Capítulo 1

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Londres, Maio de 1850

O alvoroço de mais um dia de trabalho que chegava ao fim animava os estaleiros de Londres. Os navios estavam reunidos, tantos que mal era possível ver a água escura entre eles, e seus mastros formavam uma floresta de árvores altas e finas. Do outro lado do rio, a Torre de Londres irradiava um brilho vermelho sob a luz do poente. Os marinheiros e estivadores, ocupados com os navios, também ficavam vermelhos e negros de acordo com o movimento do sol.

Robert Keene estava escondido atrás de grandes cestos de chá que chegaram num navio cargueiro de Calcutá. Ele era um garoto magro, forte, com cabelos castanho-escuro e olhos verdes. As docas de Londres tinham sido seu lar durante todos os seus 12 anos. Ele adorava os perfumes exóticos das especiarias de lugares diferentes, o odor familiar do alcatrão dos navios e até o cheiro azedo do lodo do rio que surgia quando a maré estava baixa. Mas, acima de tudo o que ele mais gostava era das oportunidades que as docas ofereciam.

Uma dessas oportunidades estava surgindo agora mesmo. Um homem de casaca e cartola conduzia uma moça por entre a confusão do cais. O elegante casal caminhava cuidadosamente pela multidão, desviando dos engradados e dos montes de cocô de cavalo. Eles certamente não estavam acostumados a andar por ali. Talvez fossem encontrar alguém ou o homem estivesse interessado em algum cargueiro.

Robby se aproximou.

- Procurando algum navio, senhor?- Perguntou com um sorriso luminoso- Posso ajudá-lo?

O homem olhou o garoto de cima abaixo e torceu o nariz. A mulher apenas o encarou. Nenhum dos dois tinha tempo para moleques maltrapilhos do cais.

- Acho que não- Respondeu o homem cheio de pompa.

Eles se afastaram lentamente e o homem colocou a mão no bolso para conferir se a carteira ainda estava lá. Infelizmente, isso serviu apenas para mostrar a Robby exatamente onde o cavalheiro guardada a carteira. O garoto deu de ombros. Ele tentou ser educado- sempre tentava ser educado, primeiro-, mas havia um estômago vazio para encher e se a boa educação não funcionava, bem, sempre havia outras opções.

Robby seguiu o casal, aproximando-se lentamente. Estava a pouco mais de dez passos deles quando dois jovens surgiram, bloqueando sua visão. Eles eram muito maiores e Robby sabia que era melhor não se meter com grandalhões. Os rapazes sabiam exatamente o que Robby pretendia fader. Um dos dois olhou com uma cara bem feia para mantê-lo afastado. O cavalheiro e sua dama seguiram caminho. Robby viu a carteira do homem desaparecendo no bolso do garoto maior e ficou boquiaberto.

O rapaz que tinha feito cara feia sorriu.

- Esta é para você, nanico- Disse ele, atirando uma moeda para Robby. Então, ele e o parceiro desapareceram na multidão.

Robby agarrou a moeda no ar. Não era o que queria, entretanto seria suficiente para colocar alguma coisa na barriga. Nas docas, era cada um por si, mas os colegas jamais deixariam alguém morrer de fome.

E era assim que os dias passavam para Robby.

Ele usou a moeda para comprar uma torta numa tenda perto do rio. Naquele momento o sol era apenas um traço luminoso no horizonte. Logo não haveria mais luz para navegar e os navios que não tinham conseguido chegar ao porto ancorariam para esperar a luz do novo dia. Mas havia um último navio chegando, pegando a maré pouco antes que baixasse. Robby se sentou ao lado de um poste e, enquanto terminava de comer sua torta, observou o navio. Tinha três mastros e deveria ser da Índia, da América ou até da Austrália. Robby sabia que a cidade de Londres, no ano de 1850, era o coração de um vasto império que se estendia pelo mundo inteiro. Ele tinha vivido ali toda sua vida, mas sua imaginação gostava de viajar. Um dia, visitaria todos aqueles lugares exóticos. Era uma promessa.

Despertar dos vampiros (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora