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[Nova York, 1996]

Era uma terça-feira, mais uma data a ser marcada na lista do calendário. Ao despertar, afastei os cobertores com suavidade e me estiquei na cama, erguendo-me com uma leve preguiça. A janela, ao ser aberta, protestou com um rangido estridente, como se também estivesse relutante em enfrentar o dia chuvoso lá fora.

Encarei o céu plúmbeo, sentindo um tédio crescente preencher o ambiente. Os campos verdes e distantes, além das casas, provocaram um suspiro melancólico; a grama parecia dançar sob a fina garoa, enquanto eu me via aprisionada naquele casebre.

A saudade de caminhar descalça sobre a terra e sentir a natureza entre os dedos era avassaladora. Porém, há meses, meus pais passaram a controlar cada vez mais meus passos, como se eu fosse uma relíquia a ser protegida a todo custo. Uma relíquia que, estranhamente, passaram a temer perder. Era uma mudança abrupta, pois nunca foram pais controladores. Por sorte, eu era filha única. Coitados de meus supostos irmãos, se existissem.

Toda vez que eu ousava questionar o motivo daquela repressão, eles habilmente desviavam o assunto, ou então atribuíam a questão a conversas de adultos, como se isso fosse suficiente para me silenciar.

O verão se arrastava, e eu estava confinada em casa.

O rangido da janela devia ter alertado minha mãe, pois logo em seguida ouvi seu chamado para o café da manhã. Num murmúrio entediado, obedeci, seguindo a contragosto até a cozinha.

Meus pais nunca precisaram trabalhar, vivendo confortavelmente com a herança deixada pelo meu avô paterno, uma quantia razoável para nossas necessidades. Essa comodidade tornava mais fácil para eles monitorarem meus movimentos vinte e quatro horas por dia. Não tínhamos parentes próximos, éramos apenas nós três contra a pacata rotina do interior de Nova York.

— Bom dia, querida! Os ovos estarão prontos em breve — saudou minha mãe, radiante ao me ver. — Levantou tarde, não é? Nunca a vi acordar nesse horário...

Não respondi.

Sem poder sair de casa, não havia motivação para acordar cedo. Meus poucos amigos, se é que podiam ser chamados assim, não compensavam a monotonia. Eu era naturalmente reclusa, preferindo a solidão a risadas vazias. Isso contribuía para minha falta de ânimo; apesar de não ter ninguém para conversar no parquinho, gostava de observar a vida ao meu redor. Em casa, as paredes pareciam ganhar voz, os quadros sussurravam segredos.

Sentei-me à mesa e encostei o queixo nas mãos, observando pelas janelas da cozinha algumas meninas brincando despreocupadamente no quintal vizinho, saltando sobre poças d'água com suas galochas coloridas. Uma pontada de inveja me atingiu.

— Aqui estão! — anunciou minha mãe, oferecendo-me um prato com um omelete perfeito. Ela acariciou meu rosto com ternura, mas percebi um olhar sério em seu semblante. — Por que essa expressão?

— Não sou eu que estou transformando minha filha numa prisioneira... ainda mais nas férias! — respondi com um tom de reprovação, afastando sua mão lentamente antes de me servir do omelete.

Minha mãe sorriu, como sempre fazia, como se acreditasse que seus sorrisos pudessem espantar minhas dúvidas e minha raiva.

— Você não vai explicar, não é? — indaguei, com a boca cheia de comida. — Está arruinando meu verão.

Ela me fitou, os olhos trêmulos, como se tentasse transmitir seus pensamentos apenas com o olhar.

— Eu sei, querida. Me desculpe. Seu pai e eu... — ela hesitou, engasgando com as próprias palavras. Após um suspiro exausto, ela olhou profundamente nos meus olhos, e senti um aperto no peito. — Alice, acho que é hora de você saber de algo.

Warrior | Livro 1Onde histórias criam vida. Descubra agora