Capítulo 3 - O Acordo

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— Eu não acredito que ele teve a CORAGEM de ressuscitar aquela foto! — exclamo para Driquinha, que está debruçada sobre o balcão da lanchonete. Por ser meio de semana, o movimento está um pouco fraco. A única demanda que tem sido alta é a dos sorvetes e milk shakes, pois está bem quente e tem uma quantidade considerável de pessoas na praia.

— Eu acredito. Você simplesmente jogou um copo de milk shake em cima dele. Seria difícil não se vingar disso. — Permaneço encarando a postagem, que já havia ultrapassado mil visualizações, curtidas e comentários. — Pelo menos você vai ficar famosa.

— Eu não quero ficar famosa! — choramingo. — Pelo menos não assim.

Essa foto representa um dos meus maiores traumas da adolescência. Era como se eu estivesse revivendo um pesadelo na minha vida.

— Ficar encarando essa tela não vai ajudar em nada, acredite.

— Eu vou denunciar de novo essa porcaria! — Clico na opção de denunciar o tweet novamente. — É a minha imagem aqui, não dei autorização para esse bosta seca usar!

— Isso pode dar até processo. Henrique é maluco. — Ela diz, indo atender ao cliente que havia acabado de entrar.

Mando mensagem para Henrique no Whatsapp, mas ele não me responde. As horas se passam e minha angustia aumenta, assim como os likes na minha foto postada indevidamente.

Quando Driquinha retorna, uma lâmpada se acende na minha cabeça.

— Esses clientes amam o nosso milk shake. — comenta ela, passando por baixo do balcão. — Mas milk shake de pistache é loucura demais.

— Você tem o zap do Leonardo? — Os olhos de Driquinha se arregalam e se eu não estivesse tão aflita, teria ficado desconfiada.

— E por que eu teria o zap dele?

— Ele é um dos melhores amigos do Henrique, deve saber onde esse traste está!

— Posso tentar arranjar para você. — Ela se afasta com um sorriso plastificado e entrega o pedido para o pessoal da cozinha.

Leonardo e Henrique vivem grudados desde que me entendo por gente. Eles sempre frequentam a Beach Pop.

Alguns minutos depois, Driquinha aparece do meu lado.

— Consegui a localização do Henrique. — Ela sorri, orgulhosa.

— Como você fez isso?

— O Leonardo marcou ele em uma publicação em um storie. — Driquinha me estende seu aparelho celular e me mostra o tal storie. — Eles estão trabalhando perto daqui.

— Meu turno termina em vinte minutos. Será que eles ainda estarão lá?

— Deixa eu ver aqui na minha bola de cristal. — debocha ela, abrindo um sorriso debochado.

— Você é uma boba!

Vinte e cinco minutos mais tarde, — teriam sido vinte se meus pais não tivessem me interceptado com o dinheiro do lanche — saio em disparada para a localização de Henrique. Eles estão no Barroco, gravando alguma campanha publicitária. Sim, os dois trabalham juntos. Leo e Henrique são amigos de infância e estudamos juntos a vida inteira, praticamente.

Os dois também compartilham a mesma profissão.

Chego ao Barroco em tempo recorde. Procuro por Henrique pela pracinha, que era o local em que ele estava, mas só vejo crianças brincando e pais entediados.

O Barroco é o centro de Itaipuaçu, onde fica concentrado a maioria dos comércios do bairro. Grande parte da população maricaense circula por ali devido a isso.

Com a bicicleta a tiracolo, vou vasculhando cada canto da praça, meus ombros curvados em frustração, quando percebo Henrique sentado sozinho do outro lado da rua, numa sorveteria super cara.

Marcho em direção a ele carregando a bicicleta. Ele está mexendo no seu notebook e está tão concentrado que nem vê quando eu me aproximo.

— Se você não retirar essa foto do ar, considere-se um homem morto. — Ele pula de susto da cadeira quando ouve a minha voz.

— Eu quase morri mesmo com sua aparição, você parece uma alma penada! — Henrique coloca a mão sobre o peito, dramaticamente.

Encosto a bicicleta no degrau da calçada e me sento na sua frente, com a raiva embaçando a minha visão.

— Quem te deu autorização para publicar essa foto minha?

— Esqueceu que você e seus pais assinaram um termo de autorização sobre os direitos de imagem? — Ele pergunta, fechando a tela do notebook. Sua tranquilidade e presunção me tiram do sério.

— Eu não quero saber! — Bato no tampo da mesa. — Eu quero que você exclua essa foto!

— Eu não posso simplesmente fazer isso.

— Por que não? — Ele cruza os braços na frente do peito, se encosta na cadeira e assume uma expressão extremamente debochada.

Ah, entendi.

— A questão é: O que você tem para me oferecer?

— Isso é ridículo! — choramingo, com lágrimas nos olhos. — Essa foto foi a maior humilhação de toda a minha vida!

— Juzinha, a sua vida toda já é a própria humilhação. — Seu sarcasmo me irrita tanto que a minha vontade é de me jogar em seu pescoço.

Eu simplesmente odeio que me chamem de Juzinha.

— Eu te odeio! — rosno, fechando as mãos em punho.

— Bom, se você não tem nada para me oferecer... — Ele ameaça se levantar da mesa, e eu bufo.

Era só o que me faltava!

— O que você quer?

Henrique coloca a mão no queixo, assumindo uma expressão falsamente pensativa. A vontade de voar em cima dele cresce a cada minuto.

— Vamos ver... Deixa eu pensar... É que são tantas possibilidades, sabe.

— Sei. — falo entredentes, irritada.

— Que tal se você fizer tudo o que eu pedir por um mês?

— Você ficou louco? — Arregalo os olhos, indignada. — Não vou ser a sua escrava!

— Divirta-se com a fama na internet. — Ele se levanta e eu puxo seu braço, em desespero.

— Não, espera! — respiro fundo, já me arrependendo do que vou dizer em seguida. — O que eu vou ter que fazer?

— Aí você estraga o espírito da coisa. — Ele se desvencilha do meu toque, levanta da mesa e pega o notebook. — Foi bom conversar com você, a gente se fala!

— Ei, você não pode simplesmente ir embora assim!

— Quando eu tiver certeza de que você irá cumprir sua parte do acordo, eu vou apagar a foto.

— Você está de brincadeira comigo? Eu prometo que vou cumprir! Só apaga essa foto, por favor.

Eu estava realmente desesperada e acho que ele percebeu isso, pois soltou um suspiro e voltou a se sentar.

— Se você não cumprir a sua parte, eu vou repostar essa foto em todas as minhas redes sociais. — ameaçou, pegando no seu celular. — Já apaguei a foto. Pode conferir, se quiser.

Ávida, pego meu celular, entro no Twitter e procuro o perfil de Henrique. Vasculho seus tweets e não encontro a minha foto constrangedora por lá. Solto um suspiro aliviado.

— Entrarei em contato para que você cumpra a sua parte do nosso acordo. Foi bom fazer negócios com você. — Henrique sai, levando consigo o notebook e sua mochila. Ao vê-lo se afastar, solto um suspiro e respondo:

— Pena que eu não posso dizer o mesmo.

Meu Engano - Série Dance - Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora