Saio do escritório correndo, meu coração bate forte, sinto todo o peso do meu corpo em mim. Quando entro no meu carro sinto minha garganta se fechar, eu ligo o carro no estacionamento e saio. As lágrimas brotam no meu rosto e dificultam a visão, eu grito de dor enquanto dirijo. Tudo isso por nada. Ele me deixou porque achou que eu seria mais feliz assim, mas eu não fui. Tudo o que fomos, o que tivemos, foi arruinado por absolutamente nada. Quando penso que se ele tivesse ido àquele casamento nós estaríamos com nosso filho. Estaríamos juntos, felizes. Mesmo que fosse naquela antiga cidade, mesmo que eu nunca tivesse me tornado uma executiva de sucesso. Ainda sim eu seria mãe, seria esposa e isso seria o suficiente pra mim. Seria mais que o suficiente. Toda a culpa que eu senti esses anos todos, por achar que o problema estava comigo, por achar que eu era indigna e não merecia as coisas boas. Eu procurei todos esses anos por sinais durante o nosso relacionamento, eu revivia cada dia, tentando achar o momento em que ele deixou de me amar. Mas eu nunca achava. Tudo era perfeito. Isso sempre foi uma incógnita pra mim.
Por muito tempo eu não quis saber o porquê de tudo isso, eu sempre tive medo de perdoar Luke. Eu ainda tenho. Eu tenho tanto medo de ficar vulnerável de novo, de me entregar e ele me deixar no altar de novo. E por mais que eu o ame, com todo o meu ser, o meu corpo, a minha alma. Eu não posso mais torná-lo parte da minha vida. Não depois de tudo isso.
Quando finalmente chego em casa, sabe se lá Deus como, devido o choro que tapava minha visão. Finalmente sinto uma sensação de alívio. É como se o peso de 5 anos tivesse saído das minhas costas, como se eu finalmente pudesse respirar de novo.
Eu tomo banho e choro no chuveiro, meu corpo todo dói, e eu sinto raiva. Uma raiva que nunca imaginei sentir na vida. Quando olho para baixo vejo minha barriga, e então coloco as mãos nela, lembrando do meu bebê que eu nunca conheci o rosto. Na criança que saiu de mim sozinha em um apartamento. Eu senti tanta dor, tanta dor. Eu queria ter visto seu rosto, se ele ao menos tivesse formado, se eu pudesse ter visualizado uma única vez a mistura que seria nossa. Talvez ele tivesse os olhos dele, o meu cabelo, a minha pele morena. Talvez ele fosse branquelo, talvez talvez talvez. Eu nunca saberei. Tudo o que consegui visualizar foi um coágulo de sangue, uma massa fetal disforme.
Fiquei tão mal por isso, nunca contei a minha família sobre o bebê, só quem sabia foram os médicos que me atenderam.
***5 anos atrás
-A senhora teve um aborto espontâneo -o médico diz enquanto pega a prancheta e faz uma cara triste.
-Eu não, eu não sabia... que estava grávida-eu digo enquanto choro.
-A senhora passou por algum evento muito estressante no último mês?
-Sim-eu digo quase imediatamente.-Eu tive uma grande perda. Eu não estava comendo ou dormindo direito, além de chorar muito e ter crise de ansiedade.
-Provavelmente essa foi a causa, a senhora é uma mulher jovem. A enfermeira vai levar você até a sala de curetagem, depois de alguns meses faremos novos exames para saber se a sua capacidade de gerar filhos ficou comprometida devido o aborto.
Quando ele diz a última frase eu entro em choque e então paro de escutar as coisas a minha volta. Como se o mundo tivesse ficado mudo
***
5 anos depoisEu durmo enquanto tento afastar aquele dia da minha mente. Uma garrafa de vinho viria bem nessa situação, mas eu não podia arriscar ter um colapso de novo. Quando acordo na manhã seguinte já é mais de meio dia. Eu permaneço na cama, imóvel. Por dias. Dias.
A depressão te afunda. É como se um vampiro sugasse toda a sua energia vital. As coisas mais banais se tornam as mais difíceis, como acordar, tomar um banho ou escovar os dentes. Tudo é oneroso. Tudo é custoso. A tv já não tem mais graça, as músicas são todas ruins, e as pessoas são sempre más e ocas. É como se o mundo perdesse as cores e tudo ficasse preto e branco. Eu assistia a minha vida passar, eu era espectadora. Nunca protagonista. Eu me levantava, comia e voltava a dormir. Tomava antidepressivos e era a única hora que eu me sentia um pouco melhor, nos primeiros 30 minutos de efeito do remédio.
Parei de sair de casa e comecei a pedir tudo pela internet, inclusive o supermercado. A minha cabeça era uma tv antiga chiando enquanto não mostrava nenhuma imagem. Só uma tela cinza. Proibi a entrada de outras pessoas no meu apartamento e troquei de número. Eu precisava disso, precisava sofrer tudo, para não sofrer nunca mais. Eu vivi o luto, pelo meu bebê e pela vida que eu devia ter tido.E durante esse tempo em que eu estava doente, esse foi o meu mantra, um poema escrito por Rupi Kaur:
“primeiro peguei minhas palavras
cada não posso, não vou, não sou boa o bastante
fiz uma fila e dei um tiro em todas
depois peguei meus pensamentos invisíveis e dispersos
não dava tempo de reunir um por um
joguei água em tudo
transformei meu cabelo em tecido
deixei de molho com limão e menta coloquei na boca e fui escalando a trança até chegar na parte de trás da cabeça
fiquei de joelhos e comecei a limpar minha mente
demorou vinte e um dias
ralei os joelhos mas não me importei
não ganhei de presente o ar do meu pulmão para depois sufocá-lo
esfreguei a falta de confiança até o osso
até o amor ficar exposto.”
Depois de um mês eu finalmente procurei ajuda profissional, foram várias sessões de terapia, durante 3 meses. 3 Meses tentando entender tudo que aconteceu. Depois de finalmente me sentir curada eu criei coragem para ver os meus e-mails.
Lá tinha e-mails de todo o tipo. Tinha e-mails de Luke, de Gerrard, de Lisa, dos meus pais, dos meus amigos, do pessoal do escritório.
Clico para abrir os e-mails de Gerrard.
"Oi Grace, estou preocupado. Você não responde as minhas mensagens nem as minhas ligações, estive no seu prédio mas o porteiro não me deixou entrar. Eu fiquei dias te esperando sair mas você não saia. Estou preocupado. Me retorna assim que puder. Nós precisamos conversar sobre nós."
Os e-mails seguintes são de Luke pedindo desculpas e dizendo que se arrepende muito por ter feito o que fez. Eu leio mas não respondo.
No final do dia eu decido finalmente mandar um email para cada um.
"Querido, Gerrard. Estou feliz que não tenha desistido de mim. Mesmo depois de tudo o que fiz. O motivo de eu ter ficado longe é porque precisava me curar. Agora me sinto melhor, gostaria de marcar um encontro em breve. "
"Luke, preciso falar com você na semana que vem. Estou bem, não precisa se preocupar."
"Lisa, eu devo ser uma péssima amiga por sumir assim, não mereço a amiga que tenho. Me desculpa por favor."
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Abandonada no altar -Amanda Plath
RomanceGrace foi abandonada no altar, ela se tornou uma mulher forte e fez de tudo para esquecer o passado. Mas as coisas não terminadas acabam voltando com o tempo, e da pior forma possível. Luke, seu ex noivo, volta para sua vida após 5 anos, agora como...