Episódio 4 - Vem Sempre Aqui? Parte 2

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"O homem não teria alcançado o possível se, repetidas vezes, não tivesse tentado o impossível."-Max Weber

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Apenas com um biquíni e um chapéu de palha elegante, ela estava na praia com alguém importante, quem seria? Aquele calor gostoso se misturando com a brisa do mar era aconchegante. Crianças se divertiam em volta, a garota segura a mão desse alguém importante enquanto observa esse calor ir embora. O céu fica laranja, o brilho do Sol começa a perder seu destaque, o pôr-do-sol era lindo. Encostara a cabeça no ombro de seu amor, e quando se vira para lhe dar um beijo, se assusta! Um rosto vazio de emoções e sentimentos, não possuía olhos, nem nariz, nem boca, muito menos uma característica que apontasse seu gênero, seu corpo não parecia nem masculino nem feminino. O que estava prestes a beijar, ela realmente amava... aquilo? A praia escurece e o clima pesa, uma chuva forte começa a bater, um sentimento horrível toma conta de sua pele. Ela se levanta, o seu "amor" se levanta junto, como se quisesse ela continuasse ali, mas a garota corre dali. Seu chapéu de palha é roubado pelo vento, seu corpo agoniza com as gotas de chuva batendo forte em sua pele, mas ela não se importa e fecha os olhos com o intuito de protegê-los da chuva, mas quando os abre, não estava mais no mesmo lugar. Ofegante, ela estava com os braços apoiados na parede enquanto a água do chuveiro bate em sua cabeça e se espalha pelo resto de seu corpo nu, deveria estar relaxada com o banho quente, mas não se sentia assim, não depois do que acabava de acontecer.
Ao sair do box, se enxuga em uma toalha branca, não seca seus cabelos negros, apenas os penteia, interessante, só batem até o ombro. Se olha no espelho do banheiro, aqueles olhos puxados, o rosto branco, olheiras que destacam. Resolveu sorrir e notou um espaço notável entre os dois dentes incisivos superiores, quem diabos amaria alguém assim? Se perguntou. Vestiu um roupão e abriu a porta a sua direita, esperando um quarto acolhedor. Mas antes de abrir, no momento em que encosta na maçaneta, ela sente que tem algo faltando, mas não consegue dizer o que é, tem algo faltando... ela vira seu olhar devagar para o braço que encostava na maçaneta, o seu braço direito, uma mordida que não estava ali antes se abre e começa a sair uma quantidade assustadora de sangue.
- NÃO, POR FAVOR NÃO, FOI SÓ UM SONHO, ERA TUDO UM SONHO!!! - gritou em prantos enquanto cobria a mordida com a toalha que usou, aplicou o máximo de pressão que pôde, mas a toalha adotou a cor vermelha para si, então tirou o roupão e fez o mesmo, mas de nada serviu. - É mentira! Não, não, por favor, foi só um pesadelo!
Se levantou e saiu correndo do banheiro, deu de frente com um quarto com infinitos detalhes pretos e rosas, mas não estava nem aí para como era seu quarto.
- SOCORRO!!!
Gritou e chorou por minutos, o carpete preto ficou alagado pelo sangue. Se deitou em posição fetal e esperou. Esperou... esperou... esperou... mas percebeu o que estava faltando, não havia amor algum, no fim do mundo ou antes, não tinha memória alguma de alguém que a amasse.

23 de Abril de 2020 - Manhã

E ali estava ela, no fim do mundo de novo, e o fim de mundo onde estava fedia muito também. Estava nos esgotos, se passaram dois dias e aquela mordida no braço direito, mesmo que remendada com ataduras, ainda ardia muito. Sabia que, por conta disso, não poderia passar a muralha da cidade, então procurou por atalhos. Algo a deixava atenta, aquele número gigante de soldados em volta das muralhas, o que faziam tantos deles por ali? Por que precisavam de tanta gente? Mesmo tendo esperança que Crateús fosse um lugar seguro para ficar, tinha um certo tipo de insegurança sobre aquele lugar. Mesmo assim, não importava, teria que seguir em frente. Sua barriga ronca, ela pega sua mochila e pega uma batatinha que havia pego no mercadinho do post, aquele pacotinho era o último de todos os alimentos que havia encontrado, sequer sabe a quanto tempo está sem comer uma refeição saudável. Se levanta mancando, pega no apoio do carrinho e o puxa, seguindo o caminho que estava seguindo na noite anterior, não precisava mais usar sua lanterna, já que a luz exterior iluminava bem ali dentro. Na verdade, não sabia se estava perto, longe ou sequer se já havia passado de seu destino, então soltou o carrinho e direcionou sua visão para o primeiro bueiro que encontrou. Podia ver o que parecia uma cidade, estava do lado de uma rodovia, o céu estava pouco nublado, conseguia ver diversas casas em sua volta, pensou que seria uma boa ideia sair dali de uma vez. Voltou e seguiu em frente à procura da primeira tampa que pudesse subir, afinal, precisaria tirar o carrinho dali de alguma forma.
Não demorou muito para encontrar uma. O plano era simples, levaria primeiro o arsenal para fora, daí levaria o carrinho, parecia fácil, na verdade só parecia mesmo. Começou a subir a escada já com a Lazarina na sua mão direita, com a Carabina nas suas costas e com a Glock na cintura, enquanto usava a mão esquerda para subir. Quando chegou ao topo, encostou as costas na parede enquanto se apoiava na escada com as pernas, deixou a espingarda sobre as coxas e tentou empurrar a tampa, mas era muito mais pesada do que imaginava, lhe faltava força. Mas não importava, tirou forças do nada para empurrar a tampa de bueiro, sentia seu corpo gritar por socorro por estar fazendo aquilo, mas não tinha escolha a não ser desobedecer os seus prantos internos. E foi com tanto esforço que ela a levantou e a jogou para o lado o mais rápido que pôde, jogou sua mochila e todas as armas para fora e desceu para pegar o carrinho. O pegou pelo apoio e começou a subir, percebeu que seus braços não teriam tamanha forma para isso, mas não se importou, subiu degraus o suficiente para se encostar na parede e pegar o carrinho com as duas mãos. E assim ela subiu de novo, com as costas arrastando na parede e com os braços caídos segurando um carrinho no qual não deveria conseguir segurar. Sentiu a ligação do seu bíceps direito começar a falhar, mas pouco se importava. A cada degrau que subia ela gemia mais e mais, quando começou a chegar mais perto da saída, seus gemidos viraram gritos, a agonia que sentia, a força que aplicava em seus braços era mortal. Quando colocou seus pé no último degrau se sentou na rua e continuou usando as pernas para puxar o carrinho, trocou a posição das suas mãos e se levantou enquanto continuava a puxar. É depois de tanto esforço que ela consegue puxar ele pra fora. A garota o solta e o sangue começa a esfriar. Devagar, ela ergue seus braços e olha para a palma de ambas as mãos, elas sangram intensamente, a atadura está molhada de sangue por conta da mordida, que sangrou por conta do esforço muscular. O som ambiente passa a ficar imperceptível, pois sua audição é tomada por um zumbido intenso. Quando a adrenalina abaixa, a dor intensa começa a aparecer, seus braços se enchem agonia, ela sente como se estivessem arrancando seus músculos à força. É com tanta dor e agonia, que a garota grita com todas as forças, queria chorar, mas estava tão desidratada que sequer haviam lágrimas. Ela sequer podia se ouvir, sua pressão havia caído, e junto dela seus pés, que perderam o equilíbrio. Na maior exaustão, ela desmaia no meio de uma rua deserta.

Albatroz: A PragaOnde histórias criam vida. Descubra agora