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POV MARAISA

Meu pai tinha uma arma. O pai da Marília havia dado a ele na época da fazenda, provavelmente para ser usada como defesa própria, para proteger a família e a casa, afinal, morávamos numa área rural e perigosa.

Mas Marco não usava a arma exatamente para isso. Pelo contrário, meu pai a usava para intimidar a mim, a minha irmã e a minha mãe. Ele andava com ela dentro de casa, para lá e para cá, como se fosse um acessório. Além disso, sempre nos olhava com reprovação enquanto segurava o objeto prateado, numa espécie de ameaça sútil.

Vez ou outra, quando eu fazia alguma besteira de criança, meu pai me levava para um lugar afastado e usava a arma para matar algum filhote da fazenda ou algum passarinho qualquer. Tudo isso na minha frente. Tudo isso pra me intimidar e me amedrontar.

Marco tinha uma arma e era por isso que eu odiava armas. Elas me davam pânico, me faziam ter calafrios e tremedeira. Passei um bom tempo sem entender o porquê disso, mas agora estava claro. Minha memória havia bloqueado todas essas lembranças durante boa parte da vida, provavelmente por medo e trauma.

Agora, após ver o que Marco havia conseguido para Fabiano, tudo fazia sentido. Fazia sentido e doía pra caramba! Meu próprio pai havia conseguido uma arma para que o meu marido me ameaçasse e me mantivesse na linha. Era doloroso demais.

Eu só queria vomitar, vomitar e chorar. Mas, ao invés disso, precisava encontrar uma solução, precisava reagir e sumir daquela casa. Eu não conseguiria viver sob o mesmo teto que aquele homem e que aquela arma.

Ligar para Marília seria a solução. Marília me tiraria disso, ela deixaria de viajar para me ajudar. Mas, e se ela já tivesse embarcado? Eu não queria nem pensar nessa possibilidade!

Após alguns minutos brincando com o meu medo e com a minha mente, Fabiano resolveu guardar aquela maldita arma e ir fazer outra coisa. Eu continuava tremendo e com a respiração falha, mas tive coragem de abrir os olhos e lhe encarar. Enquanto passava por mim, ele soltou uma brincadeirinha debochada.

-Medrosa igual quando criança, igualzinho seu pai me contou. Só faltou fazer xixi na calça como fazia na infância. -riu e se distanciou.

Doente!

Se antes de saber sobre o meu relacionamento com a Marília, Fabiano já mantinha a casa trancada, agora, aquele lugar tinha virado uma prisão de segurança máxima. Não havia escapatória.

Pouco tempo depois, quando aquele homem repugnante que eu chamava de marido decidiu ir tomar um banho, pensei que seria o momento da minha salvação. Por isso, com muito cuidado, peguei o meu celular e fui para a cozinha. Disquei o número e esperei, andei de um lado para o outro, extremamente preocupada e extremamente aflita.

Atende, Marília! Atende, por favor! Eu preciso de você, preciso que venha me ajudar. Eu não quero ficar aqui para sempre com esse homem, eu faço de tudo pra conseguir escapar. Atende!

Nada! A possibilidade dela já ter embarcado me causou calafrios. Marília não viria, Marília não estaria aqui pra me ajudar. Comecei a chorar, o desespero tomando conta de mim. Preciso fazer alguma coisa!

A polícia! Eu não confiava totalmente nela, a polícia era falha em muitos casos como o meu, mas não havia escolha, não mais. Eu não queria ficar trancada com um homem que me odiava e que tinha uma arma como sua fiel escudeira.

Qual o número da polícia? Forcei minha memória. Eu precisava lembrar!

Assim que consegui visualizar o número na minha mente, ouvi passos atrás de mim. Não, Deus, por favor, não!

Sempre Foi Você - Malila Onde histórias criam vida. Descubra agora