Capítulo 1 (Um Estranho No Ninho)

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            Fevereiro de 1990. Época de "festa da carne." Uma temporada em que as pessoas adoravam se fantasiar, daquilo que gostariam de ser e praticar. Conhecidos por muitos como, Carnaval. Divertido para poucos, e uma desculpa para os excessos.

Essas, comemorações, entre outras, perturbavam meu compacto corpo humano. Portanto, nessa fase, precocemente os primeiros sinais de um estranho no ninho já eram notáveis.

Minha pequena família, composta por mim, meu adorado irmão Carl, meu pai Joe e minha mãe Eleonora, vivia aconchegada em um colchão na sala da humilde casa de minha avó materna, Eva. Aquela sala era o nosso refúgio, onde transformamos em nosso lar. Vovó Eva era uma senhora de coração enorme, mas também carregava consigo uma alma atormentada pelos sofrimentos do passado. Ela praticamente nos sustentava com o pouco que recebia da pensão por separação, de meu avô Teobaldo.

Uma situação complicada e cheio de mágoas entre vovó e sua irmã, foi o motivo principal para o rompimento com vovô. Resumindo, dona Eva, foi traída por sua própria irmã.

A pensão era quase uma miséria, mas vovó fazia o possível para nos alimentar com o que tinha. Meu pai trabalhava em alguns trabalhos temporários quando surgiam, mas eram raros e não tinha estabilidade. Papai tinha uma mente simples, enquanto minha mãe era filha de um homem extremamente inteligente, mas também arrogante.

As ofensas de meu avô eram tão objetivas em relação a mamãe, que ela cresceu com sérios problemas emocionais. Éramos uma família simples, e com poucas expectativas. Assim vivíamos, um dia de cada vez.

Naquela manhã, ainda dormindo, tive um sonho em que caía do céu e uma voz falava diretamente à minha mente.

A voz não era muito clara, mas parecia estar tentando se comunicar. Quando abri os olhos, tentei reconhecer o local, o novo ambiente em que me encontrava. Virei de um lado para o outro, procurando algo familiar. Olhei para o velho televisor que parecia ter passado por várias mãos, e percebi o quão modesto e pequeno era o espaço. Como mencionei antes, éramos uma família com poucos recursos.

Movida pela curiosidade, olhei para as minhas mãos e meus pés e senti que algo estava faltando. Uma certa masculinidade, uma força que agora não estava presente. Em questão de segundos, tive a certeza de que habitava um novo corpo.

"Eu era agora uma criança, uma frágil e inocente garotinha", pensei inicialmente, sem entender completamente a situação.

Surgiram muitas dúvidas em minha mente em questão de segundos. Levantei-me e fui em direção à cozinha, atraída pelo aroma do café.

Avistei a senhora que seria vovó Eva, agindo na cozinha como sempre fazia, cuidando da família. Reconhecia o ambiente como meu novo lar, mas sentia-me deslocada. Tudo ao meu redor parecia admirável naquele momento: o sabor do café com leite, o som vindo do surrado rádio do meu pai e a forma como eles se relacionavam entre si. E, aos poucos, minhas dúvidas se tornavam mais evidentes. Eu estava vivendo e aprendendo a partir do momento em que abri os olhos naquela manhã.

Meu irmão Carl era dois anos mais velho do que eu, prestes a completar seis anos em abril, enquanto eu faria quatro em maio. Brincávamos e brigávamos constantemente, como irmãos costumam fazer, mas nada muito sério.

Havia um fato curioso que mamãe adorava nos contar. Durante a minha fase de bebê, quando Carl tinha apenas dois anos, ele entrou no quarto em que eu dormia com uma faca. O que ficou claro na época, é que ele estava sendo um agente do mau.

Segundo mamãe, ele não tinha noção do que estava fazendo. Acredito também. Meu pai tentou intervir, mas a porta estava trancada. Por algum motivo inexplicável, a porta se abriu, evitando o pior. Meu pobre irmão sofreu severas punições com o cinto que papai usava para demonstrar sua autoridade, mas acredito que influências espirituais estavam em jogo.

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