Não era nem meio do dia e estava quente. Um calor que parecia me fazer cozinhar dentro da roupa por conta daquele ar úmido e tropical misturado com o calor, e piorava quando memórias específicas demais eram revisitadas sem que eu quisesse. Tinha mandado mensagem para minha mãe, que deveria estar no trabalho, falando que estava tudo bem, mas sem falar que na verdade tinha tudo dado errado e que ela estava certa, e que agora estava envergonhada demais para admitir que fui mais uma vez imprudente.
Com a mochila entre as pernas, sentada em um banco debaixo de uma arborizada e simples praça local, os transeuntes pareciam seguir o fluxo de suas rotinas enquanto eu afundava até o pescoço, me perguntando se realmente foi uma boa ideia vir pra cá.
Sentir-se perdida em casa, um lugar que você conhece era uma coisa, agora em um lugar desconhecido o desespero parecia se intensificar. Rostos estranhos, lugares estranhos, lugar tão estranho quanto. A sensação de sentir cada vez mais distante da realidade....
Mas, como o ônibus que voltava para minha casa só ia sair no outro dia de madrugada, eu tinha que tentar fazer alguma coisa com meu tempo livre e resolvi caminhar pela pacata cidade. Eu vinha de uma metrópole que não parecia dormir a um ritmo frenético e incansável enquanto agora estava em uma cidade que parecia ditar seu próprio ritmo, lento e gradual.
A parte central consistia em uma avenida com as mais variadas lojas, a praça arborizada que ficava no meio desse local e uma igreja católica antiga bem ao centro, com alguns fiéis já depositando suas orações ajoelhados dentro da igreja sem ar condicionado. Estar do lado de fora, ou seja, no local mais ventilado me fez questionar se era muita fé ou simplesmente porque as pessoas estavam acostumadas com aquele calor escaldante.
Nesse momento, desabotoei a camisa por completo e por baixo, apenas o top de malhação, e só assim senti que estava realmente refrescada. Apesar dos olhares curiosos em minha direção, pouco me importei e continuei andando.
O sol pareceu se intensificar e do outro lado, foquei em encontrar um lugar para me esconder do sol ou só para me refrescar. Já de óculos escuros, sentia-me como uma turista quando pedi para um senhor que vendia água de coco me dar uma delas.
E, enquanto caminhava tomando minha água de coco e sentir o vigor voltando ao meu corpo que era castigado pela brusca mudança climática, a fachada de um local me chamou atenção. A fachada, toda de madeira, dava a aparência rústica, além dos sinos de vento na frente que tintilavam com o vento ameno que batia. As janelas, grandes e abertas, chamavam atenção para o que estava dentro como um irresistível convite a conhecer aquele lugar.
O cheiro leve de mofo, madeira e aromatizantes cítricos dava a aquele lugar o aroma de se pudesse ser catalogado, antigo. Era como entrar na casa de vó, mas com muito mais estilo. Até a música, que vinha baixo do recinto, remetia há décadas atrás. Não tinha ninguém ali, pelo menos não de forma visível.
Andei devagar por entre os corredores abarrotados das mais variadas coisas, muitas delas sendo mais velhas do que eu ou até mesmo a minha mãe, e uma delas me chamou a atenção de longe: um caleidoscópio. Não devia ver um daqueles desde o ensino fundamental, em uma das feiras de ciências organizadas pela escola, só que esse parecia ser mais antigo e bem feito, diferente do que nós, alunos, montávamos.
Coloquei ele contra a luz, e vi aquelas explosões de cores vindo em minha direção na medida em que regulava o jogo de lentes dentro deles. Sentia como se tivesse regredido anos, voltando para aquele momento escolar.
— Esse aí é bem legal, né? – disse uma jovem voz masculina de fundo.
Desviei o olhar do que estava fazendo no mesmo minuto que ouvi a voz. Não tinha notado de que estava acompanhada.
VOCÊ ESTÁ LENDO
Ao Norte de lugar nenhum
RomanceDepois de uma grande desilusão, Teodora vê sua vida mudar de cabeça pra baixo ao descobrir da existência do seu até então desconhecido pai. Ao embarcar nessa aventura em um novo mundo de relações, conflitos e questionamentos, ela irá aprender, do se...