18 - Petroleo

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Encarava o pote vazio em cima da mesa. Valéria me entregou cheio de comida há três noites, quando participei do jantar na casa deles.

Os Krausemann.

Quando decidi ir para casa, depois de ouvir que minha transformação demoraria muito mais do que o esperado, Valéria me pegou suavemente pelo braço a caminho da porta e entregou o pote, havia carinho em seus olhos. Foi muito difícil não sorrir de volta. Então sorri.

Na cafeteria não deram bola para o atestado que apresentei, não fizeram perguntas também, mas Amanda deixou claro que não era para se repetir. Lizz ainda suspeitava que algo estava acontecendo, mas não perguntou, ela iria se esgueirar até descobrir algo. Isso era perigoso, precisava inventar alguma coisa para distrair sua atenção. Rodrigo não pareceu notar muita coisa e não havia visto Brenda nos últimos dias.

Arthur trocava mensagens comigo uma vez ou outra perguntando se haviam sintomas ou mudanças drásticas em meu comportamento. Não dei brecha para nenhum outro assunto, guardei rancor dele, o que era novidade. Nunca pensei em mim como rancoroso.

Fabiano havia me dito para procurá-lo quando quisesse, para tirar dúvidas ou apenas como amigo mesmo. Mas me faltava coragem. Não tinha medo de Fabiano, ou qualquer pessoa da família Krausemann e não sabia bem o porquê. O que me faltava era coragem para enfrentar a situação de ser um lobisomem.

Cocei o queixo e peguei o pote antes de sair de casa naquele fim de tarde.

Arthur estava na varanda de sua casa me esperando, o que era curioso, pois não avisei ninguém que estava indo fazer uma visita.

— Oi.

— Olá Álvaro. Bom te rever, se sente bem? — ele inspirou fundo quando cheguei perto.

— Sim. — Arthur assentiu com a cabeça e esperou — trouxe o pote de sua mãe.

Quando entreguei o pote sua mão encostou na minha, tive a impressão que foi de propósito.

— Ela vai ficar feliz em saber que você devolve os potes emprestados, eu vivo sumindo com alguns e ela odeia.

Ficou um silêncio desconfortável no ar.

— Você gostaria de entrar? Posso fazer um café — seus olhos azuis em nenhum momento deixaram os meus. Evitava ao máximo manter contato com eles, enquanto Arthur não tinha problema nenhum com isso.

— Seu pai está em casa? Gostaria de falar com ele.

Seu rosto se apagou um pouco.

— Ele deu uma saída, mas logo estará em casa. Quer esperar?

— Posso esperar um pouco.

Apoiei as costas no parapeito que circundavam a varanda. Arthur fez o mesmo.

— Escuta Álvaro, sei que você não quer falar disso, mas eu só quero dizer que sinto muito. Me doeu ver você sofrendo, de verdade.

— Tem razão Arthur, não quero falar disso.

— Eu entendo. — ele estava triste, senti isso fluir dele como uma brisa, e fiquei com dó. Para em seguida me repreender mentalmente, ele não merecia pena.

Não tocamos mais no assunto, mas isso não o fez desistir de falar comigo, perguntou do meu trabalho, da faculdade, da minha mãe. Não era apenas educação, realmente estava interessado em saber. Respondi todas as suas indagações na medida que a educação que minha mãe me ensinou permitia.

Quase não havia mais assunto quando ouvi um barulho no jardim, me virei e quase tive um treco quando vi um enorme lobo guará parado na grama, era enorme, era maior que minha moto estacionada a poucos metros dele. Seu pelo era castanho claro, as patas compridas e negras, suas pupilas amarelas estavam fixas em mim.

O Lobo e o PeixeiroOnde histórias criam vida. Descubra agora