Parte 9

244 42 0
                                    

Um silêncio breve se fez, mas ainda que a frase parecesse terrível, não adiantaria agir sem pensar, então a loira apenas assentiu e voltou a falar no mesmo tom.

— Então precisamos de um momento em que você não esteja presente para irmos até Themyscira e resgatar a Kara — completou Sara — A Gideon cuidará dos ferimentos dela.

— Ela estava comigo o tempo inteiro — a morena tentava lutar contra seu cérebro pela dificuldade de raciocínio.

— Não tem nenhum momento em que ela esteja sozinha?

— Tem — Diana suspirou pesadamente, como se suas palavras fossem quase doloridas ao serem pronunciadas, ainda que tenha tentado disfarçar — Depois que o meteóro caiu. Uns dois dias depois eu tive que deixá-la para que pudesse descansar.

• Themyscira 1500 a.c. •

Diana disse que preferia fazer o que tinha que fazer sozinha, mas as lendas seguiram logo atrás dela com cautela,  enquanto caminhava pela ilha em direção a Hipólita. Não tinha muitas diferenças da princesa de Themyscira, exceto pelo corpo mais forte e a expressão mais séria de uma mulher que já havia visto muito do mundo.

Ela andou com passos lentos e apesar de vestir sua armadura, não carregava nenhuma arma, não estava lá para lutar.

As amazonas estavam impressionadas com a enorme nave pousada na praia, mas a rainha tinha o olhar firme em sua filha. A morena se aproximou e se curvou em um movimento lento e sutil diante dela, dizendo suas palavras em um quase sussurro com a cabeça ainda baixa.

— Peço sua permissão para entrar em Themyscira e resgatar Kara Zor-El perdida em seu reino — seus olhos se voltaram aos azuis da mulher séria a sua frente, a espera de uma resposta que demorou algum tempo, tentando não desmoronar com o pensamento de que aquela era sua mãe.

— Por que Diana — a resposta havia sido outra pergunta, com seu nome pronunciado com muito mais "sotaque" em um audível "Daiana", Hipólita não disfarçava o desgosto e a tristeza em sua voz.

— Fora daqui quase não há guerreiros, as pessoas não lutam por suas vidas e são ainda mais frágeis do que nós. Pessoas más tomam suas vidas sem que tenham chance de se defender. Mãe, eu precisava ajudá-los, precisava lutar pelos que não são capazes de lutar por si mesmos, precisava salvá-los porque eu posso fazer isso — baixou o olhar outra vez, engolindo a seco — Não espero que compreenda, mas espero que me perdoe.

— Como sua mãe, eu estou muito orgulhosa pelo que você se tornou. Como Rainha de Themyscira, você está permanentemente banida, por ser a próxima ao trono e ter abandonado seu reino, Princesa Diana. Você não é mais uma de nós!

Desta vez foi a resposta da morena que demorou, ela juntou as sobrancelhas em um semblante ainda mais sério de quem internamente reprimia sua dor.

Sua voz voltou grave e forte, como se a própria Mulher Maravilha houvesse retornado naquele momento.

— Não neste tempo! Aqui e agora eu ainda tenho passagem livre.

— Permissão concedida — foi só o que a rainha respondeu, evitando um combate doloroso com a filha.

Diana seguiu para o interior da ilha diretamente para a sala onde sabia que estaria o corpo da garota de aço, mesmo sem saber ao certo se estava, ou não com vida, já que suas lembranças ainda eram confusas.

Os outros, que estavam distantes, aos poucos se aproximavam também ao verem que a entrada era permitida.

Capitã Lance se aproximou da loira alta que certamente era alguém importante, aparentemente a comandante das guerreiras amazonas.

—  Um lugar cheio de mulheres lindas! Lugar lindo, a propósito! Eu sou Sara Lance, a capitã das... Nós somos...

— Viajantes do tempo — respondeu a mulher, apertando a mão de Sara em um breve sorriso apenas por educação ao sorriso galante da outra loira que a olhava dos pés a cabeça — Eu sou Hipólita, rainha de Themyscira — foi direta.

Diana, ao ouvir a conversa mesmo de longe, lançou um olhar atônito para Sara por cima do ombro, como quem claramente dizia "Essa é a minha mãe!"

— Ahhh... Er... Uau — respondeu a Canário Branco com um riso que em outra pessoa seria fruto de nervosismo, mas ela de certa forma se divertia com a situação, enquanto analisava a mulher vestida com roupas de uma guerreira — Eu pensei que... Você fosse um pouco menos jovem, menos forte e menos bonita. É como as rainhas costumam ser lá fora! Desculpe pelo julgamento errado. 

Novamente milhares de lembranças invadiram a mente da amazona, enquanto caminhava para dentro do Castelo, como se todo o seu passado envolvendo Kara viesse à tona de uma só vez.

É claro que ela se apaixonou novamente, tivera outras perdas em toda a sua existência, mas o que havia acontecido em Themyscira naquele tempo era inesquecível.

Cada pessoa deixa em nós alguma marca, ela nem sempre é boa, mas o certo é que sempre acrescenta algo e é sempre diferente. Era irônico pensar no quanto havia aprendido com a garota do mundo, enquanto ela estivera na ilha e que no futuro, teve muito a ensinar a ela, mas o medo do futuro ainda a assombrava.

Diana não sabia o que iria acontecer a partir dali, não sabia sequer se ela iria acordar. E se acordasse? Como iria reagir ao que tinha acontecido no "passado"?

Fatos tão antigos para Diana, mas que faziam o presente de Kara. Era possível que ela a tratasse como outra pessoa completamente diferente, que na verdade era, depois de 3.500 anos e do contato com o mundo exterior.

Mas a Mulher Maravilha não podia pensar em nada, devia completar sua "missão" e se repreendeu por aqueles sentimentos de repente, desenterrados, embora jamais tivessem sido esquecidos. 

A sala que guardava o corpo da garota de aço era coberta de ouro com paredes cobertas de desenhos entalhados e bem no centro, uma cama, no teto havia uma abertura por onde o sol entrava diretamente contra seu peito, iluminando o símbolo da casa de El.

Ao tocá-la, Diana não sentiu seus batimentos, mas seu corpo não parecia sem vida, apesar de não respirar. A guerreira sentiu novamente a mistura de pânico com esperança, algo que não era exteriorizado por ela e correu o olhar pelo facho de luz, encarando o céu. 

"Eu sei que talvez não seja merecedora de um feito divino, já que parti deixando minha terra e minha família, dados de tão bom grado por ti, Zeus, mas em uma terra onde ninguém mais acredita em deuses e milagres, nunca deixei de acreditar a cada uma das vezes em que levantei minha espada para lutar por justiça e pelos mais fracos.

Então eu te peço, como me destes a vida, que dê a ela também e se a única forma de fazer isto for com uma troca, peço que o faça, meu pai.

O meu martírio já se prolongou por muito tempo! O fardo de ver deixarem a vida todos aqueles que já amei. A imortalidade pode ser um presente, um milagre, mas depois de algum tempo, se torna uma prisão.

Você amou uma mulher, uma mortal, sei de tua compaixão pelas criaturas da Terra e agora volto a ti para dizer que eu a amo, mas não posso salvá-la sem a sua ajuda!"

Diana segurava com força na barra de ouro maciço da cama de modo a deixá-la com a marca de sua mão, já que não era como o punho de sua espada, um poderoso metal usado por Hefesto em sua fabricação.

O facho de luz havia desaparecido e no instante seguinte, voltou com muito mais força, fazendo com que a luz ofuscasse a visão da guerreira que observava tão de perto.

O sol havia voltado ao normal e agora entrava pela abertura no teto preenchendo parte da sala como era de costume e não só o peito da loira deitada na cama.

Kara tinha voltado a respirar, seu coração novamente batia, embora não estivesse consciente. A amazona passou a mão por seu rosto, limpando uma lágrima teimosa e disfarçando qualquer vestígio de sua emoção e pegou a kryptoniana em seus braços.

Seu coração estava mais tranquilo por ter seu pedido atendido, mas ainda tinha a dor de ter que deixar o seu lar pela segunda vez. Tentou não pensar nisso e apenas agradecer por ter a chance de voltar a ver sua mãe e poder dizer a ela coisas que nunca pensou que poderia dizer, ou explicar e seguiu para a Waverider com passos lentos.

Lições de uma guerreira - Mulher Maravilha e SupergirlOnde histórias criam vida. Descubra agora