"...ela é um copo que transborda sofrimento. Seus olhos carregam o impacto de seus infortúnios, e são como cachoeiras.
Contudo não se encontra frieza em seus gestos, nem desistência em suas palavras.
Não a temo, eu a admiro."
Foi o que ouvi naquela manhã invernosa, e cada palavra que ele dissera, nenhum efeito me surtia. Embora talvez eu devesse sentir algo, um certo incômodo ou preocupação, mas não foi algo que conquistasse minha atenção.
Em todo o caso, logo não mais me importaria tanto com este assunto, já que o tic tac do grande relógio do salão me faria entrar em transe.Por um breve momento ouvi aquela risada engraçada que parecia ser de uma criança, risada essa que me parecia tão íntima e memorável. Em outro lapso de momento a vi correndo para o pátio, e
preocupada com o fato de que ela não estava vestida adequadamente para a estação, a segui.
Mas para a minha surpresa, havia sol, a grama estava totalmente seca, pássaros cantando e aquela criança de risada familiar corria entre os arbustos e árvores, brincando com a minha atenção.Andando e com os olhos totalmente atentos a tudo ao meu redor, a procurei com paciência naquele imenso jardim, e quando a encontrei sentada sobre uma toalha xadrez, se abrigando do sol na sombra de uma macieira, a observei conversar.
Não havia alguém com quem ela pudesse ter uma conversa e até mesmo brincar e comer, estava só, mas não agia como se estivesse.
Conversava e entre risos estava sempre brincando, mas logo me dei conta de que a imaginação fértil de uma doce criança pode criar para ela mundos inimagináveis para uma adulta como eu.Sentei-me no banco de ferro próximo ao canteiro de rosas brancas, e a assisti atentamente gesticular, sorrir e comer as frutas servidas naquela toalha.
Por um momento, aquela cena parecia algo tão tangível para mim, algo tão real e recente.
Ouvia sua voz em meio a risadas e cochichos, conversas das quais não conseguia entender, mas era como se eu fizesse parte daquilo.Permaneci em silêncio, admirando toda a inocência daquela garotinha de vestido azul e fita no cabelo,
me senti invisível até o momento em que ela olhou para mim com aqueles olhos amendoados e me deu um breve e tímido sorriso.Senti sobre a pele um vento que trouxe consigo o barulho das folhas das árvores do jardim e o cheiro das suas diversas flores,
mas nenhum efeito teve o vento no cenário da garotinha.
Então percebi a imensidão daquele momento.Me levantei do banco, e andei em direção àquela macieira.
A cada passo, os raios de sol aqueciam meu rosto e a ansiedade fazia tremer todo o meu corpo.
Diante dos meus olhos, a garotinha de fita no cabelo desaparecera, deixando apenas o som da sua risada e aquela toalha xadrez.
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Madeleine
Historical FictionInspirada em uma história real, esta obra traz consigo a breve história de Madeleine, que era apenas uma criança quando foi brutalmente assassinada, o que culminou em eventos trágicos, marcando para sempre a família Montgomery.