i'm just a ghost.

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MEU PAI SERÁ O PRÓXIMO PREFEITO DE COLOMBUS.

É a notícia bombástica que roda entre os convidados da noite. Após anos de investimentos, a grandiosa família Joseph finalmente entrará no ramo mais lucrativo de todos; política.

Em um dos banheiros sociais, no segundo andar, consigo ouvir os diálogos altos e a música estrondosa, mesmo abafados pelas paredes e portas.

Minha mente divaga, não conseguindo digerir informações com tanta clareza. Sinto gosto de whisky na língua, repassando lentamente a lembrança de algumas doses da bebida juntamente com drinks e champanhe.

Meu corpo inteiro pesa, como se tivesse acabado de acordar de um sono conturbado. Meus olhos encaram a pia do banheiro de forma embaçada, e eu me culpo por estar embriagado antes mesmo do fim da festa. Mas, que horas são?

Não uso relógio, tampouco gravata. Levanto a cabeça tentando focar a visão no espelho a minha frente, não enxergo nada além de olheiras, meu cabelo bagunçado e uma pequena mancha avermelhada no canto da minha boca.

É uma mancha seca, um risco que toma o canto esquerdo do meu lábio inferior até meu queixo. Estreito os olhos tentando identificar o que marca minha pele, mas falho miseravelmente devido ao álcool em meu organismo. Maldita hora em que bebi mais do que deveria.

Em uma ação automática, passo a língua pela mancha, não sentindo gosto algum. No entanto, identifico o aroma adocicado que toma conta do meu terno por inteiro, chegando a conclusão que talvez fosse um pouco de chocolate do qual eu não limpei.

Eles já haviam partido o bolo, e de algum modo consegui me livrar disso e da valsa do casal. Sorte ou falta de respeito? Sinceramente, meu raciocínio está vago demais para decidir.

- Isso vai dar uma ressaca fodida amanhã. - A voz inconfundível de Blurryface sussurra ao pé do meu ouvido, me fazendo dar um sobressalto com sua aparição.

Não o respondo a princípio, de repente me sentindo muito preocupado com a mancha em minha boca. Seria sangue?

- O que faz aqui? - Pergunto ao meu acompanhante sentado na tampa do vaso.

- Não poderia perder o dia mais importante da vida do seu irmão.

- Você nem gosta dele.

Blurryface encara um ponto aleatório da parede como se estivesse pensando. Meus olhos se tornam embaçados, tentando focar na simples visão do ser esguio sentado ao meu lado. O que antes era um corpo sólido e por muitas vezes ameaçador, agora era apenas um espectro fantasmagórico.

-Tem razão. - Ele fala de repente, um sorriso sádico iluminando seu rosto. - Eu odeio ele tanto quanto você.

- Eu não odeio meu irmão. - Digo repreendendo seu comentário. - E é um dia importante pra ele, ok? Não estrague isso.

Blurryface dá uma risada no fundo da garganta, se assemelhando com um rosnado. Um cheiro incomum preenche minhas narinas, tão metálico quanto sangue. A preocupação toma conta dos meus pensamentos dentro daquele cubículo que, a cada segundo, se torna mais apertado e abafado.

- Você já fez isso por nós dois.

Da mesma forma que surgiu, Blurryface desaparece na frente dos meus olhos sem muita cerimônia.

Agora sozinho, respiro profundamente tentando entender em que momento consegui a aparência deplorável que vejo no espelho. As horas de trabalho e a bebedeira contribuíram, é claro, mas alguma coisa dentro de mim me diz que a culpa é inteiramente minha, sem nenhum fator agravante.

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