🌙1: Nova cidade, novos costumes e nossa como sou péssimo motorista

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O buzinar vem forte.
Eita, caralho!

Recolho os ombros expondo a palma pra fora da janela do carro, minhas pupilas rodam o retrovisor e franzo o cenho notando que ia batendo.
Foi uma péssima ideia parar para tomar café pelo visto.
A mulher, dona do Sedã desce do automóvel com uma carranca na cara; não me surpreende os nomes de baixo calão direcionados a minha pessoa. Suspiro pensando que só queria uma coisa: Café.

Escuto a bronca toda me desculpando, sei que sou um péssimo motorista, resta-me concordar.
Minutos, eles podem parecer horas às vezes, em uma discussão é um ótimo exemplo.
Desligo o carro torto na estrada mesmo, ofereço dinheiro a mulher pra que esqueça o ocorrido e os olhos azuis claros me analisam antes de suspirar, negar, retornar a seu carro e ir embora.
Fico encarando minha carteira aberta, o cartão azulado de débito por mais alguns minutos pra dar tempo de recuperar o raciocínio. Se não iria aceitar o dinheiro, pra que caçar confusão?
Não sou capaz de compreender; meus dedos longos mexem um pouco trêmulos na bolsa à qual levo ao trabalho, puxo meu celular na frente. Tenho que estar lá às 08:00 horas ao menos.

A vítima desta vez, é jovem, 20 ou 23 anos por aí, seu pai quem me ligou anunciando que precisava de meus serviços em vez de entrar em contato com a cooperativa. O antigo fisioterapeuta foi demitido, isto com certeza me deixou inseguro mas o salário é melhor que do asilo.
Pegando meu passe finalmente saio do carro, acho melhor ir de ônibus, não estou pronto pra lidar com a morte de ninguém, muito menos uma pela qual sou eu que passarei por cima. 

Quase sou atropelado por uma bicicleta à medida que viro-me para trancar a porta e sobressalto os ombros, estático por um instante.
Dia catastrófico, não é preciso ser um gênio para concluir.
Suspiro aliviado em chegar ao outro lado da rua, meus sapatos duros fazem barulho na calçada alta toda cerâmicada, a padaria atrás de mim não desfruta de nenhum cliente. Arrumo a mochila de uma alça só entre o peitoral. 
Yara é uma cidade agitada, admito que está sendo fatídico tentar me posicionar a uma vida assim. 

Correria. 

Foge completamente do que estou acostumado; ruas de pedras, qualquer caminho que leva ao mar, pessoas com quem pode contar por mais que eu nunca quisesse contar com elas...
Flufly contou-me que também está sendo difícil, estou a achando rabugenta demais ultimamente, será que precisa de uma nova companhia?

Ah, sim, a entrevista! 

Dou um passo em falso, apenas para volta-lo observando o café. Não vai dar tempo, melhor me apressar.
 Subo a rua, chegando na parada atolada de pessoas, espero calmo vários ônibus passarem até que tenha um que ao menos eu não precise pegá-lo e ficar pendurado na porta em casca grossa. Pesquiso onde devo descer, as ruas que terei que virar e logo estou no caminho. O céu está nublado, o que faz o clima abafado estranhamente caloroso nutrindo o suor que desce demasiado por meus poros.
Já trabalhei home care antes, três vezes na semana, com pacientes variados; esse, me quer em hidroterapia também, disse-me que precisaria primeiro me entrevistar antes de contratar e só terei conhecimento de sua condição apenas quando chegar lá.

Tudo está misterioso até demais.

Identidade, o pedido de sigilo. Será que estou indo direto a morte?

Paro de andar ao questionar-me, notando que cheguei em um bairro nobre. O pai dele comentou algo do filho dele ser um pianista famoso, não? Ou era dançarino? Cantor?...
Coço a cabeça, puxando os novos fios loiros e decerto mais curtos pra trás por me arrepender de não estar 100% sã na conversa. Por que aceitei mesmo? Ah sim, proposta boa, salário bom. 

Chego no começo da rua, dando de cara com portões gradeados, protegendo uma mansão de três andares.
Seguro o queixo, um segurança aproxima-se e puxo meu crachá da cooperativa, ele apenas foca no fisioterapeuta e passa a me chamar assim enquanto me guia pra dentro da casa estranha, passando pelo jardim, quando menos percebo sou jogado na entrada, alguém vem me buscar logo porém não luto contra a vontade que meus calcanhares tem de ao menos se movimentar um pouco pelo ambiente. Sorrio paras câmeras, perguntando-me quem pode estar vigiando do outro lado, se tem alguém de fato vigiando do outro lado. 

Ponta dos pés- jikookOnde histórias criam vida. Descubra agora