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POV MARÍLIA

10 anos depois...

Coloquei a última garfada de macarrão na boca e vi Juliana se aproximar com certa urgência. Ela trazia consigo um prato de carne com legumes que parecia estar delicioso.

-Parece que hoje você vai ter trabalho novo. -sentou-se na minha frente.

-Isso aqui é um hospital, eu tenho trabalho novo todos os dias.

-Tô falando de trabalho dos pesados.

-O que foi dessa vez?

-Acidente no trânsito. Um carro e um caminhão. O caminhão prensou um dos lados do carro.

-Quantas vítimas?

-Fatais nenhuma, por enquanto. -fiz uma careta pelo seu comentário. -O homem quebrou um braço, bateu a cabeça e teve um corte profundo nela, mas está estável. A mulher teve escoriações leves, por um milagre. E bem, a criança, essa não teve tanta sorte.

-Criança? -franzi o cenho.

Eu detestava acidentes com crianças, era o mais cruel que um profissional podia ver.

-Seis anos. -continuou. -Está vivo, mas entre a vida e a morte. O caminhão bateu exatamente na parte onde ele estava. Falaram algo sobre traumatismo craniano dos pesados.

Senti meu peito se apertar imediatamente.

-Já são três anos trabalhando nesse hospital, mas eu nunca vou me acostumar com nada que envolva crianças.

-Digo o mesmo. -concordou. -A família vai precisar do seu apoio, mais especificamente a mãe, ela está bem nervosa.

Eu havia me formado em Assistência Social, por isso, trabalhava num hospital na capital paulista e tinha como função educar pacientes e familiares sobre doenças e planos de tratamento, realizar avaliações psicossociais para identificar sofrimento mental ou emocional e aconselhar pessoas em crise ou em sofrimento.

Nesse caso em especial, provavelmente eu iria conversar com a vítima menos grave, a mãe, para avaliá-la, aconselhá-la e, se necessário, encaminhá-la para a nossa equipe de psicologia.

-Não acha que vão chamar a Eugênia? -perguntei. Eugênia era a nossa outra assistente social.

-Não, vai ser você. A Eugênia está ocupada demais com os pacientes terminais.

-Tem razão. -limpei a boca com um guardanapo. -Sendo assim, vou indo.

-Boa sorte, Marília.

-Obrigada. Eu vou precisar.

~•~

Cheguei no balcão principal em cerca de cinco minutos. Bruna, a recepcionista, logo me entregou uma pasta com alguns papéis do caso. Aqui tudo funcionava com rapidez, não tínhamos tempo a perder, pois se tratava de vidas e saúde mental.

-Ela tá no terceiro andar, quarto 302, leito 2. -referiu-se ao caso mais recente. -Estão operando o menino, é filho dela.

-Tá bem. -assenti. -Juliana me disse que a situação está complicada.

-Da mãe? Ela estava muito agitada quando deu entrada, mas agora, pelo que me falaram, já se acalmou um pouco. O acidente foi gravíssimo, é um milagre que ela não tenha sofrido nada físico.

-Já fizeram todos os exames?

-Já sim. Fisicamente, a mulher está bem, pode confiar. Agora, apesar de já estar mais calma, o trauma deve ter sido grande, principalmente por ter visto o filho da maneira que ela viu.

Sempre Foi Você - Malila Onde histórias criam vida. Descubra agora