Capítulo 13

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— Então,  acho que conseguir distrair todo mundo, por um tempo — comentei enquanto
caminhava de braços dados com Dylan pelo jardim.
— Tenho que concordar — meu irmão respondeu com cara de espertinho e me segurei para não estapeá-lo. — Como foi?
Depois dessa pergunta não me segurei mais e dei uns tapas.
— Seu canalha! Uma dama jamais conta.
— Bem, e por acaso uma dama de verdade pode ser fotografada beijando um pretendente no
escuro?
Dei de ombros.
— Não importa. Funcionou.
As fotos em que eu aparecia beijando Lawrence foram devoradas feito ração, como previsto. Era estranho constatar que as pessoas estavam famintas por esse tipo de coisa, mas eu não ligava muito, desde que estivessem satisfeitas. Contudo, as reações ao beijo variaram. Um punhado de jornais o considerou um gesto doce, mas a maioria deles não aprovou que eu beijasse alguém tão no início da competição.
Uma das revistas de fofoca chegou a organizar um debate entre seus dois principais jornalistas para determinar se o beijo fazia de mim uma garota fácil ou uma princesa romântica, já que conhecia Lawrence desde a infância. Eu tentava não dar atenção. Logo apareceriam outras coisas sobre o que falar.
— Dei uma folheada nas páginas — disse, me voltando para Dylan. — Nenhuma matéria
sobre discriminação pós-castas.
— E então? Quais os planos para hoje? Fazer algum deles chorar outra vez?
— Só um chorou — respondi com cara de tédio. — E também não sei. Talvez não vá visitá-los hoje.
— Nada disso — disparou Dylan, me conduzindo por outro caminho pelo jardim. — Juro pra você, Camila. Se for preciso, arrasto você pelo cabelo, mas você tem que participar de verdade da Seleção.
Larguei o braço dele.
— Não consigo parar de pensar que a Seleção do papai não foi tão difícil assim.
— Você perguntou para ele?
— Não, e não sei se posso. Recentemente ele e a mamãe me deram mais detalhes de como tudo aconteceu, com intenção de me ajudar. Sinto que eles devem ter guardado essas coisas por algum motivo, e parece falta de educação perguntar. Além disso, não sei se duas pessoas
lidariam com a situação da mesma maneira, e não tenho a menor vontade de saber se o papai
chegou a se interessar por outra mulher que não a mamãe.
— Não é estranho pensar nisso? — ele perguntou ao sentar em um banco próximo. —
Alguma outra mulher podia ter sido nossa mãe!
— Não! — rebati, também sentando. — Nós só existimos porque eles se encontraram.
Qualquer outra combinação não teria nos criado.
— Você está bagunçando minha cabeça, Cami.
— Desculpe. Esta situação acaba comigo — justifiquei enquanto corria o dedo por uma
pedra. — Quer dizer, eu sei por que é uma ideia intrigante: em algum lugar lá fora, meu par
perfeito pode estar à minha espera, e por sorte posso ter sorteado o nome dele e me apaixonar
loucamente. Mas, depois, sinto que sou um objeto em exposição, que estou sendo julgada mais do que o normal. E quando olho para os garotos, vejo que são pessoas totalmente diferentes do tipo de gente que costumo encontrar, e acho que não gosto disso. Tudo na Seleção me deixa confusa.
Dylan permaneceu quieto por alguns instantes. Dava para notar que ele escolhia as palavras
com cuidado, o que me deixou nervosa.
Eu não sabia ao certo se era coisa de gêmeos ou uma ligação exclusiva entre nós dois, mas quase dava para sentir nossas discordâncias fisicamente. Parecia existir um elástico esticado
entre nós.
— Ouça, Cami, sei que isso pode ser o jeito errado de abordar a questão, mas eu acho mesmo que pode ser bom para você ter alguém na vida. Estou há muito tempo com Normani e,
mesmo se tudo acabasse amanhã, eu seria uma pessoa melhor por causa dela. Há coisas sobre
nós mesmos que só aprendemos quando deixamos alguém se aproximar de verdade.
— E como vocês dois conseguem fazer isso? Vocês ficam quase o tempo todo distantes.
Ele sorriu.
— Ela é a minha alma gêmea. Eu sei disso.
— Eu não acredito em alma gêmea — falei enquanto examinava meus sapatos. — Você
conheceu uma princesa da França simplesmente porque só conhece gente da realeza, e gostou
mais dela que das outras princesas. A sua verdadeira alma gêmea pode estar ordenhando uma vaca neste instante e você jamais saberá.
— Você sempre é tão negativa com ela — seu tom de voz tensionou ainda mais o elástico
invisível.
— Só estou discutindo as possibilidades.
— Enquanto isso, você tem dúzias de possibilidades bem na sua frente e se recusa a olhar para elas.
Torci o nariz.
— Foi o papai que mandou você dizer isso?
— Não! Só acho que você precisa encarar isso com a mente aberta. Você é uma das pessoas
mais isoladas do país, mas isso não quer dizer que deva ficar na defensiva o tempo inteiro.
Você precisa viver um romance pelo menos uma vez na vida.
— Ei! Eu vivi romances!
— Uma foto no jornal não conta como romance — ele rebateu inflamado. — Nem ter ficado
com Leron Troyes na festa de Natal em Paris.
Perdi o fôlego.
— Como você sabe?
— Todo mundo sabe.
— Até nossos pais?
— O papai não. Bom, a não ser que a mamãe tenha contado, porque tenho certeza de que ela
sabe.
Enterrei o rosto nas mãos e soltei uma espécie de guincho com toda a minha humilhação.
— Só quero dizer que a Seleção pode ser boa para você.
Essa frase arrancou toda vergonha do meu corpo e a substituiu por raiva.
— Todos não param de dizer isso: pode ser bom para mim. O que isso quer dizer? Sou
inteligente, bonita e forte. Não preciso ser salva.
Dylan deu de ombros e disse simplesmente:
— Talvez não. Mas jamais saberá se algum deles precisa.
Cravei os olhos na grama e refleti sobre aquelas palavras. Elas só me confundiam ainda mais.
— O que você está fazendo, Dylan? Por que mudou de ideia de repente? Pensei que
estivesse do meu lado.
Vi um brilho em seus olhos que ele disfarçou rapidamente e, em seguida, passou o braço por cima do meu ombro.
— Continuo do seu lado, Camila. Você, mamãe e Normani são as mulheres mais importantes da minha vida. Então, por favor, entenda que às vezes eu me pergunte se você é feliz.
— Eu sou feliz, Dylan. Sou a princesa. Tenho tudo.
— Acho que você confunde conforto com felicidade.
As palavras dele me lembraram vagamente da conversa recente que tive com a minha mãe.
Dylan acariciou meu braço, levantou e ajeitou o paletó.
— Prometi que ia ajudar Sofia com a lição de francês. Apenas pense nisso, certo? Talvez eu esteja errado. Com certeza não seria a primeira vez.
Nós dois sorrimos.
— Vou pensar — assenti.
Ele piscou para mim e provocou:
— Marque um encontro ou coisa assim. Você precisa viver mais.
Cheguei diante da porta do Salão dos Homens e comecei a andar em círculos. Estava preocupada, pensando se aquilo não seria uma perda de tempo. Depois da conversa com Dylan, eu deveria ter ido direto para o escritório. Para ser sincera, não via a hora de voltar à
monotonia diária de mexer com a burocracia. Mas as palavras dele, mais do que as de qualquer outra pessoa, me fizeram pensar em pelo menos tentar. Não da maneira falsa que
tinha planejado para as câmeras, mas um esforço genuíno.
Disse a mim mesma que cedo ou tarde eu teria que marcar encontros com eles de qualquer
jeito. Era o menor dos meus deveres. Isso não significaria escolher alguém; seria simplesmente cumprir a promessa que tinha feito ao meu pai e fazer o que as pessoas esperavam.
Suspirando, entreguei o envelope ao mordomo.
— Muito bem, vá em frente.
Ele fez uma reverência antes de entrar. Esperei do lado de fora.
Tinha decidido não invadir mais o Salão dos Homens. Queria que os Selecionados pisassem em ovos, mas todo mundo precisa de uma folga de vez em quando. Eu sabia disso mais do que ninguém.
O mordomo voltou um momento depois e segurou a porta para Darren passar. Duas coisas me passaram pela cabeça à medida que ele se aproximava. Primeiro, me perguntei o que Lawrence pensaria, o que — reconheço — foi estranho. Segundo, era óbvio que Darren não sabia o que esperar de mim, porque veio com muita cautela e parou a quase um metro de mim.
— Alteza — ele cumprimentou com uma reverência.
Juntei as mãos à frente do corpo e disse:
— Pode me chamar de Camila.
Uma ponta de sorriso surgiu em seu rosto.
— Camila — repetiu.
Nenhuma pessoa no mundo é tão poderosa quanto você.
— Estava pensando se você gostaria de se juntar a mim para uma sobremesa hoje depois do
jantar.
— Só você e eu?
Dei um suspiro.
— Quer convidar mais alguém? Também precisa de um intérprete?
— Não, não! — ele respondeu com um verdadeiro sorriso no rosto. — Estou só…
surpreso… de um jeito bom, acho.
— Ah — Essa foi a minha patética reação a uma confissão tão doce, mas eu simplesmente não estava preparada.
Darren permaneceu imóvel, com as mãos enfiadas nos bolsos, e radiante. Era difícil vê-lo
como alguém que eu simplesmente mandaria de volta para casa.
— Humm… Bom, vou passar no seu quarto uns vinte minutos depois do jantar e vamos para
uma das salas de estar no andar de cima.
— Parece ótimo. Até mais tarde.
— Até mais tarde — respondi, já começando a andar.
Fiquei incomodada ao perceber que agora eu estava ansiosa para o nosso encontro. A
empolgação dele era bem fofa. Mas, pior do que sentir que a Seleção estava começando a mexer comigo, foi ver o olhar exultante de Darren quando me flagrou virando para trás para
observá-lo uma última vez antes de me afastar.

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