Capítulo 4

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Kara segurou a xícara de lata nas mãos. Seus antebraços nus repousavam contra a textura áspera da mesa de jantar. Kal o construiu com a madeira de um cedro amarelo que ela descobriu no primeiro ano no Alasca. Ela acariciou os sulcos familiares com uma mão, explorando a urdidura e a trama das fibras das árvores que escureceram lentamente com a idade. O anel queimado onde Kal colocou uma frigideira quente sem pano, os arranhões da época em que ele cortou tiras de couro para consertar sapatos de neve, o arranhão quando ele deixou cair o martelo enquanto consertava o telhado no ano passado. Embora sua existência como mesa tenha durado muito pouco tempo, ela certamente havia visto seu quinhão de excitação. A superfície lisa parecia fria sob seus dedos, tão fria quanto a xícara de lata que ela ainda segurava. Ela franziu a testa para a xícara e inspecionou seu reflexo amassado e cheio de cicatrizes. Por que o café estava frio? Ela tinha acabado de servir, não foi? Ela o inclinou e o líquido frio derramou sobre a borda e espirrou em seu polegar, confirmando que ela não havia drenado involuntariamente seu conteúdo. Seu reflexo mudou para tons sépia por um instante antes que o café se amontoasse na mesa.

Ela se endireitou, surpresa pela dor aguda no pescoço e nos ombros enquanto olhava para o fogão. Daquela distância ela deveria ter sentido o calor, mas parecia que o fogo havia se apagado. Há quanto tempo ela estava sentada aqui? Ainda estava escuro quando ela colocou o café e agora a luz entrava pelas frestas das venezianas e da porta. Uma onda de medo a fez ficar de pé, e o banco caiu no chão. Ela precisava ascender o fogo! Kal precisava de calor. Kal precisava...

A memória cortou o medo. O cheiro férreo de sangue misturando-se com um cheiro pútrido crescente, o olhar triste do médico em sua última visita, o último suspiro agitado de Kal ao passar por seus lábios. Kal só precisava ser enterrado agora.

Tão de madeira quanto a mesa, Kara pegou o banco e sentou-se novamente. Seus olhos foram atraídos para a grande cama no canto, o monte de cobertores que escondia seu primo mais velho.

Não houve nenhum aviso naquele dia, nenhuma indicação de perigo enquanto eles verificavam os cabos de armadilha. Kara revisou inutilmente suas lembranças, procurando por qualquer coisa que pudesse apontar e dizer: 'Sim, isso! Eu deveria ter visto isso! Eu poderia ter parado!'

Mas até mesmo Kal dissera, enquanto ela o arrastava para casa no trenó, que ele ficara tão chocado quanto ela quando o urso pardo se jogou sobre eles. Os ursos estavam caçando furtivamente na sua trilha de armadilhas na direção oposta e contra o vento. O único sinal que receberam foi o súbito rugido de desafio quando mil quilos de urso pardo os atacaram. Kal estava certo, incapaz de levantar seu Winchester rápido o suficiente. Ele sofreu todo o impacto do ataque. Foi Kara quem derrubou o urso, disparando vários tiros em sua pele coberta de gordura enquanto seu primo gritava por baixo dele. Kal insistiu mais tarde que foi apenas o azar que o colocou no caminho do urso.

Ela levou Kal para casa e se recuperou da melhor maneira que pôde. Ao anoitecer, ele desenvolveu febre pelas feridas. Ela queria ir imediatamente para Skagway buscar o médico, mas Kal a convenceu a esperar até de manhã. Ela estaria tropeçando no escuro, despertando predadores noturnos em seu rastro. Não fazia sentido que ambos ficassem gravemente feridos quando algumas horas não fariam diferença. Talvez ele ainda estivesse vivo se eu não o tivesse ouvido, se eu tivesse ido buscar o médico naquela noite.

Já era início da tarde do dia seguinte quando ela finalmente voltou da cidade com o médico. O homem desgrenhado garantiu a ela que Kal estava certo. O urso fez um ótimo trabalho nos órgãos internos de seu primo e quebrou vários ossos de Kal. Não havia nada que o médico pudesse fazer exceto facilitar a morte de Kal. Ele havia deixado para ela um frasco de láudano com instruções sobre seu uso – apenas algumas gotas em um copo de água com açúcar para serem administradas quatro vezes ao dia. Se Kal recebesse uma dose de um dia inteiro de uma só vez... bem, ele dormiria com os anjos.

KARLENA - Noiva Por CorrespondênciaOnde histórias criam vida. Descubra agora