Capítulo 09 - Interlúdio - Sussurros do vento

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Com o riso sonoro e abafado, Taier capturou a atenção de Cristina e Epanequine que o olhavam confusas.

- Perdón por interonper, cariño! – Recuperava o fôlego – A situação no final, foi muito fofa.

- Depois de um tempo, quando lembrava desse episódio, questionava-me sobre meu juízo. – Cristina balançava a cabeça rindo – Ele disse e eu havia visto os riscos.

- Você aceitou duas vezes para poder estar com ele – a voz da jovem carregava melancolia.

- Além de saciar minha curiosidade sobre as coisas que eu tinha visto e ouvido em dois dias.

- Todos da nossa família se apresentam ao risco para saciar a curiosidade?

- Talvez. – Cristina deu de ombros – O patriarca da família é mais sensato do que eu nesse quesito. - Cristina apontou com o queixo para Taier.

- Esse episódio, - Taier voltou a falar com um sorriso triste e o olhar distante – fez-me lembrar de um dia em que Miguel nos viu treinando e voltou correndo com Diego enquanto eram seguidos pela Daya, toda desengonçada pela idade com a chupeta na boca. Os três com os olhos brilhando de entusiasmo. Mesmo Diego sendo o mais quieto, adorava as aventuras malucas do irmão e Daya, pobrezinha, odiava ficar para trás, sempre atrás deles com um sorriso no rosto. Lembra-se disso, cariño?

- Como poderia esquecer?

- É, parece que a curiosidade mortal é genética. – Epanequini riu com Cristina.

Taier ouvia as risadas ao seu lado como se fossem um eco distante. Tomou fôlego e se pronunciou:

- Vocês ouviram? Acho que tem um rouxinol cantando! Vou procurá-lo e já volto. Pode continuar sem mim.

O patriarca logo se levantou da poltrona deixando o lugar com passos rápidos e silenciosos e com os olhos atentos, como se estivesse procurando algo.

- Rouxinol? – Epanequini arqueou uma sobrancelha – Mas não é época de cantarem.

- É sim, Pane – a matriarca suspirou melancólica. – É a época dos três cantos.

- Como assim?

- Um dia vai vê-los.

Já do lado de fora da cabana, Taier caminhou pelo caminho que chegava até a margem do rio. Lá, contemplou o reflexo prata na água por um momento até erguer os olhos ao céu para contemplar a própria lua.

Tentou segurar o soluço que saiu de sua alma enquanto agarrava a camisa que usava na esperança de agarrar o próprio coração que batia insuportavelmente apertado. Abriu a boca, mas nenhuma melodia saiu de seus lábios naquela noite. Sua doce voz foi substituída por gemidos entrecortados enquanto seu corpo tremia e sacudia, como os galhos das árvores sobre o efeito do vento, por tentar segurar as lágrimas que brotavam teimosas.

A lembrança dos filhos vinha acompanhada pelas lágrimas. Não carregavam remorso, culpa ou qualquer vestígio de sofrimento pelo luto passado. Apenas carregavam saudade.

Saudade dos olhares brilhantes e da curiosidade sem fim herdados da mãe. Saudade da sede de aventura e adrenalina herdados do pai. Fazia séculos que havia sido forçado a deixar de acompanhar seus passos de perto e ser sua fortaleza para os acompanhar de longe. Séculos que a natureza não seguiu a ordem natural e os pais enterraram os filhos.

Lembrar que nunca mais os ouviu, nunca mais os viu e nunca mais sentiu o cheiro deles, fazia com que seu coração despedaçasse e se afogasse em lágrimas suprimidas para que a esposa não se sentisse culpada.

Assim como as estrelas cadentes rasgam o céu no silêncio da noite deixando seu brilho para trás, foram as lágrimas de Taier ao marcarem seu rosto naquela noite.

Na quietude da floresta que observava a dor muda de um rei, o vento agitou as árvores e acariciou o rosto do filho cansado e, junto com ele, fora de época, um canto triste, melancólico e sozinho ressoou. Um rouxinol cantou.

Contos de Uma Peregrina - DesertoOnde histórias criam vida. Descubra agora