulsos, minha voz rouca graças à falta de uso. – O que a Graça...

Uma fisgada abaixo do tórax me interrompe. A garota loura gira uma de suas pulseiras de pedras verdes ao redor do pulso, nervosa. E, então, enrosca o vidro em suas mãos e me explica a história.

Estávamos, de fato, em uma área próxima ao Norte, mas não em uma fazenda ou em alguma expedição idiota. E que meu irmão, Éffie, não conseguiu chegar conosco.

Reparo em como ela evitou a palavra morte.

Desnorteada, escondo o rosto nas mãos. Meu irmão mais velho sumiu. Levado, como disse a garotinha.

E eu estava com raiva dele por aquela razão idiota. Agora, eu o perdi para sempre. Acabou. 

— Não conseguiram encontrá-lo em lugar algum. - Compadece-se a menina. - Sinto muito, Ellie.

Ergo o olhar, disfarçando meu desalento.

— Como sabe meu nome?

— Ouvi de seu irmão.

— E onde estou agora? – Pergunto.

Ela me estende a mão. Receosa, hesito em retribui-la.

— Acho que não me apresentei ainda. - Sorri a garota. - Sou Maribel, e esta aqui é a Lucy.

Lucy acena para mim, tímida.

— Ela não é de falar, não repare. – Ri Maribel.

— Oi – cumprimento, e então aponto para o vidro nas mãos de Maribel. – O que é isso?

— Um extrato feito de plantas medicinais.

Sinto outra pontada em meu ferimento e estremeço, precisando me apoiar na parede para não desfalecer.

O País das Crianças Perdidas - O Príncipe de ObumbratioOnde histórias criam vida. Descubra agora