Capítulo 7

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Do diário de Miguel Diaz
3 de Abril de 1850 (continuação)

E foi assim que me tornei um criminoso, Rosa. Não tive outra escolha além da clandestinidade.

Fiquei surpreso comigo mesmo. Enquanto me afastava do navio, o plano começou a se formar na minha mente. Eu sabia exatamente o que fazer. Pude ver tudo claramente, como a trilha que me trouxera até a cidade.

O primeiro passo era estudar o navio. O capitão já tinha se esquecido de mim. Fiquei andando casualmente pelo cais, de um lado para o outro. A proa e a popa não eram levantadas. O deque era liso de ponta a ponta. Havia três mastros altos e duas coisas que pareciam cabanas, que eu imaginei que cobriam as escadas que levam até onde ficavam as cabines. Havia um grande alçapão no meio do deque, que eu pensei que levaria direto para o porão.

O que mais me interessou foi a parte da frente do deque, a área que ficava na dianteira do navio. O bote do navio ficava lá. Por causa disso e da cobertura diante da primeira escada, que já mencionei, ninguém lá atrás podia ver o que estava acontecendo ali. Para mim, isso era perfeito.

O segundo passo foi encontrar alimentos. Tirei meu casaco e o escondi no final do cais. Papai teria ficado chocado com minha aparência, mas com uma camisa branca (precisando de uma boa lavagem) e os botões da gola abertos, eu parecia um pouco mais com um nativo. Então fui até o mercado e roubei comida.

Não peguei nada que pudesse estragar em pouco tempo. Escolhi muitos biscoitos e algumas laranjas, por causa do escorbuto. Acho que será o suficiente para cerca de duas semanas, se eu comer bem pouquinho. O capitão disse que vai fazer uma parada em Nova York. Quando estivermos lá, posso roubar um pouco mais ou me entregar ao Consulado Britânico. Eles terão que me mandar para casa. Também roubei dois cantis e (bem distante do dono original deles, é claro) os enchi até a boca em um cocho de animais, como se nada fosse mais normal que isso.

O terceiro passo foi chegar casualmente até o final do cais. Peguei o casaco que tinha escondido e enrolei a comida com ele. Fiz isso escondido atrás de uma pilha de cestas de pescaria, para que ninguém me visse do navio. Fiquei na beirada do cais e amarrei as mangas do casaco no pescoço, como se estivesse com uma mochila. Então, caí na água. Felizmente, meu casaco manteve a comida- E este diário- Secos. Rapidamente me aproximei do navio, movendo-me o menos possível para não fazer barulho e não molhar a comida. Eu deveria ter tirado as botas, que ficaram pesadas e puxaram meus pés para os fundo, mas era tarde demais.

O navio estava a minha esquerda. Nadei lentamente sob o cais, por baixo das tábuas, dei a volta no navio e cheguei à proa. Então, estava do lado que dava para o mar. A âncora estava logo acima de mim. Estava presa ao navio e sua corrente desaparecia por um buraco do casco. A âncora estava muito alta para que eu conseguisse alcançá-la, mas me apoiei na corrente, balancei o corpo e me joguei. Fiquei com o coração na boca, pois um escorregão me faria cair na água, fazendo o maior barulho e chamando a atenção de toda a tripulação.

Mas, não. Consegui subir na âncora e fiquei de pé sobre ela. Tive que jogar minha "mochila" primeiro e depois pular. Eu não conseguiria passar com ela nas contas, o buraco era pequeno.

E cá estou em meu novo lar- O depósito da corrente da âncora. Nenhuma das âncoras está sendo usada, então não vejo por que alguém viria aqui durante a viagem. É um espaço menor do que eu imaginei e está cheio de sacos e cordas penduradas para secar. É tão baixo que não consigo ficar de pé. Parte do teto é vazado e permite ver o deque, mas o resto é fechado, por isso posso me esconder com segurança.

Não posso ficar aqui para sempre, é claro, mas estamos em abril e não vou morrer congelado. Em algum momento, minha comida vai acabar. Quando isso acontecer, vou fazer escapadinhas noturnas para arrranjar mais. Então, quando estivermos no meio do Atlântico, mais perto de cada do que de qualquer outro lugar, vou aparecer e me apresentar. Aí, eles terão que me levar à Inglaterra.

Despertar dos vampiros (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora