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POV MARAISA

Coloquei mais uma concha de feijão no prato do Fabiano e o encarei, perguntando silenciosamente se estava bom. Ele apenas confirmou com a cabeça. Levei a panela para o fogão e voltei. Me sentei a mesa, de frente para o meu marido.

Começamos a comer em silêncio, um silêncio torturante. Aquela casa era muito silenciosa desde que o Miguel se foi, nossos almoços e jantares eram muitos silenciosos.

Antes, durante as refeições, eu geralmente costumava observar o garoto para me certificar de que ele estava comendo tudo, o pequeno sempre tentava me enrolar, o que me deixava brava no início, mas depois ele me fazia rir das suas travessuras e da sua carinha sapeca. Eu sentia tanta falta dele, tanta que era impossível descrever.

Hoje, Fabiano não havia chegado do serviço de muito bom humor, ele nunca chegava. Mas mesmo assim, escolhi arriscar e falar, antes que aquele silêncio me matasse.

-Como foram as coisas no trabalho? -perguntei.

-Um lixo. Todos os dias naquela empresa são um lixo.

-Problemas?

-Muitos.

-Quer me contar?

-O que você entende sobre negócios, Maraisa? -perguntou de modo ríspido. -Você nunca trabalhou.

Eu detestava quando ele falava dessa maneira, eu me sentia pequena e inútil.

-Você nunca me deixou trabalhar. -rebati.

-Seu lugar é aqui, em casa, cuidando de tudo e da nossa família.

Família... Não somos mais uma família, pelo menos não uma família completa, não sem o Miguel.

-Como foi a terapia? -mudou de assunto.

-No geral, foi boa. Mas todas aquelas perguntas me deixam nervosa e um pouco angustiada.

-Que bom, só assim pra fazer efeito e essa cabeça voltar a funcionar. -mais palavras ácidas. -Não quero que você desista, viu?

-Aham.

Na verdade, não sei se posso te atender nessa questão.

Apesar de não ter sido a coisa mais torturante do mundo, era incômodo e eu não sei se aguentaria isso e todos os sentimentos que aquelas sessões de terapia iriam trazer a tona.

-Você não vai acreditar quem eu encontrei hoje! -exclamei, também mudando de assunto.

-Quem?

-A Marília.

-Marília? -franziu o cenho, ele não se lembrava.

-Marilia Mendonça, a filha do Mário, lá da fazenda onde eu morava.

-Ah, aquela pirralha chata e grudenta que não saía do seu pé?

-Não fala assim. Ela era minha amiga, ainda é.

-Não é tanto sua amiga assim, né? Faz uma vida que vocês não se vêem.

-É, mas foi bom reencontrar ela. A Marília é assistente social e trabalha lá na ONG.

-Não gosto de assistentes sociais, elas são enxeridas e metem o nariz em tudo.

-É meio que o trabalho delas, né?

-Que seja. -empurrou o prato e se levantou. -Eu vou tomar um banho e te espero lá na cama. Não demora.

Eu sabia o que isso significava: transar. Não que eu não gostasse mais de ir pra cama com ele, eu gostava, ele era o meu marido e eu o amava. Mas Fabiano queria me engravidar e isso não era o que eu desejava no momento. Tirar essa ideia da sua cabeça seria difícil, eu sabia.

Sempre Foi Você - Malila Onde histórias criam vida. Descubra agora