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Um relâmpago reluziu, lançando sobre a floresta uma luz branca ameaçadora. Um instante depois, o vento se intensificou. Folhas voavam pelo chão, açoitando os cascos de Philippe conforme ele trotava nervosamente. Os olhos do cavalo se arregalaram quando momentos depois o estouro violento de um trovão ressoou pelo céu. Sacudindo a cabeça, ele se agitou. 

De seu lugar no assento à frente da carroça, Maurice sabia o que o grande animal estava tentando dizer: Vamos dar meia-volta agora, antes que seja tarde demais. Mas ele também sabia que já era tarde demais. Eles acabaram presos no meio do lugar que os habitantes locais chamavam de floresta negra. Rumores rondavam aquele caminho denso na mata. Alguns diziam que bruxas moravam ali. Outros afirmavam que na floresta havia várias alcateias de lobos mais espertos que a maioria dos homens. Havia ainda aqueles que contavam que as árvores podiam falar. Era o tipo de lugar onde se via escuridão e olhos hostis por toda a parte. 

Sem dúvida, não era o tipo de local para se perder à noite, especialmente durante uma tempestade. 

- Talvez nós devêssemos ter virado à direita naquele cruzamento, velho amigo. -disse Maurice, com suas mãos tremendo nas rédeas conforme mais raios riscavam o céu. - Ou talvez eu deva parar de fingir que meu cavalo entende o que falo. 

Outra descarga de raios caiu. Só que, dessa vez, eles quase atingiram Maurice e Philippe. Os dois escaparam por pouco, mas uma árvore nodosa e seca não teve a mesma sorte: o raio a partiu em duas. Conforme ela se separou, uma metade caiu sobre a estrada logo à frente de Philippe. A outra metade caiu para o lado. Quando Maurice olhou de perto, notou que a segunda metade havia caído bem próximo a um caminho estreito, antes oculto. 

Olhando para a frente e para trás, Maurice ponderou o que fazer. Uma parte racional e razoável dele sabia que precisava encontrar um jeito de continuar seguindo pela estrada. Mas uma parte menor se deu conta de que isso jamais aconteceria. Pelo menos, não naquela noite. Ele não era capaz de, Sozinho, carregar a carroçae Philippe por cima da ávore caída. Com um suspiro, ele agarrou as rédeas, guiando seu cavalo na direção do novo caminho. 

- Vai ficar tudo bem, Philippe - disse ele quando o cavalo relinchou apreensivo. Espero, acrescentou mentalmente. 

Conforme eles avançavam pelo caminho, Maurice ficou cada vez menos confiante de que as coisas acabariam bem. O tempo, que já estava tempestuoso, ficou pior... e mais estranho. Embora fosse verão, uma neve fraca e rodopiante começou a cair, espalhando-se pelo seu casaco e embranquecendo a pelagem cinza sarapintada de Philippe. Tudo caiu em um silêncio misterioso. O ruído dos trovões desapareceu, e logo o único som ecoando pela mata aparentemente deserta era o ploc-ploc dos cascos de Philippe. 

Então, ouviu-se um uivo penetrante. 

Um instante depois, um enorme lobo branco surgiu do meio dos arbustos, quase atingindo a carroça. Maurice deu uma olhada rápida ao redor e viu uma alcateia inteira das bestas correndo ao lado deles. 

- Vamos, Philippe! -gritou ele, estalando as rédeas contra o pescoço do cavalo, como se a criatura precisasse de algum encorajamento. - Depressa!

 O cavalo não perdeu tempo e disparou a pleno galope. Mas o movimento brusco não combinava com a idade da carroça e sua degradação geral. Assim que o cavalo começou a se afastar dos lobos, a carroça começou a ceder e os arreios, a se soltarem. Em questão de segundos, ela sucumbiu. 

Maurice gritou quando a carroça caiu no chão e ele foi arremessado pelo ar. Ele ouviu o ruído de suas queridas caixinhas de música se espatifando na queda e os uivos sufocantes dos lobos, e soube que era uma questão de tempo até que ele também caísse e fosse destruído. Mas eis que seu corpo despencando parou de repente. Erguendo o olhar, viu que sua queda havia sido impedida por um galho baixo. Ele ficou pendurado pela roupa, sem poder fazer nada.

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