Satoru

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SATORU 

 🏒🏑

Nossa programação voltou ao normal na manhã seguinte, e eu entrei no gelo pronto para treinar os garotos até cansarem.

A primeira semana foi difícil, porque me deixei afetar pela cabeça quente deles e pela incapacidade de seguirem as minhas instruções, mas então me determinei a seguir os conselhos de Suguru e ser paciente. 

Não me entenda mal, eu conseguia ter paciência — quando estava jogando. 

Mas vendo outros caras jogar? Vendo os erros que cometiam e depois repetiam em vez de ouvir meus conselhos e corrigir? 

Era enlouquecedor.

Hoje os garotos estavam ouvindo mais. 

Eu repassei algumas técnicas básicas de passe com os atacantes, trocando as posições de tempos em tempos para que todos tivessem noção do estilo e da técnica dos outros. 

Tudo deu certo na maior parte do treino, mas um garoto — Muta — monopolizava o disco independentemente da posição em que estivesse jogando. 

Soprei o apito, tentado a arrancar os meus cabelos. 

Muta acabara de ignorar minhas instruções de novo, dando um tiro fraco na direção de Noritoshi em vez de passar para Todo, como deveria fazer.

Eu o chamei e ele patinou até mim, carrancudo e com o rosto vermelho. De canto de olho, vi Suguru nos olhando com atenção, como se estivesse avaliando minhas habilidades como treinador. Yaga fazia o mesmo, do banco, mas fiquei feliz de ver que finalmente parou de franzir o cenho para mim.

Ontem à noite, Geto e eu aparecemos tarde demais para a apresentação, mas, por sorte, Georgie filmou tudo com seu iPhone. E, pode acreditar, nunca vou me esquecer de ter visto Yaga e os quatro treinadores cantando a versão mais desafinada de “Oops!… I Did It Again” do mundo. 

Acho que Yaga não iria esquecer também. 

Nem deixaria de me odiar por ter escolhido o prêmio do vencedor do jogo de futebol.

Voltando a Muta, cruzei os braços na frente do meu moletom da Northern Mass e perguntei:

— O que estamos treinando?

— Quê?

— Passe — expliquei.

Ele assentiu.

— Tá.

— O que significa que você precisa passar o disco.

— Mas no último treino você fez todo aquele discurso sobre não hesitar. Disse que, se uma chance aparece, a gente tem que aproveitar — ele levantou o queixo, na defensiva. — Uma chance apareceu.

Fingi surpresa.

— Espera… O disco passou pelo Noritoshi? Acho que perdi o gol.

Ele pareceu envergonhado.

— Não, eu errei, mas…

— Mas você queria marcar. Entendi — abri um sorriso simpático — Olha, eu tô com você, garoto. Não tem sensação melhor no mundo que a de marcar um gol. Mas vou te perguntar uma coisa: quantos atacantes costumam estar no gelo?

— Três…

— Três — confirmei. — Você não tá jogando sozinho. Tem seus companheiros de time, e eles não estão lá pra patinar bonito.

Ele abriu um sorriso.

— Todo tinha uma chance. Se você tivesse passado, ele teria dado um tiro no alto do canto esquerdo. E você teria conseguido uma assistência pras suas estatísticas. Fazendo o que fez, você não conseguiu nada.

ELEOnde histórias criam vida. Descubra agora