As instituições políticas de Esparta não se resumiam apenas aos reis e éforos. Havia outros cargos e entidades.
Constituída por uma reunião ao ar livre, onde se decidia sobre questões ligadas à política, decisões militares e sociais, a Apela era uma assembleia composta por todos os esparciatas, homens e maiores de trinta anos. Responsável ainda pela eleição dos gerontes e dos éforos. Na prática, tinha pouca influência na vida política da pólis, podendo apenas aprovar ou rejeitar as propostas apresentadas.
A Gerúsia era uma das instituições políticas mais importantes e antigas de Esparta, desempenhando um papel crucial na governança e na estrutura social da cidade-estado. Era composta por trinta membros, sendo vinte e oito anciões, com não menos de sessenta anos e eleitos anualmente pela Apela, e os dois reis. Eram esses membros os responsáveis pelas leis propostas à assembleia. Atuava ainda como o tribunal supremo de Esparta, julgando casos de crimes graves, incluindo traição e assassinato, e em caos extremos, julgava os reis. Isso incluía a capacidade de destituir um rei se ele fosse considerado culpado de má conduta.
Pleistoánax participava da assembleia aquela manhã sem poder conter a felicidade estampada em seu rosto pela ausência de Arquídamo.
Arquídamo ascendeu ao reinado em Esparta dez anos antes Pleistoánax. Ele era uma figura presente na Apela, pois dessa maneira, ele acreditava poder manter um contato mais direto com os habitantes da cidade, garantido sua influência sob os espartanos.
Não estava errado em prever que a vida de Arquídamo está o deixando, conjecturava o rei em gozo. Sem suas ponderações cautelosas, seria muito mais fácil fazer com que Esparta esqueça o tratado de paz com Atenas, declarando guerra e marchando sobre a Ática.
Ainda que perdido em seus pensamentos, Pleistoánax não podia ser indiferente ao burburinho que ecoava pela ágora de Esparta. As votações das leis e propostas eram feitas através de gritos, onde cada membro expunha sua opinião a plenos pulmões. Esse modelo era propício para que brigas ocorressem com frequência, já que opiniões contrárias eram comuns, fazendo com que os jovens recém-formados do agogê precisassem separar os mais exaltados. Quando enfim uma decisão era tomada, o éforo que presidia a Apela, chamado de éforo epônimo, declarava encerrada aquela discussão e apresentava uma nova proposta. Isso era motivo para bardos entoaram canções em comemoração.
Sem muito interesse pelo que ouvia naquele dia, Pleistoánax pode ver Nestor se aproximando para lhe dizer algo:
— Meu rei? — se dirigia ao rei de maneira discreta.
Pleistoánax apenas assentiu com a cabeça.
— Aristeu de Corinto o aguarda no palácio — disse em voz baixa.
— Diga para que me espere. Acredito que isso logo acabará, aí vou vê-lo.
— Sim, meu rei — Nestor cumprimentou Pleistoánax, que voltou ao seu devaneio, enquanto ele, usando uma de suas habilidades, desapareceu na multidão com facilidade, voltando ao visitante para pedir que aguardasse a presença do rei.
Assim que todas as propostas haviam sido votadas, Estenelaídas encerrou a assembleia, permitindo que Pleistoánax pudesse ir ao encontro de Aristeu. O rei tinha pressa em vê-lo, negligenciando até mesmo da oportunidade criada pela ausência de Arquídamo, já que poderia ficar e cumprimentar e ouvir o maior número de súditos possível aumentando um pouco sua popularidade.
Chegando ao palácio real de Esparta, Pleistoánax logo pode ver o coríntio aguardando-o. Aristeu não era um homem que pudesse ser ignorado. Sua principal característica era a estatura, muito maior que seus compatriotas gregos, bem usada para exalar autoridade e confiança. Seu rosto era angular, com maçãs do rosto proeminentes e uma mandíbula forte. Os cabelos curtos eram negros e espessos, que começavam a mostrar fios grisalhos nas têmporas. O corpo era robusto e musculoso, com ombros largos e um tórax forte. Vestia um quíton de linho branco. Sua capa lilás era presa nos ombros por broches de Pégaso, o cavalo alado símbolo de Corinto.
— Seja bem-vindo de volta a Esparta, Aristeu.
— Obrigado, Pleistoánax — respondeu o coríntio com sua voz forte e alta, condizente com seu físico. — Esperava que Arquídamo viesse contigo da Apela. — Não poderemos contar com a companhia de Arquídamo hoje. Nestor não o preveniu sobre? — Os dois olharam para Nestor que também estava presenta, que apenas deu de ombro. — Diga — o rei voltou sua atenção a Aristeu. — O que o trouxe aqui?
Aristeu hesitou por um breve momento. Não esperava pela ausência de Arquídamo, mas também não podia ter feito uma viagem em vão.
— Vim informar a Esparta os próximos passos de Corinto, e confirmar o apoio do Peloponeso à nossa causa contra os atenienses quanto chegar o momento.
— Corinto já tem essa garantia — respondeu friamente o rei, fazendo um gesto para que Nestor os servisse vinho. — Esparta não volta atrás em suas promessas — o rei pegou o cálice servido por Nestor e deu um gole antes de recomeçar. — Quando Péricles tomar uma atitude contra Potideia, se o fizer, estaremos prontos, mas o que sabemos é que ele movimentou a marinha em direção a Macedônia para apoiar o golpe de Filipe contra Perdicas.
— O que o rei talvez não saiba é que Atenas não movimentou apenas a marinha — Aristeu também deu um gole no vinho servido por Nestor. — Hoplitas marcham em direção à Trácia. Dessa maneira, instigamos os potideus a se aditarem declarando rompida a aliança que tinham com Atenas. Como a cidade ocupada por hoplitas atenienses seria muito mais difícil de fazê-los — o coríntio bebeu mais um pouco de vinho. — Não vamos abandoná-los. Sozinhos, Atenas pode tomar a cidade, por isso, eu mesmo vou liderar um contingente dos nossos, e pretendemos recrutar voluntários entre os aliados para que possamos ir em auxílio dos potideus.
Pleistoánax fitou Nestor que tentava disfarçar a surpresa por aquela informação.
— Corinto fez o que era certo, Aristeu. Essa ambiguidade em que vivia Potideia não fazia o menor sentido. Em algum momento eles deveriam decidir em qual lado estavam. Esse momento chegou — o rei termina de beber o vinho de seu cálice em um último único gole. Ele sentia que o sabor doce não era da bebida que ingeria, era da guerra que tanto esperou. Sem dúvidas agora não haveria volta. Péricles precisaria tomar metidas contra Potideia, mas para isso enfrentaria homens de Corinto, rompendo assim o tratando de paz que firmaram.
— Era só isso, Pleistoánax. Esse foi o motivo de minha visita a Esparta hoje. Agora, se me permite, vou seguir meu caminho. Já enviamos mensagem para cidades aliadas convocando homens que queiram se juntar a nós. Regresso a Corinto e sigo em seguida para Potideia na liderança desses homens — Aristeu se aproximou do rei, estendeu o cálice para Nestor, mas um hilota veio recolhê-lo, e completou. — Nos veremos em breve, Pleistoánax.
— Que os deuses o acompanhem, Aristeu — rogou o rei apartando forte a mão do coríntio, que se virou e deixou o palácio real de Esparta para seguir com seu plano.
Sozinhos, Pleistoánax não podia conter a euforia. — Mais vinho, Nestor. Esse dia merece uma comemoração.
Nestor fez um sinal e outro hilota foi buscar uma ânfora com mais vinho. O rei queria beber em júbilo pelo dia que tivera em anos. Arquídamo doente, não pôde se fazer presente na assembleia. Corinto surpreende e praticamente força o ponderado Péricles a iniciar um conflito com a Liga do Peloponeso. Nem em seus melhores sonhos poderia ter um dia tão rico de boas notícias.
Quando o hilota retornou com o vinho, Pleistoánax conteve o ímpeto de beber diretamente da ânfora, mas aguardando o escravo o servir, bebeu mais um cálice em um único gole, agradecendo a Dionísio por ter dado aos gregos a receita daquela bebida que achava maravilhosa.
Quando o rei exigiu mais vinho ao hilota, um vento quente e forte irrompeu o salão, forçando Nestor a tentar sem sucesso manter os papiros organizados sobre uma mesa no canto. Aquele era um presságio que os rumos da Grécia estavam sem reorganizando.
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Peloponeso
Historical Fiction"Senhores? Tem sido uma honra lutar ao lado de vocês por todo esse tempo. Não há glória maior para mim que liderá-los, então vos digo: um dia nos encontraremos em outro lugar. Reis e súditos iguais, mas não hoje. O barqueiro nos espera. Sugiro que e...