Peguei mais um punhado de pipoca, prestando atenção no episódio do dorama que Guilherme e eu estávamos assistindo juntos. Bem, ao menos eu estava vendo.
Suspirei ao ver Guilherme olhando o celular após outra notificação e pausei a programação.
- Por que pausou, Lu? - Ele tirou o olhar da tela do celular e me encarou. - Eu estava assistindo.
- Estava sim. - Cruzei os braços. - Você nem ao menos estava olhando para a televisão, Guinho! Sequer deve saber o que está acontecendo agora na história.
- Eu estou ouvindo, Lu. A moça mandou um detetive para seguir o marido e não encontrou nada. Inclusive ele é apaixonado por ela, um querido. - Explicou o que acontecia no episódio em que estávamos no momento. - Não preciso necessariamente ficar com os olhos na tela para entender.
Cruzei os braços, só depois me lembrando de uma conversa antiga em que ele dizia saber coreano por causa do falecido pai.
- Que seja, senhor bilíngue metido. Toda hora chega notificação e você vai olhar a porcaria do celular! Gosto tanto de passar esse tempo com você, mas nem está valorizando a nossa hora do dorama.
Os ombros de Guilherme se encolheram e ele bloqueou a tela do aparelho, se aproximando de mim com uma expressão de gatinho manhoso.
- Lulu, desculpe. - Ele deixou um beijo em minha bochecha, desligando o celular e deixando em cima da mesa da sala. - É que eu mandei o meu currículo para alguns lugares e agora estou esperando para ver se algum me aceitou para trabalhar. Daí qualquer notificação eu fico de olho. - Gui pegou o celular para me mostrar o que ele tanto olhava no aparelho. - Aqui, pode ver.
Olhei a tela do celular, vendo um aplicativo de vagas de emprego e suspirei fundo, encarando o rostinho de Guilherme com as bochechas infladas e um bico do tamanho do mundo.
- Ah, por que você é assim? Fica me chamando de Lulu e olhando com essa carinha de bebê. Assim eu não consigo ficar bravo.
Abracei a cintura dele e o enchi de beijos nas bochechas e selinhos.
- Tudo bem, desculpe por te chamar atenção. Mas você precisa mesmo trabalhar? Eu gosto tanto de passar as tardes assim grudado com você.
- Sabe que sim, Lulu. O dinheiro para fazer a transição não vai cair do céu. - Gui pegou uma boa quantidade de pipoca na bacia, enfiando tudo na boca de uma vez.
- Pãozinho, você já tentou buscar tratamento hormonal no SUS? Eu já vi algumas pessoas que fizeram tudo de graça.
- Eu fui uma vez com a mamãe em um posto perto da nossa casa antes de nos mudarmos, mas não deu muito certo. As pessoas nem sabiam o que era terapia hormonal, ficavam me tratando no feminino e me mandaram ir para outro posto, porquê não faziam aquele tratamento lá. Quando cheguei no tal outro posto, eles disseram que não lidavam com gente "assim" e me mandaram voltar para o posto que eu vim no início. A gente ficou um tempo igual barata tonta, mas ninguém se importava em nos ajudar de nenhuma forma. Só depois eu fiquei sabendo que o SUS só faz tratamento hormonal em maiores de idade. Em médico particular ou pelo plano de saúde, que eu não tenho mais, eles faziam com dezesseis anos.
Acariciei os cabelos dele, dando um longo suspiro ao ouvir aquela história e me frustrando com tamanho descaso daquelas pessoas.
- Mas porque você não fez quando tinha o plano, pãozinho?
- Eu até fui no médico e consegui a receita, mas o hormônio é caro e tem que comprar com frequência para aplicar. O único que tinha dinheiro era o meu padrasto, mas nunca que aquele diabo iria me dar dinheiro para comprar testosterona.
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Alinhamento Milenar (Taegi)
RomanceAs bochechas eram rechonchudas como as de uma criança, os lábios vermelhinhos chamavam atenção e os olhos afiados davam toda a graça ao rosto delicado dele. Talvez eu tenha passado mais tempo do que deveria olhando para ele. Definitivamente era o...