Parceiras no crime

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Mesmo sendo tão pouco tempo longe do lugar onde nasci, cresci e vivi toda minha vida, senti que tudo estava diferente no momento que coloquei meus pés dentro de casa. Alguns móveis foram trocados de lugar, um ou outro detalhe substituído, mas principalmente, a atmosfera não era a mesma.

Tirei os sapatos, e entrei no meu quarto. Estava exatamente do mesmo jeito que tinha deixado, e quando me atirei na cama, o cheiro também era o mesmo de sempre. O cheiro de casa. Talvez demoraria para me acostumar com tudo aquilo de novo, a mesma sensação que tive quando eu saí de casa.

Enquanto minha mãe conversava com minha tia na cozinha, fechei meus olhos e me deixei levar pela sensação da minha cama, macia, e os barulhos que vinham da rua. Ao mesmo tempo que parecia que nunca tinha deixado aquele lugar, parecia que não pertencia a ele. O estranhamento era maior do que o alívio de estar no meu lugar.

Uma onda de pensamentos invadia minha mente. Pensava no meu pai, em Catarina e sua família. Cada vez mais pensava que eles seguiriam com suas vidas e eu não passaria de uma mera lembrança de alguém que passou uma temporada lá, viveu o que tinha que viver e foi embora.

Mas, de qualquer forma, aquela tinha sido a minha decisão. Só que ali estava eu, preocupada com tudo e nada ao mesmo tempo, e só consegui sair daquela linha de pensamento quando minha mãe bateu na porta.

— Teté, está dormindo?

— Não, mãe.

Ela entrou no quarto, e ficou me encarando da porta.

— Estou te achando tão tristinha...

Foi se aproximando, sentou na beirada da cama e segurou minha canela, balançando devagar.

Nem eu sabia dizer o que estava sentindo de fato.

— Não está feliz de estar em casa?

— Só não me anima o motivo que me fez querer voltar...

E, em um lampejo, logo ela ficou séria.

— Foi só passar uns dias na casa dele que você volta assim?

— A senhora sabe que tem coisas que temos que...

— Eu – ela se levantou, e apontou pra mim, enfática – não vou falar sobre isso. Não mudei de ideia, Teodora.

— Qual é o problema de querer saber o real motivo das...

— Olha – sua raiva começava a ficar notável – eu aceitei o fato de que queria ir conhecer teu pai, tudo bem, agora ter que ficar dando satisfação do que me levou a não falar mais com ele? Eu já falei!

Até onde eu teria que ir por conta do seu egoísmo? Exasperei, deixando o ar sair pela minha boca.

— Tá, mãe, tudo bem. Desculpe.

Ela saiu sem dizer mais nada. Estava terrivelmente frio e solitário ali, tão diferente do que já tinha acostumado a sentir.

Abri minha mochila e comecei a tirar minhas coisas, até que peguei aquele pequeno presente, ou melhor, aquela troca, e a abracei com força. Fui ao banheiro e ouvi minha mãe reclamar consigo em como insistia naquela ideia, e, depois do banho, me vesti com o moletom que ela tinha me dado.

E não quis mais sair do quarto pelo resto daquele dia.

No outro dia, ao acordar, estava ainda mais frio. Geava do lado de fora, e me enfiei ainda mais no seu moletom. Minha mãe tinha saído, deixando o café pronto. Já minha tia estava na sala, assistindo televisão. Assim que me viu, me chamou para sentar do seu lado. Me abraçou e repousou a mão em meus ombros, enquanto tomava o café que teimava em querer esfriar rápido.

Ao Norte de lugar nenhumOnde histórias criam vida. Descubra agora