Capítulo 7 - Fuga

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Henrique não oferece resistência quando envolvo seu corpo com meus braços, mas também não me abraça de volta. Eu me levanto, sem jeito. Ele me olha nos olhos e me dói ver o quanto ele está dilacerado.

— Eu sinto muito... Você quer que eu vá embora? — pergunto, com medo de ter ultrapassado um limite. Mas Henrique simplesmente balança a cabeça, se levanta e me abraça forte. Eu apoio sua cabeça no vão do meu pescoço e faço carinho em seus cabelos. Henrique é muito mais alto do que eu, o que significa que teve que se abaixar para se apoiar em mim.

Ele chora e soluça ao mesmo tempo, e eu fico sem saber bem o que fazer além de afagar seus cabelos e envolvê-lo em meus braços.

Ficamos assim por um longo tempo, os dois em silêncio, enquanto ouço seu choro dolorido e desesperado. Algo dói dentro de mim também, pois dá para ver o quanto ele amava o seu avô.

Da mesma forma que Henrique me apoiou quando eu estava mal, sinto que naquele momento, eu fazia o mesmo por ele.

Antigamente, eu achava que Henrique era cruel e sem coração, pelas coisas que eu o via aprontar comigo e com outras pessoas.

Esse foi meu segundo engano.

A campainha toca e eu me afasto.

— Acho que meus pais chegaram. — Abro a porta e vejo os pais de Henrique parados no batente da porta. Acho que o avô era por parte materna, pois sua mãe chora de soluçar.

Me despeço deles e saio, sentindo algo dentro de mim se despedaçar mais uma vez.

[...]

Meu professor de dança deixou que eu ensaiasse a minha coreografia no estúdio. Como hoje teria ensaio das coreografias em grupo do sarau e eu havia saído mais cedo da Beach Pop, aproveitei a oportunidade para poder ter mais liberdade para ensaiar.

A minha casa é grande e tem um espaço consideravelmente bom, mas não tinha uma sala toda cheia de espelhos, e eu precisava ver como meu corpo ficava ao fazer os movimentos. As vezes eu podia me sentir como uma bailarina incrível e estar toda torta e esquisita.

Mas por incrível que pareça, noto que meu corpo melhorou consideravelmente bem, assim como a minha flexibilidade. Eu consigo ver a minha dança tomando forma, e isso me enche de felicidade.

Estou terminando de passar a coreografia quando levo um susto. Henrique passa pela porta e entra no Studio de dança, meio confuso e desnorteado.

Nós não nos vemos e nem nos falamos há mais de uma semana, e apesar de eu ter desejado muito ir até sua casa ou lhe chamar no Whatsapp, fiquei sem jeito de fazer as duas coisas.

Dou pause na música e tento ajeitar o cabelo todo desgrenhado em um coque mal feito que já se desfaz e limpo o suor da testa. Sei que estou horrenda e não sei por que me preocupo em aparecer bonita para Henrique, mas acho que é um reflexo involuntário de não querer dar motivos para ser zoada.

Porém, Henrique parece não reparar nos meus cachos mal presos ou no meu rosto suado.

— Oi, como você está? — pergunto antes mesmo que Henrique faça qualquer coisa.

— Já estive melhor. — Ele abre um sorriso fraco e meu coração murcha dentro do peito. — O Gil está?

— Ainda não. Ele me deixou usar o Studio hoje antes do ensaio para o sarau.

— Tá bom, ele acabou de me responder. — Henrique abaixa a cabeça e mexe em seu celular. — Já está subindo as escadas.

— Ah, que ótimo. — Eu quero dizer mais alguma coisa, mas parece que existe uma trava na minha garganta, de modo que fico lhe encarando como se eu fosse uma idiota. Noto que seus olhos estão fundos e que os cabelos estão bagunçados. Acho que eu nunca tinha visto Henrique tão desleixado. — Bom, se precisar de alguma coisa, me chama.

Meu Engano - Série Dance - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora