Capítulo 1: A chegada

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Engenho do Poço Comprido, no vale do Siriji, Pernambuco, 10 de janeiro de 1980.

Depois de dois dias de uma viagem exaustiva, chegamos ao imponente Engenho do Poço Comprido.

- Cê tá vendo fi que lugar bonito? - disse meu pai animado

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- Cê tá vendo fi que lugar bonito? - disse meu pai animado.

- É muito bonito, mas a gente não vai nem perto disso aí... O senhor sabe.

- Não reclame... Esse serviço chegou na hora certa fi. Temos que levar dinheiro e comida pra casa. Seus irmãos dependem de nós. Seu velho pai já não aguenta o rojão, já cê tá novo e tem muita força.

- Estou pronto pai.

Fomos contratados para a lida do gado, amansar bicho e o dono do lugar gosta de vaqueiro que corre vaquejada e eu gosto muito disso. Mesmo tendo 22 anos eu já me garanto no serviço bruto. Desde os 10 anos amanso bicho brabo e trabalho na lavoura também e digo que tenho mão próspera, por que tudo que eu planto dá.

- O homem vem aí Rodolfo. Postura de homi meu fi.

Meu pai gostava muito de me ensinar sobre ter postura de homem. Ele me dava muitos conselhos e era muito honesto, como filho mais velho de uma família de oito filhos, eu tenho que ser exemplo.

- Seu Chico Damásio e o filho Rodolfo? - perguntou o imperoso Egídio Pereira.

- Somos nós senhor. - meu pai respondeu.

- Quem me indicou vocês deu a palavra que são homens de coragem e força física. Que trabalham muito e comem pouco. E que seu jovem filho é bom de amansar bicho bruto pro meu engenho. Confirmam e dão a palavra que são isso mesmo?

- Dou minha palavra senhor. - meu pai respondeu animado.

- Vejo que o senhor não tem alguns dentes, sofre com dor de dente?

- Não senhor.

Senti que ele estava querendo humilhar meu pai e aquilo me dava raiva.

- E você? Não tem nada a dizer?

- O pai resolve tudo. O quê decidir, eu faço.

- Parece ser um sujeito calado. Mas dizem que você é um vaqueirão. Já sabe que gosto disso não é vaqueiro?

- Sei sim senhor.

- Quero uma demonstração.

- Agora?

- Imediatamente. Isso vale o seu emprego e o do seu pai também.

Fui levado até o local da demonstração e meu pai disse próximo ao meu ouvido. " Derruba o boi na faixa".

Fui sabendo da minha responsabilidade e não deu tempo nem eu chegar a subir no cavalo que vi os arredores ficar cheio de gente.

Percebi que a maioria era o povo da lida, mas reparei que junto ao Egídio tinha duas moças, uma em cada braço e também iam ver minha apresentação.

Assim que sai com meu cavalo, fui habilidoso e usei toda a minha força para derrubar derrubar um garrote na faixa. Ouvi as vaias e as agitações do povo, que pareciam gostar do que viram.

O senhor Egídio caminhou até onde eu estava e trouxe consigo as duas jovens. Uma deveria ter seus 12 anos, ainda era muito menina, mas a outra, essa já tinha mais idade e lindos traços de mulher.

Inclusive ela foi a primeira que me parabenizou:

- Tu foi incrível... Foi muito bom de verdade.

- Cale-se Juliete. - o velho a repreendeu na hora e tirou daqueles lábios o lindo sorriso que ela tinha. - Entrem vocês duas. Já andaram demais no sol hoje.

- Papai... Saímos agora. - a menor retrucou.

- Sem questionar. Voltem para casa Juliete e Júlia.

Elas saíram e não foram contentes.

- Agora deixe de olhar para elas e olhe para mim. - ele me repreendeu. - Gostei de sua apresentação. Estão contratados, mas diante mão aviso, não tem graça de vaqueiro para as minhas meninas, entendeu?

Eu não pude responder.

- Pelo o amor de Deus senhor, meu filho é homem respeitador. Um homem de caráter.

- É sempre bom reforçar seu Chico. Minhas filhas só casam com fazendeiro como eu, nunca com vaqueiro.

Fiquei olhando para aquele homem arrogante, frio e impiedoso. Depois ele foi nos mostrar o lugar que a gente ia ter para dormir e sabe um chiqueiro? Pois é, o lugar ainda conseguia ser pior. Mas meu pai aguentou tudo com paciência e eu tinha paciência pelo meu pai. Também nos foi dito que não ia ter café de manhã, só almoço e um escaldado na janta, por isso nem reclamei, em casa as vezes não tem nem isso.

- Se organizem para começar no serviço, se não a comida não chega. - ele nos alertou por fim.

Seria um tempo duro, o pagamento era pouco, mas era o quê tinha e isso já valia muito para quem não tinha quase nada.

...

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