A ARTE ME CAUSA FASCÍNIO.
É um tipo de refúgio, uma salvação singular e pura. A arte é acolhimento, sinônimo de paz. Eu sentia isso na infância, e sinto com mais força hoje.
E presenciar esse sentimento único ao lado de Joshua Dun parece ser mil vezes mais intenso.
Estamos caminhando lado a lado entre os corredores do museu vazio há minutos. Lá de fora, sei que a cidade pulsa em agitação, inquieta e irritada, mas na atmosfera de paredes brancas e obras artísticas, mal percebo o tempo passar.
Josh também parece mergulhado em traços e curvas, estreitando seus olhos vez ou outra para apreciar mais algum quadro ou escultura. Me pego o admirando por curtos períodos de tempo, me perdendo na pele levemente pintada por sardas e pintas.
Parado ao lado de uma escultura greco-romana, respiro profundamente o ar naturalmente perfumado do ambiente. Longe da loucura do mundo, tudo parece mais leve e, apesar de ter inúmeros compromissos e uma agenda rígida para cumprir, não me preocupo em checar o relógio, observando cegamente um quadro de tons azuis e amarelos bem distante de mim.
- Deus, isso é intenso. - Ouço Josh dizer atrás de mim, me virando para encontrá-lo mergulhado em uma pintura praticamente toda vermelha. - É profundo.
Vou até ele em passos lentos, parando ao seu lado em silêncio.
A arte em questão retrata um tipo perturbador de amor; um homem agarrado ao corpo de uma mulher como se sua vida dependesse dela. A mulher pinga sangue, tendo pinceladas brutas de tom carmim espalhadas por todo seu vestido vitoriano de cores pastéis.
O homem expressa arrependimento, culpa. A mulher parece contente, mantendo uma expressão tranquila e conformada apesar de toda a dor. Parece encontrar paz nos braços de seu amado.
Por um segundo ou dois, percebo a semelhança bizarra entre a cor do sangue e os olhos de Blurryface.
- Qual sua interpretação? - Pergunto, tentando sair desses pensamentos.
Joshua pondera. Pelo canto dos olhos, vejo ele morder o lábio em hesitação. Seus dedos se mexem inquietos atrás de suas costas, um retrato perfeito da confusão que deve estar em sua mente.
- O amor te dilacera, de dentro pra fora. - Ele conclui em um suspiro pesado. - Você já foi machucado?
Seus olhos mocha encontram meu rosto de forma meticulosa, e então vejo uma expressão nova. Não estou falando com Josh Dun, meu amigo divertido e atrevido. De repente tenho vislumbres do psiquiatra forense Josh Dun, o analista profissional. Não me sinto confortável em ser medido dessa forma.
- Nunca me dei a chance. - Respondo o encarando. - E acho que nem tenho tempo pra isso, na verdade.
- Todos temos, Ty. - Ele responde desviando o olhar para a pintura novamente. - É só questão de paciência e dedicação.
Observo o contorno do seu rosto, a forma perfeita que seus cachos parecem cada dia mais bagunçados. Coço a garganta e olho para o quadro na nossa frente, tendo um pouco mais de profundidade na paisagem marrom atrás do casal.
Visto de longe, parecem que estão em algum tipo de plano espiritual, nada mundano. Um tipo de limbo ou algo do gênero. Há tanto arrependimento e intensidade nos traços que parece quase impossível acompanhar tudo sem sentir um aperto no peito.
- Como está o trabalho? - Pergunto tentando desviar a atenção daquele quadro estranhamente perturbador.
Josh pisca algumas vezes, lentamente saindo do transe.
- Está bem. - Responde começando a se afastar da obra. O sigo sem pensar duas vezes. - Estou pegando alguns casos pesados, mas nada fora do normal.
- Não sei como você consegue trabalhar com isso.
Paramos em frente uma escultura romana de um busto masculino. Josh estreita os olhos para enxergar melhor os detalhes, lentamente estendendo a mão para tocar na imagem. Apesar de saber que não é permitido, não tento impedir.
- Depois de um tempo você se acostuma. - Explica passando a ponta do indicador no peitoral da escultura. - Não é tão ruim quanto parece.
Mantenho meu silêncio observando seus dedos subindo pela clavícula da escultura, lentamente alcançando seu queixo. Joshua me observa pelo canto dos olhos. Os dedos dançam nas bochechas e nariz, descendo até a boca com tamanha delicadeza que ignoro o tom sugestivo do gesto.
Por algumas vezes nas últimas semanas me peguei pensando nesses pequenos atos falhos do cacheado, não conseguindo chegar a nenhum tipo de conclusão. Se é proposital ou não, não sei dizer. Mas um frio na barriga se espalha por todo meu corpo quando me pego nessas situações com ele.
- Meu irmão vai se casar daqui duas semanas. - Anuncio tentando quebrar o clima constrangedor que só eu enxergo. - Na minha casa.
Josh estica seu dedo médio juntamente com o indicador, circulando a boca e inserindo lentamente entre os lábios. Sabe que estou observando, e dá um sorriso ladino antes de recolher a mão para dentro de sua calça jeans.
- Não sabia que eram próximos assim.
- Essa é a graça, nós não somos. - Dou de ombros caminhando com ele até outro quadro. - Ele só veio me visitar exigindo que iria se casar lá.
- E você se impôs contra?
Coço a nuca, me sentindo muito envergonhado em admitir minha covardia.
- Eu tentei. - Josh me lança um olhar curioso. Acabo sorrindo em constrangimento. - Acho que prefiro evitar conflitos. É desgastante.
- Você quer que eu te acompanhe?
- O quê?
- No casamento. - Josh sorri esperançoso. - Confesso que estou curioso sobre sua família aparentemente problemática e excêntrica.
Problemática e excêntrica. Em anos, nunca vi alguém os descrever tão bem.
- Acho uma ideia arriscada. - Digo levantando o olhar para um quadro de girassol. - Você sabe, toda a homofobia e tal.
Josh chega perto de mim, perto demais. Sinto sua respiração contra meu pescoço, me virando para seu rosto indecifrável com certa surpresa. Sinto seu hálito de menta contra meu rosto. Sinto vontade de tocar sua pele visivelmente macia.
- Mas nós somos só amigos. - Ele diz baixo, quase provocativo. - Não é?
Josh está definhando minha sanidade pouco a pouco com esses sinais silenciosos, mas não posso reagir. Não posso deixá-lo saber o que penso, o que quero fazer. Minha mente me diz isso, e eu a obedeço cegamente.
- Claro. - Respondo firme. - Amigos.
Ele sorri, passeando os olhos em meu rosto de forma milimétrica. Só mais alguns centímetros e posso encostar em seus lábios.
- Então vou te acompanhar. - Fala sorridente se afastando. - E não há discussão.
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mine.
Fanfiction" [...] E é só então, no auge da minha introspecção doentia, que eu percebo que sou capaz de qualquer coisa para ver Joshua Dun feliz. Mesmo que isso signifique ferir alguém - ou a mim mesmo." [dark romance]