Diário de Lydia

0 1 0
                                    

Meses se passaram, e ainda que houvesse som de risadas, brincadeiras o apoio mútuo entre nós, era difícil viver os dias a espera de uma dor amenizada pelo tempo.

A rotina já era outra, uma com a qual tivemos de aprender a nos acostumar já que nenhuma rotina seria o bastante para tamanha superação, a não ser a qual por obrigação estávamos lidando.

Eu não poderia reclamar sobre essa nova fase.

Além da minha família, ainda que aos pedaços, também havia a companhia dos criados, em especial Peggy e Eleanor, que muito suporte deram a cada um de nós.
Nos foram de grande alívio suas presenças. Com notório esforço, dedicavam-se todos os dias para que as horas não parecessem pesadas enquanto passavam, nos carregando para mais longe ainda das memórias que outrora foram vividas.

Meu marido, Charles, um excelente homem, se tornara mais notável ainda por toda sua superação e força de vontade.
Me enchia de orgulho sua motivação e carisma. A cada dia, tive mais certeza de que meu amado era a escolha certa para mim, porquanto ele me fazia sentir da mesma maneira.

Meu querido e doce cunhado, Edmund, que tanto sofreu e ainda sofre por suas perdas, continua bravamente se esforçando para nos garantir boas risadas e boas histórias. Era um excelente pai, amigo e homem. Honrado, sempre mantendo vivo o que de melhor Delilah deixou em seu coração.

Leila, minha amada irmã, que por muitos dias enfrentou dores terríveis em sua alma, sempre amorosa e solidária, e muito gentil. Disposta todos os dias a não se deixar vencer pela dor de estimáveis perdas, levantava antes mesmo do sol raiar e buscava se manter sempre bem ocupada, com leituras, costura, receitas...

Estávamos todos quebrados mas lutando para juntar cada caco que se despedaçou de nós. E enquanto cada um de nós viver para ajudar o nosso próximo, na luta contra essa inevitável dor, ainda haverá a esperança do esquecimento da péssima memória, indo em direção a somente boas lembranças.

Nesta tarde, a qual estou aqui no jardim, debaixo da macieira, me pondo a escrever neste diário que tanto têm me ajudado a pôr para fora o que me envenena por dentro, respiro o ar que em seu monte, faz as folhas se agitarem e meus cabelos esvoaçarem.

E enquanto assisto meus sobrinhos brincarem, me deleito com o som de suas vozes dando risadas de alegria e contentamento pelo momento presente, uma lição que tenho aprendido dia após dia, observando as coisas mais simples e fantásticas que podem existir.

O canteiro de rosas se tornou o meu lugar favorito para sentar e escrever, porém hoje, o conforto da grama debaixo da macieira é onde encontro a audácia de enfrentar o hoje.

Ainda sonho com as risadas da minha doce Madeleine, seu quarto continua intacto, e suas roupas guardadas, até o momento em que terei coragem para doar aos mais necessitados.

Talvez por ainda não ter feito, tenho sido extremamente egoísta, mas como mãe e mulher que perdeu sua cria, estou buscando forças todos os dias, e tenho encontrado um pequeno auxílio dos céus, da minha família e amigos queridos.

As vezes sob o som do grande relógio, dos passos das crianças correndo pela casa, da chaleira a preparar o chá da tarde, e das pequenas amostras de risadas entre nós, vislumbro a lucidez da nossa atual realidade, mas também nessa realidade encontramos motivos para não nos prender a ela.

MadeleineOnde histórias criam vida. Descubra agora