Edward Murray

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O relógio marcava duas horas quando Edogawa dirigiu-se a biblioteca, ele esperava discutir alguns assuntos triviais, ou nem tanto com o alegre sr. Murray.

Algo nele o inquietava, a maneira como ele estava sempre otimista era meio irritante. Não que um pouco de bom humor não melhorasse a maneira de conduzir sua vida, mas no caso do homem era... quase mecânico demais, como se ele estivesse apenas interpretando um papel, por isso preferia conversar com ele a sós, onde ele pudesse revelar pequenas falhas no seu comportamento social.

A biblioteca, como todo o restante da casa estava decorada com uma luxuosa mobilia de mogno e poltronas de couro, castiçais dourados enchiam as mesas e iluminavam o ambiente, expondo as enormes estantes contendo centenas de milhares de livros quase intocados. Uma pena realmente. - Ele pensou.

O lugar estava silencioso, e o sr. Murray estava sentado observando através dos vitrais das janelas distraidamente.

Ranpo se aproximou serenamente e procurou um volume entre os livros, puxando o Frankenstein de Mary Shelley e sentando-se ao lado do homem.

Edward o mirou com uma expressão inescrutável.

Sr. Edogawa... - Ele sorriu e o saudou. -Achei que estaria sozinho nesse momento.

-Eu suponho que o senhor tenha muito em que pensar. -Ranpo acariciou a lombada do livro e traçou os relevos do título.

-O senhor não faz ideia. -o detetive ficou silencioso antes de prosseguir.

- O que acha deste lugar em si? -Perguntou pensando na jovem Mary Shelley que fugira de sua casa para casar e acabara escrevendo um dos maiores clássicos da literatura mundial.

-Deprimente. -O homem disse sem pestanejar, depois riu, mas havia tristeza em sua voz e um pouco de mágoa também.

-Há quem aprecie o charme da arquitetura gótica. - Edward meneou a cabeça.

-É mais do que isso... Eu só não sei explicar. - O Sr. Murray disse com um suspiro cansado.

Ranpo mirou-o serenamente. Pequenas rugas se formavam ao redor dos olhos e o homem parecia mais velho do que ele lembrava.

-O que está lendo? -Perguntou por fim.

-Oh, é uma das peças de Shakespeare...
A tempestade. - Edward respondeu distraidamente.

-Oh. De fato muito interessante. O inferno está vazio e todos os demônios estão aqui. -O detetive citou.

O homem ficou sério, então assentiu.

-Conhece o príncipe Ébano há muito tempo? -Perguntou Ranpo folheando o livro.

-Não exatamente, na verdade eu nunca o tinha visto. apenas sabia que éramos parentes distantes, fiquei bastante surpreso quando recebi a carta dele me convidando para visitá-lo, depois de tantos anos... Bom, o que posso dizer é que ele não tinha muito interesse nas partes da família que não são tão abastadas. -Disse com uma risada.

-Bem, eu suponho que seja realmente surpreendente. Mas sente falta de Paris... Ranpo continuou passando as páginas distraidamente.

-Ah sim, com suas musiques magnifiques e as mademoiselles todas tão belles... absolutamente, sinto falta. -O homem suspirou.

-E porque simplesmente não retornar para casa? -Indagou Ranpo.

O homem ficou em silêncio e desta vez haviam alguns sentimentos nublados em sua expressão.

-Dizem que lar é onde o seu coração está... -Edward suspirou e depois de alguns minutos falou mais para si mesmo do que para o outro. - Talvez seja...

Ranpo franziu o cenho e depois de se despedir deixou o homem sozinho.

-Ora ora... temos um homem astuto aqui.... -Disse baixinho e com um sorrisinho contido, antes de adentrar os próprios aposentos.

Algumas horas mais tarde, apesar do frio ele decidiu caminhar pelos jardins.

Uma brisa gelada açoitava a copa das arvores e o sol brilhava no alto do céu, o que era raro naquelas colinas. Observou as estátuas do jardim e os bancos todos vazios. De toda forma ele entendia o que tornava aquele lugar deprimente, era como uma casa habitada por fantasmas, de jeito nenhum se parecia um lar.

Ele esgueirou-se por entre dois arbustos antes de tropeçar em algo e se esparramar no chão.
Com a testa dolorida ele ergueu a cabeça, e suspirou sentindo mãos agarrem os seus pulsos.

Ele olhou para baixo e viu que Poe o mirava com olhos arregalados e preocupados.

-Você está bem? -Perguntou um pouco ansioso.

-Eu sim, mas e você? -Ranpo respondeu.

-Apenas saia de cima de mim. -Ranpo mirou o caderno ao lado do homem e saltou para o chão.

-Estava escrevendo?

-Poe arrancou o caderno de suas mãos. Não pode ler! ainda... - Emendou, com as bochechas rosadas.

-Não sabia que você poderia ficar tão agressivo. - Ranpo esfregou o pescoço sentindo a nuca doer um pouco.

-Sua testa está bem? -Poe se aproximou cautelosamente.

-Claro! -Disse Ranpo, mas não tinha certeza de como as palavras saíram de sua boca

-Tem certeza? Tem um pouco de sangue nela. -Poe deixou o caderno de lado e focou sua atenção no detetive.

-Eu nunca estive melhor. - Disse ranpo, antes de o mundo ao redor dele girar e ele desabar sobre Poe mais uma vez.

Poe o agarrou preocupado e meio sem saber o que fazer sentiu que ia desmaiar também. Mas para a sua sorte o pequeno Oliver estava por ali por perto e foi chamar por ajuda e logo os dois estavam sendo avaliados pelo médico pessoal de Ébano.

Ele ficou ao lado de Ranpo, até que o detetive abrisse os olhos. Era estranho vê-lo tão sereno, com a pele pálida e os cabelos castanhos espalhados sobre o travesseiro...

Agora que ele o observava desta maneira mais íntima, o jovem que geralmente o espantava com sua tagarelice e sua tenacidade, parecia não mais que um menino...

Ele estendeu a mão sobre o rosto do outro e tocou a sua pele que parecia macia e quente...

Se ele pudesse...

-O que está fazendo? - A voz de Ranpo o assustou e ele sentiu a pele do rosto queimar.

-Era apenas... Um mosquito! - Disse finalmente. As palavras atropelando umas as outras...

Ranpo o encarou com aquele olhar de "eu sei exatamente o que você estava fazendo"

Poe se levantou rapidamente e se despediu com um "tchau" e "melhore logo".

Ranpo franziu o cenho. Aquele era um homem curioso, Ranpo desconfiava que seu comportamento era genuíno e ainda assim ele não entendeu por que ele saiu correndo e qual a causa do seu embaraço.

Se algo o incomodava ele simplesmente falava sobre isso. Porque fazer tempestade em copo d'agua e ficar complicando as coisas simples?

A velocidade com que seus pensamentos vinham, fez a sua cabeça doer. E por um segundo ele desejou sentir aquele toque suave novamente.

A Máscara da Morte VermelhaOnde histórias criam vida. Descubra agora