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Felix decidiu que, enquanto estivesse no castelo, usaria seu tempo de forma produtiva, ajudando na recuperação da Fera, para começar. Ajustando seu vestido ao redor das pernas, Lee se acomodou na cadeira ao lado da cama da Fera. Os olhos dele estavam fechados, o que lhe deu a chance de examinar suas feridas. Alguns dias haviam se passado desde o episódio com os lobos e, com tratamento constante, a maioria dos cortes estava começando a sarar. Ainda assim, os maiores e mais profundos permaneciam enfaixados. Eles levariam mais tempo para fechar e provavelmente deixariam cicatrizes. Olhando-o fixamente, Felix sentiu um ímpeto de tristeza pela criatura. Ele já tinha acumulado tantas cicatrizes invisíveis após crescer sem uma mãe para protegê-lo de um pai cruel que parecia injusto que também as tivesse na pele. 

Yongbok suspirou. 

Não ajudaria em nada a Fera se o garoto ficasse ali sentado se lamentando. Procurando ao redor
por algo que a entretivesse enquanto ele dormia, Felix não ficou surpreso ao constatar que não existia quase nada do tipo. Não havia livros na mesa de cabeceira. A arte estava toda destruída e até mesmo a mobília tinha sinais de desgaste. Parece que vou ter que me entreter sozinho, pensou ele.

Suavemente, ele recitou alguns trechos de uma de suas obras favoritas, Sonho de uma noite de verão.

 
— O amor pode transpor a forma e a honra. O amor não vê com os olhos, vê com a mente. 

Para sua surpresa, a voz profunda da Fera se juntou à sua  e eles terminaram o verso em uníssono: 

— Por isso é alado, é cego e tão potente. 

Felix desviou o olhar, estarrecido. A Fera não estava dormindo. Ele estava olhando para o humano com uma expressão divertida em seu rosto peludo. 

— Você conhece Shakespeare? — perguntou Felix. Percebeu que sua voz estava cheia de descrença e corou de vergonha. Depois do que monsieur Samovar lhe dissera, ele sabia que a Fera já fora um menino humano um dia. Um príncipe humano. Ainda assim, não conseguia conceber o fato de que a criatura deitada na cama à sua frente parecia ter mais classe que a maioria dos moradores de sua aldeia. 

A Fera deu de ombros. 

— Eu tive uma boa educação — respondeu ele. 

Houve um silêncio constrangedor. 

— Na verdade, minha peça preferida é Romeu e Julieta — comentou Yongbok. 

— Por que isso não me surpreende? — respondeu a Fera, com um toque de riso nos olhos. 

— O que quer dizer com isso? — disse Felix, fingindo-se de ofendido. 

— Todo aquele sofrimento e angústia e... — A Fera estremeceu dramaticamente. — Há tantas coisas melhores para ler. 

— Como o quê? — replicou o garoto, com uma sobrancelha erguida. Ele cruzou os braços, lançando o desafio. 

A Fera sorriu. Então começou a se levantar da cama. 

— Oh, não, não faça isso! — disse Felix, alcançando-o para detê-lo. 

Mesmo ferido, a Fera era muito mais forte que Felix. Ele o afastou e saiu da cama. Então, sem dizer uma palavra, saiu lentamente do quarto. O garoto não teve escolha senão ir atrás. 

Seguiram pelo corredor da ala oeste, viraram várias vezes e subiram uma pequena escadaria. Felix estava empolgado de curiosidade. A Fera não dissera nada nem dera qualquer pista sobre aonde estavam indo. Ele apenas caminhou a passos lentos, parando de vez em quando para recuperar o fôlego. 

Finalmente, pararam em frente a duas grandes portas, com no mínimo dois andares de altura e relevos esculpidos que retratavam várias cenas. Ao lado da Fera, Felix tentou decifrar alguns dos desenhos maiores, mas, antes que ele conseguisse, a Fera abriu as portas. 

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