08 - Nescau geladinho

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 Brenda estava de braços cruzados quando eu cheguei, encarava o mar e já estava toda vestida com sua roupa de borracha. O cabelo já duro de sal balançava com a brisa do mar.

- Eai gostosa - Ela me recebeu com um abraço e um sorriso.

- Eai meu querido. Cara aproveita! hoje as ondas estão bem grandes, a arrebentação ta bem tranquila e ta fechando para direita.

O mar realmente estava prometendo, havia uns oito ou nove surfistas dentro da água. Brenda pelo jeito já tinha aproveitado um pouco e agora descansava. Me apressei para colocar também a minha roupa de borracha.

- Caramba, esqueci a parafina. Tu me empresta a sua?

Brenda me jogou um toco de parafina.

- Não usa tudo, que depois vou colocar mais na minha também.

Brenda era minha amiga desde sempre, desde antes de Lizz e antes mesmo de eu entrar na adolescência. Aprendi a surfar com ela, éramos da mesma turma no ensino fundamental e essa amizade se estendeu por anos. Era uma daquelas amizades transversais na vida. Meu círculo de amigos comumente era recheado de nerds e gamers. Brenda era um ponto fora da curva. Ela era uma garota da rua, não moradora de rua nem nada, mas ela pertencia a rua. Conhecia Itajaí de cabo a rabo, os bairros, as pessoas, os atalhos, etc. Era impossível andar pelas ruas com Brenda sem que ela parasse para cumprimentar alguém.

- Você andou sumido, não te vi mais surfando. Fiquei sabendo da sua ida para o hospital. Foi feio?

- Foi. Um colega da faculdade morreu.

Ela torceu um pouco o rosto.

- Fábio, né? Fiquei sabendo. Era irmão de uma conhecida minha.

- Sim. Mas passou, agora já estou bem, pronto pra voltar a ativa.

- Só você mesmo, um nativo caindo no meio das trilhas. Tem certeza que é um peixeiro?

Os nativos de Itajaí eram chamados de peixeiros.

- Dei bobeira, mas aposto que você também teria caído. Dizem que foi bem feio, porque estava molhado de chuva.

Bom, pelo menos foi isso que me disseram no hospital e Lizz concordou com essa informação, mas não me lembro de ter visto sinal algum de chuva na trilha aquele dia. Nem barro, nem poça, nada.

- A eu duvido muito, eu já andei em todas as trilhas da cidade. - Colocou a mão no meu ombro - Mas eu sinto muito mesmo assim. Me chame na próxima que eu serei sua guia.

- Olha, tudo o que eu mais quero é ficar longe de trilha por enquanto.

- Então vai logo pra água, não sei até quando vai rolar esse swell. Choveu ontem a noite, então tem umas grandinhas pra dropar.

Entrei na água e foi bem fácil passar a arrebentação, estávamos na Praia Brava e a arrebentação ali era bem próxima a areia, o que deixava fácil atravessar e já chegar nas ondas. O mar estava levemente turvo por causa da chuva, mas a água estava ótima.

Adorava surfar, me deixava mais calmo e tranquilo, minha mãe sempre dizia que o mar limpava as energias. Peguei uma onda ou duas antes da série acabar e então sentei na prancha e esperei mais ondas chegarem. O mar não estava bom pra pegar um tubo, ondas muito gordas e sem quebrar como deveriam, mas mesmo assim consegui me divertir. Era inverno, fim de tarde, não demoraria para escurecer, mas eu não me importava, já cansei de sair de dentro mar a noite.

Brenda se juntou a mim depois de algumas séries, foi ela que me ensinou a surfar, jamais seria tão bom quanto ela, mas nunca liguei pra isso, eu comemorava suas vitórias e ela comemorava as minhas. Sempre foi assim.

O Lobo e o PeixeiroOnde histórias criam vida. Descubra agora