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Felix abriu a porta da frente de seu chalé.

Assimilando a imagem perfeita da cena bucólica diante de si, ele suspirou. Todas as manhãs na pequena aldeia de Villeneuve começavam da mesma forma. Pelo menos durante todo o tempo em que Felix vivera por lá.

O sol se erguia devagar além do horizonte, com raios que faziam os campos que cercavam a aldeia ficarem mais verdes, dourados ou brancos, dependendo da estação do ano. Os feixes avançavam até tocarem as laterais impecavelmente brancas do chalé de Felix, que ficava nas imediações do povoado, antes de por fim iluminarem os telhados de palha dos lares e lojas que constituíam o restanteda aldeia. Quando isso acontecia, os aldeões já estavam se mexendo, preparando-se para o dia.

Dentro de suas casas, os homens se sentavam à mesa para as refeições matinais enquanto as mulheres cuidavam das crianças ou terminavam de preparar o mingau. A aldeia permanecia silenciosa, como se ainda estivesse despertando. Então, o relógio da igreja batia oito horas. E, como num passe de mágica, a aldeia ganhava vida.

Felix havia presenciado a cena centenas de vezes. Mesmo assim, naquela manhã, como em todas as outras, ele mais uma vez se deslumbrava ao contemplar a pequena aldeia e as mesmas pessoas cuidando de suas rotinas. Estreitando seus olhos castanhos cordiais, ele suspirou diante de quão mundano era tudo aquilo. Com frequência, ele imaginava como seria acordar de forma diferente.

O Lee balançou a cabeça.

Não lhe fazia bem deixar-se imaginar ou sonhar tanto assim.

Essa era a vida como ele sempre conhecera, a vida que ele compartilhava com o pai desde que eles haviam se mudado de Paris, muitos anos atrás. Era uma perda de tempo habitar o passado ou se perguntar o que poderia ter acontecido  

Ele tinha coisas para fazer, incumbências a cumprir e — ele olhou para baixo, na direção do livro que segurava — uma nova aventura para desvendar. Felix indireitou os ombros, fechou a porta atrás de si e partiu para a cidade.

Em questão de minutos, ele abria caminho pela rua principal de paralelepípedos e acenava conforme passava por outros aldeões. Embora tivesse morado na aldeia durante a maioria dos seus anos de vida, ele ainda se sentia como um estranho aos olhos dos outros. Lá, como na maior parte do interior rural da França, era isolado e insular. A maioria das pessoas por quem Felix passou em seu caminho havia nascido ali e a passaria toda a vida no mesmo lugar. Para eles, a aldeia era o mundo, e os forasteiros eram vistos com desconfiança. Felix não tinha certeza se ainda não seria tratado como um estrangeiro caso tivesse nascido na aldeia. Ele realmente não tinha muito em comum com a maioria dos moradores.

A verdade é que ele tinha mais prazer em ler do que em ter conversas banais e tediosas — queria era viajar para terras distantes e viver aventuras magníficas, ainda que apenas nas páginas de seus livros favoritos. Tecendo seu caminho pelas ruas, ele ouvia o restante dos aldeões cumprimentando-se. Sentiu uma pontada de solidão ao vê-los. Todos pareciam estar perfeitamente contentes com a monotonia de suas rotinas matinais. Ninguém parecia compartilhar de seu desejo por algo novo e empolgante, por algo mais.


Felix chegou à tenda do padeiro, onde o cheiro delicioso dos pães recém-assados se espalhava pelo ar. Como sempre, o ansioso padeiro segurava uma travessa de baguetes frescas e resmungava consigo mesmo.

 — Bonjour — disse Lee. O homem assentiu distraído. — Uma baguete… — Ele investigou a fila de potes cheios de geleias vermelhas. — E um deste também, s’il vous plaît, por favor — emendou ele, escolhendo um pote e deslizando-o para dentro do bolso de seu avental.

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