Capítulo 1 Mariah

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São Paulo, 2015
Acordo e dou um pulo da cama.
-Caramba, tô atrasada, o Marcos vai me matar!
Hoje vou visitar pela décima vez meu futuro apartamento, e o Marcos está indo comigo para checar os últimos detalhes da negociação. Se tudo der certo, em alguns dias me mudarei.
Tomo um banho correndo, e quando chego a cozinha, vejo meu pai preparando meu leite com achocolatado. Ele faz isso desde quando eu era criança, e depois que voltei a morar com eles, todos os dias meu copo de achocolatado está pronto na pia me aguardando.
Marcos já está me esperando, tomando café com nossos pais, e quando me vê, não perde a oportunidade de me azarar.
- Mari, que cara de espanto é essa irmã? Viu fantasma é? Já sei, se olhou no espelho!
Todos riem e eu faço aquele olhar fatal prá ele. Não adianta muito, mais ele entende que é para parar a brincadeira sem graça.
- Bom dia pra você também Quinho. - Eu respondo.
Pego meu leite e vou beijar meus pais que estão na mesa comendo torradas.
- Mari, estamos atrasados, toma logo esse leite e vamos. - Fala meu irmão olhando para meu copo. Ele sempre teve ciúmes de mim. Acho engraçado, mas prefiro não comentar nada, até porque ele jamais daria o braço a torcer.
Termino meu copo de leite, pego uma maçã, me despeço de nossos pais e saio com o Quinho.
No caminho para o apartamento checo meus e-mails e vejo que recebi ontem um referente ao estágio em uma grande construtora. Era o que eu queria!
Estavam marcando uma entrevista para hoje ás 14:00.
-Cacete! Não vou conseguir nem me trocar. Por que tem que ser sempre tudo corrido? - Eu comento com o Quinho, que me olhou sem entender muito bem do que se tratava, e claro, soltou mais uma.
- Se trocar prá que? Vai tirar as teias de aranha por um acaso hoje?
Dei um tapa em seu braço, mas acabei rindo. Minha quase castidade já havia se tornado piada entre nós.
- Não seu tonto! É mais importante que isso. Recebi um e-mail marcando uma entrevista para hoje, referente ao estágio na Nóbrega Fontes Construtora. Só que eu preciso passar na biblioteca da faculdade para pegar uns livros que eu havia reservado prá estudar, pois as provas vêm aí e eu não estou afim de bombar no final do semestre. Tenho que pegar hoje, senão perco as reservas. E é óbvio que não vai dar tempo de trocar de roupa, vou ter que ir de jeans e camisa mesmo. Acha que estou bem assim Quinho?
Meu irmão me dá uma bela olhada, e me arrependo na hora de ter perguntado. Lá vem outra gracinha dele...
- Bem, você já foi pior, concorda?! - E solta aquela gargalhada.
- Considerando teu passado Mari, quando você usava óculos fundo de garrafa, e parecia uma tábua, até que hoje você está bem interessante. Não usa mais óculos, tá mais cheinha, tem umas curvas... É... Tá pegável!
Meu irmão e seus comentários ácidos. Dei risada e me lembrei de como era no passado....
Realmente, hoje estou bem melhor que antes. Sou alta, 1,70m, peso 65kg, uso lentes de contato, sou morena com luzes no cabelo, gosto de moda mas não sou daquelas que usam as coisas só pela tendência da vez; uso o que me deixa confiante e confortável. Não estou mal vestida, mais preferia não estar de jeans para uma entrevista.
- Se você fala isso da sua única irmã, nem quero imaginar o que você fala dos outros. - Ele riu e eu também.
Chegamos no prédio e logo subimos ao apartamento para acertar os detalhes finais da negociação.
Acabou dando tudo certo, e acertamos que eu me mudaria em 20 dias.
- Tô tão feliz Quinho!
- Eu também tô Mari, você merece. Enfim vai ter a sua liberdade de vez. - Disse meu irmão me abraçando.
- Preciso fazer uma lista do que comprar, qual cor pintar as paredes, como decorar.....
- Ahhh Mari, já fiz minha parte, agora essa coisa chata de decorar você decide com a mamãe, chama a Roberta também.
Minha cunhada Roberta era como uma irmã mais velha, e eu sabia que ela iria me ajudar muito nas escolhas. Concordei na hora.
- A Rô está no topo da minha lista Quinho. Eu já havia comentado com ela que se desse certo iria precisar de ajuda. Vou convocar todas! Ela, mamãe e a Paty.
Paty era minha melhor amiga, e amiga da Roberta também. Aliás, nós não nos desgrudávamos.
Era fato que nós quatro juntas seria um time perfeito para decorar minha nova residência. Porém, se eu não me cuidasse, o rombo nas minhas finanças seria enorme.
Parecendo ler meus pensamentos, Quinho foi logo falando:
- As quatro juntas??? Meu Deus!!!!
- Vai explodir teu cartão de crédito. Toma cuidado Mari, depois não adianta vir chorando hein!
- Pode deixar Quinho, já estipulei um teto para gastar. Papai me ajudou a planejar. Vai dar tudo certo.
Nos despedimos na porta do prédio. Quinho foi para empresa que ele tem em sociedade com nosso pai e que ele administra, e eu fiquei esperando um táxi para ir a faculdade. O dia seria longo...
Peguei todos os livros que precisava, um peso absurdo, nem sei como vou aguentar andar com esse peso todo pra lá e pra cá. Dia de rodízio de veículo é fogo, e justo hoje que tenho entrevista.
Acabei encontrado com a Paty para almoçar e falei sobre o apartamento. É claro que ela adorou a idéia de me ajudar na decoração.
Almocei correndo para dar tempo de escovar os dentes e me ajeitar antes de enfrentar outra maratona de táxi, carregar peso de livros e tentar manter a compostura ao chegar para entrevista.
Me despedi rápido da Paty e prometi ligar á noite para nos falarmos melhor.
Paty sempre estudou comigo no colégio, e quando decidi voltar para faculdade, ela fez questão de estar ao meu lado. Será uma excelente arquiteta, mais duvido que seguirá carreira, pois vem de uma família rica e bem tradicional, e convenhamos, trabalhar não é a sua real necessidade.
Também é casada com o Tom, um cirurgião plástico famoso. Paty se dedica ao casamento. A faculdade é apenas uma distração, apesar de ter o dom para arquitetura.
Quem sabe um dia né?!
Peguei um táxi na porta da faculdade, direto para os escritórios da Nóbrega Fontes. Era um percurso de aproximadamente 20 minutos.
São Paulo como sempre estava completamente congestionada, e o que levaria 20 minutos, acabou se estendendo por quase uma hora. Ainda bem que estava preparada pra isso. Cheguei ainda faltando 10 minutos para respirar aliviada.
O edifício da Nóbrega Fontes era imponente, o mais alto da região. Fica no Brooklin, local bem conhecido por abrigar várias construtoras.
Mas a Nóbrega Fontes era diferente, era a melhor, a mais concorrida, era nela que eu queria estagiar.
Demorou para eu ser chamada para entrevista. Havia me inscrito 1 ano atrás.
Apesar de eu querer muito, eu já nem acreditava que poderia ser chamada. Fui me envolvendo nos projetos da faculdade e em procurar um novo lar, e acabei esquecendo.
Mas hoje talvez seria o dia da virada. Tô com fé que vai dar certo.
Cheguei na recepção e logo fui conduzida a sala de reuniões. Pensei que teriam mais candidatos, e ou eu estava mais adiantada no horário que os demais, ou havia me equivocado ao ler o e-mail.
Nenhuma das opções acima. A entrevista naquele horário era apenas comigo.
Quando entrei na sala, percebi o porque a Nóbrega Fontes era tão forte no mercado. O prédio, a sala de reuniões, os funcionários, tudo inspirava poder, profissionalismo. Sinto uma energia boa, sabia que iria me encaixar nesse ambiente. Era só me sair bem na entrevista. Afinal, conversar com alguém do departamento pessoal não era um bicho-de-sete-cabeças assim.
Estava confiante. Até aquela porta abrir, aquele par de olhos verdes se fixarem nos meus, e todas as minhas certezas desaparecerem no ar.

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