Meus encontros com Reid deveriam ser às sextas após as aulas, junto com as outras letras "A"s da turma.
Apesar disso, hoje na segunda feira de manhã, quando entreguei pra ele a lista de presença no fim da aula, ele me pediu pra que eu fosse à sua sala.
Inventei uma desculpa para Grace e pedi que ela fosse almoçar primeiro e guardasse algumas das fritas do refeitório para mim.
Bato duas vezes na porta antes de entrar e agradeço à enorme ressaca que estou, por ter me impedido de surtar no caminho até aqui.
—Entre - a voz de Reid soa distante, mas ainda audível.
Entro na sala e ele está lendo um livro, em pé junto à estante.
A maldita estante. Eu já odiei algumas pessoas em minha vida, mas odiar um objeto inanimado era novo pra mim.
— Da última vez que esteve aqui, você esqueceu esse livro - ele fala, fechando o livro que segura e o passa pra mim.
— Obrigada. Era só isso? - pergunto, ansiosa pra sair dali.
Uma dor de cabeça que durante a aula estava apenas no início se intensificou, provavelmente pela junção de eu ter chegado em casa do club às 6:00 da manhã , dormido 1 hora, não ter tomado café e ter assistido a uma aula de 4 horas. Muitos números, né?
Eu não sou muito boa em matemática, mas se fizer as contas direitinho o resultado seria claro: minha cabeça iria explodir.
Reid levanta uma sobrancelha e cruza os braços.
— Você ta bem? - ele pergunta desconfiado.
— Estou sim! - minto.
— Não parece bem.
— É porque estou ótima!
— Em minha opinião não parece nem bem nem ótima - ele constata ainda me observando. Porque a voz dele parece tão alta e incômoda do nada?
Seu despertador toca e eu pulo com o som estridente do celular e derrubo o livro no chão.
Apesar da dor de cabeça, percebo que ele começa a juntar as peças quando seus olhos se estreitam em minha direção.
Perfeito! Ele já deve estar achando que eu passei a noite bebendo outra vez e que ainda tive a audácia de aparecer nesse estado deplorável em sua aula.
Eu abaixo pra pegar o livro, mas sinto uma tontura.
— Hey, hey, calma... - Reid fala com uma voz baixa e me estabiliza, me levando para sentar no divã de sua sala.
— Eu não bebi, ta? - digo me sentindo na obrigação de me justificar.
— Não disse que bebeu.
— Mas pensou! - eu me assusto com a minha própria voz alta, a qual manda mais uma pontada de dor na minha cabeça.
— Além de bela, sabe ler mentes. Uma combinação perigosa, eu diria.
Eu levanto meus olhos para ele surpresa. Ele falou aquilo mesmo ou eu estava delirando?
Reid se levanta e vai até o frigobar; pega uma garrafa de água e algo que esta em sua gaveta. Eu apenas o observo confusa.
— Aqui - Ele me diz abrindo o comprimido na minha mão - é um dos melhores remédios que conheço, vai te ajudar.
Considerando a dor e o cansaço que sinto, não faço perguntas e coloco o comprimido na boca.
— Coloque debaixo da língua. A ação sublingual é mais rápida - ele me informa.
Reid abre a garrafa de água pra mim e eu tomo alguns goles.
— É pra dor de cabeça?
— Ressacas em geral. Mesmo que seja por privação de sono e não por álcool.
— Sério? Como funciona?
Sinto meus olhos pesarem... Deus, eu devia ter dormido.
— Como a maioria dos remédios funcionam, o princípio básico do sono.
— O que? - pergunto confusa.
— Se você dorme, não sente dor. E no seu caso, eu diria que uma prescrição de uma boa soneca e uma refeição digna vão te deixar novinha em folha.
Eu ainda estava confusa, mas a mistura da falta de sono, com a tontura e a ação do remédio me impediram de perguntar algo a mais. Então fiz o que todo o meu corpo me implorou que fizesse durante a aula de hoje de manhã: fechei os olhos e dormi.—————————-——§———————————
Abro os olhos devagar e o vejo sentado na cadeira de couro. Lembrava dela um pouco mais afastada, mas acho que ele a trouxe pra perto de mim.
Eu pisco algumas vezes até minha visão sair do borrado para o nítido.
Reid parece estar corrigindo algum resumo, pois está riscando várias vezes a folha de papel.
Um pensamento me atinge:
eu passei mal e dormi no divã dele. Simplesmente dormi. Tem como isso ficar pior?!
Com um mínimo movimento, eu olho a distância entre mim e a porta.
Quais seriam as chances de eu me mover daqui pra ali, abri a porta, sair dessa sala e fingir que nada disso aconteceu? Talvez se eu engatinhasse bem, bem lentamente... eu penso e começo a me arrastar pra fora do divã.
— Bom dia! - Reid diz num tom meio irônico, ainda sem tirar o olho das folhas que segura. Ele aponta pra uma bandeja atrás dele, em cima de sua mesa.
— Pedi comida chinesa, espero que goste.
— Desculpe? - pergunto confusa, me levantando. Parece que meu plano de me esgueirar sorrateiramente para fora foi por água a baixo....
— Você está fraca e praticamente desmaiou no meu divã. Te alimentar quando você acordasse era a escolha mais óbvia a se fazer, não acha? - ele diz naturalmente.
— Sim, mas...
Reid levanta os olhos pra mim e me analisa. Após alguns segundos, vendo que eu não iria terminar o meu "mas", ele continua...
— Se quiser, pode levantar e sair, mas o refeitório ja fechou e não vai achar comida a essa hora. Se fizer um pedido no app de entregas, imagino que demore uns 40 minutos pra chegar - Diz ele enumerando as minhas possibilidades.Eu não queria admitir, mas realmente era uma escolha óbvia. Não era algo que qualquer professor faria, mas ainda assim, era uma opção óbvia.
Minha barriga ronca e o cheiro da comida invade meu nariz.
— Pode se servir na mesa - diz ele e eu o faço. Quando termino de comer, me sinto viva novamente. O sono me tirou a dor de cabeça e a comida fez a tontura passar.
Agora minha mente estava em perfeito estado para entrar em parafuso com o que quer que estivesse acontecendo naquela sala.
Eu poderia agradece-lo e sair, sem fazer perguntas. Mas então não seria eu.
A situação toda era estranha demais para ser simplesmente ignorada.
Eu tomo o último gole do suco, limpo minha boca, e me sento novamente no divã, em frente a ele.
Reid continua fazendo suas correções e quando vejo que não tem intenção de mudar seu estado de quietude, no qual estava durante todo o tempo que levei para almoçar, eu simplesmente deixo minhas dúvidas transbordarem até ele:— Mas que diabos está acontecendo aqui?
Primeiro você diz que eu sou a mulher mais bela da cidade, depois passa mais tempo comigo do que com qualquer estudante e eu penso: provavelmente só temos um bom assunto para se discutir, mas aí você fica a uma distância completamente questionável de mim, ficando prestes a me beijar mas não o faz, depois decide me deixar dormir no seu divã e me compra comida chinesa! E diz que é óbvio? Óbvio seria me levar na enfermaria e deixar que alguém cuidasse de mim, porque decidiu fazer isso? Por que tem feito tudo isso?Reid parece surpreso com o tanto de informação que despejo em cima dele, mas logo dá um meio sorriso e acena levemente para si mesmo, como se esperasse que eu o perguntasse sobre suas intenções.
— Quer que eu responda a cada uma de suas justificativas em ordem ou quer receber uma resposta geral, senhorita Hills?
— A cada uma! - digo assim que ele pergunta — Por favor - acrescento depois, limpando a garganta.
Tento manter a cabeça erguida enquanto espero sua resposta, apesar de ter a vontade de enfiar a minha cara num buraco, junto com todos os meus sonhos que provavelmente terei de enterrar após confrontá-lo desse jeito.
Reid finalmente põe a apostila que corrigia ao meu lado no divã, se inclina em direção a mim com as mãos cruzadas e descansando-as sobre as pernas e como eu fiz, derrama uma chuva de informações sobre mim:— Em Primeiro lugar, constatei um fato de que você é a mulher mais bela que já vi, em segundo, discutir assuntos da literatura com a senhorita foi de fato mais fácil e satisfatório do que com os estudantes anteriores, terceiro, sim eu tive a intenção de beija-la contra aquela estante, quarto, te deixei dormir no divã e lhe comprei comida chinesa porque estava genuinamente preocupado com seu bem estar e em quinto lugar - Reid para pra tomar ar- existe sim uma alta probabilidade de que todas essas ações foram influenciadas por que estou interessado e atraído por você. E honestamente, não acho que nem se eu tentasse evitar, seria capaz de me manter longe o bastante.
Eu pisco uma, duas, três vezes. Confusa não chega nem aos pés de como me sinto neste momento.
— Você respondeu em ordem? - essa é a única frase que minha boca consegue formar enquanto tento assimilar tudo que ouvi.
Reid ri e afirma:
— Sim. Tenho memória eidética, ou fotográfica, como prefira chamar.
— Ah, claro que tem. Por que não teria... - eu murmuro para mim mesma enquanto encaro o chão a minha frente. Ele não me fez exatamente uma pergunta, apenas respondeu à minha e agora não faço ideia do que falar.— Não espero tome nenhuma decisão agora senhorita Hills, apesar de saber que você tem um certo interesse por mim, sei que não seria uma algo fácil...
— Eu nunca disse que estava interessada... - Reid dá um sorriso com a boca presa, um dos poucos momentos que pra mim, sua personalidade muda de sexy para fofo — ah, analista de comportamento, você é analista comportamental também e deve ter me analisado... - Eu digo isso mais para mim mesma, enquanto lembro do seu currículo que li online.
— De qualquer forma, não pretendo fazer nada que coloque você ou sua bolsa de estudos em risco, apenas peço que pense sobre o assunto. Só agradeceria se não demorasse muito, quero saber até onde posso ir quando te encontrar dentro ou fora da faculdade.Apesar de ainda não saber como reagir, me forço a balançar a cabeça para cima e para baixo num sim robótico.
Reid me lembra do horário, tenho aula daqui a 10 minutos. Sem pensar duas vezes, eu me despeço dele com uma única certeza:
consegui sair de sua sala mais atordoada e confusa do que quando entrei.
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Meu perfeito oposto
RomanceAnne se mudou para uma nova cidade após ganhar uma bolsa de estudos, mas enfrenta algumas dificuldades quando se vê atraída pelo seu professor de literatura, Spencer Reid. Enquanto Anne está quase falida e á procura de uma melhor condição de vida...