prólogo

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Não era a primeira vez que ficava trancada naquela sala por horas, refletindo sobre as últimas atitudes e ações. Entretanto, eu jamais me acostumaria àquelas condições; à temperatura baixa do ar-condicionado, ao silêncio quase ensurdecedor, interrompido apenas pelo ruído baixo do relógio que cantava a mesma melodia a cada segundo que passava, me enchendo de agonia.

A pele ainda ardia devido aos golpes de momentos atrás, e os joelhos latejavam por estarem em contato com a aspereza do tapete nada confortável por mais tempo do que o apropriado. A coluna também doía... Na verdade, tudo doía. De dentro para fora.

Eu não podia me mover, de qualquer forma. Isso implicava mais horas de castigo, de fome e sede, de frio e silêncio.

Não havia nada que odiasse mais do que a solidão.

Eu sabia que continuava a ser observada pelas câmaras de segurança estrategicamente instaladas no escritório. Por isso, não mexi sequer um dedo mesmo quando uma gota de suor lambeu um dos machucados, fazendo-o formigar e arder.

A porta se abriu depois de alguns segundos, justamente quando eu pensava que iria enlouquecer. Yuto Sato percorreu o mesmo caminho até mim, com os passos lentos agonizando até a última célula do meu corpo. Aquele era o seu ritmo desde sempre; era como se aproveitasse cada segundo para apreciar o desastre no qual me tornava a cada vez que tocava em mim, e se orgulhasse disso.

O corpo ficou tenso pela ansiedade de ser, finalmente, solto. As cordas raspavam a minha pele, esticando os braços para trás, unindo os tornozelos e me mantendo quase encurvada em direção ao chão. Não me importei com a nudez; ela havia se tornado tão costumeira quanto os golpes, que eram dolorosos, mas não fortes o suficiente para deixarem marcas permanentes, embora existissem algumas quase imperceptíveis.

Yuto agachou a minha frente. Mantive o olhar no tapete escuro, submissa como sabia que ele exigia e gostava. O suor fez cócegas no meu rosto e mais fios do cabelo cacheado pareceram colar-se à minha pele quando o mesmo suspirou com suavidade, me observando por um longo momento.

— Já refletiu a respeito da sua insolência?

— Sim, senhor. — soprei de volta, mantendo a voz baixa, suave e mansa, como se não soubesse que o castigo não havia tido motivos fortes o suficiente para acontecer. A única coisa que fiz naquele dia foi elevar o tom de voz ao fixar o olhar no seu, me negando educadamente a participar em um evento por estar indisposta. No final, eu realmente acabei não indo, mas fiquei presa naquela sala por mais horas do que podia me lembrar.

Ele, aparentemente, havia retornado com o resto da família fazia pouco tempo. As vestes formais e o hálito com cheiro a álcool eram pistas disso.

— Espero bem que sim. — murmurou de volta, empurrando alguns cachos para trás dos meus ombros. Quis me encolher, sentindo a exposição se intensificar quando continuou a me observar em silêncio por longos segundos — Se aquilo se repetir, Ísis, não serei tão tolerante.

— Sim, senhor.

Quase chorei de alívio quando as cordas foram cortadas, caindo no chão com um baque seco. Trêmula e com um nó espesso na garganta, ouvi-o sair e deixar a porta aberta. Dei um momento a mim mesma apenas para sentir que realmente estava livre de novo após todo aquele tempo, com receio de vacilar no primeiro passo e cair. Eu teria, ainda, de caminhar nua até o meu quarto.

Geralmente, quando isso acontecia, ninguém olhava para mim. A minha mãe, o meu irmão e os empregados apenas seguiam com as suas atividades normalmente, como se eu não estivesse ali; como se fosse invisível. E, sinceramente, era o que gostaria de ser.

Na verdade, não queria nem existir.

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