O cervo

21 5 18
                                    

Fechei meus olhos por um breve momento, talvez pelo que foram minutos ou horas. Despertei a tempo de ver o humano acordado tentando se soltar de alguma forma das cordas que amarrei. Observei aquela cena até que ele me notasse, o desgraçado abriu um sorriso ladino assim que me viu.

— Então a bela adormecida acordou.

O corte em seu rosto já havia estancado, mas o sangue ainda marcava sua face decadente.

— Farei duas perguntas — o ignorei. — E farei-as de forma lenta e clara para que encaixem na sua cabeça de vento.

— Seu…

— Primeiro. Existem outros de você por perto? Se sim quantos.

— Foram duas perguntas em uma.

— Você está me fazendo perder a paciência.

— Calma, calma. Se vamos fazer uma troca equivalente de informações preciso pelo menos de uma garantia que ficarei bem —  sorriu. — Você sabe, negócios.

— Você não está em condições favoráveis. — O arqueiro começou a acordar. — Tentarei deixar isso claro.

Me levantei, arrastando minha espada ainda embainhada enquanto me aproximava. Conseguia sentir o medo claro nos olhos azuis daquele homem, e senti ainda mais esse medo quando minha espada fora enfiada na cabeça de seu companheiro.

— Então deixa que eu te explique mais uma vez. Farei duas perguntas e espero que dessa vez você me responda.

— Q-que tipo de monstro é você?!

— Do tipo que faz perguntas.

Não consegui extrair nenhuma informação valiosa do homem. A cidade mais próxima estava a dois dias de viagem a pé, os companheiros dele faziam parte de uma guilda de bandidos, então sim, podem existir mais pelo caminho. Terei que redobrar o cuidado, mas pelo menos consegui algumas rações para minha viagem, a fome não seria um problema tão excruciante.

Segui pelo caminho o resto do dia, dessa vez não tive nenhum problema antes do cair da noite, então resolvi me aventurar mais uma vez e caçar algo para comer. Sim, as rações já eram o suficiente, mas toda e qualquer fonte de alimento é bem vinda. Aproveitei a besta e alguns dos virotes que consegui para tentar caçar, já que seguir os animais com uma espada não tinha dado bons resultados. Por sorte consegui acertar um cervo e o persegui por alguns quilômetros antes que caísse inerte.

Ao me ajoelhar próximo ao animal percebi que o virote estava alojado em seu pulmão. Seu peito ainda subia e descia com a respiração lenta e dolorosa, fechei meus olhos e fiz uma breve oração antes de pôr um fim ao sofrimento do cervo. Separei a carne da pele com o máximo de cuidado que consegui e então me afastei, em busca de um lugar para montar acampamento.

Me aconcheguei durante a noite, não conseguiria ter um bom sono mas teria uma boa alimentação. Acendi uma fogueira e apanhei alguns gravetos para assar a carne, nesses momentos sentia um tremendo arrependimento por não ter dado a devida atenção aos ensinamentos de minha mãe e aprendido a temperar a comida. 

Depois de me alimentar e estar devidamente acomodado, dei início a manutenção de minha espada, afiando o fio com minha pedra de amolar. Passadas longas e lentas, enquanto a água do riacho fervia ao fogo. Dessa vez, tive uma noite tranquila e ao primeiro raiar de sol, parti em viagem para a cidade, sabendo que faltava apenas um dia para ter o descanso adequado.

Caminhos de Atade: A odisseia do guerreiroOnde histórias criam vida. Descubra agora