No seu segundo dia de trabalho, Eugênio sentiu que as horas passaram depressa. Já era
mais de meio-dia. Ele e Edmundo estavam com fome. Chegando ao Rei das Iguarias,
encontraram uma multidão na entrada.
Edmundo e Eugênio esticavam a cabeça para ver o que se passava lá dentro, quando
alguém chamou:
— Ed Onda!
— Calixto! — exclamou Edmundo.
No calçadão, um rapagão de cabelo escovinha manobrava seu skate.
— E aí, Ed mundo-velho-de-guerra?
Calixto era radical do asfalto e boy. Tinha sido campeão de skate de rua três temporadas
consecutivas.
— Você sumiu! — disse Edmundo, dando um tapa na mão estendida do amigo.
— Serviço militar — respondeu Calixto, dando uma olhada em Eugênio. Estranhou o jeito
do garoto e perguntou:
— Seu amigo?
— É novo na firma. Está fazendo estágio comigo.
Nesse momento, as pessoas amontoadas na entrada do Rei das Iguarias gritaram:
— Doze!
— O que está acontecendo lá dentro? — perguntou Eugênio, intrigado.
— É o Arnaldão.
— Hoje tem "Maratona dos Cozidos"?! Vem cá, Eugênio, isso você não pode perder —
foi dizendo Edmundo enquanto ia entrando no boteco.
Eugênio se esgueirou atrás de Edmundo. Ouvia-se uma música. Era um menino soprando
uma folha de celofane sobre um pente de cabelo. O som era idêntico ao de trumpete.
— Quem está tocando? — quis saber Eugênio.
— Aquele é o João Jó.
Jó acenou para Edmundo, sem parar de tocar. Era um garoto magro e comprido. Andava
o tempo todo com um terninho surrado, meio curto nas mangas.
— Sente só o outro artista — disse Edmundo, cutucando o aprendiz.
Encostado ao balcão, outro garoto comia ovos cozidos. Mastigava no ritmo da música.
Todos em volta prestavam extrema atenção. Só se ouvia um certo murmúrio quando ele
terminava outro ovo.
— O próximo, por favor. — Em qual está? — perguntou Edmundo ao sujeito que estava próximo.
— Décimo sexto.
— Hoje o Arnaldão Vinte e Duas bate o seu recorde — comentou um outro garoto.
Arnaldão Vinte e Duas carregava essa alcunha porque certa noite comera vinte e duas
cumbucas de caldo de mocotó em seguida. Mais quadrado que gordo, tinha apenas treze
anos. Ninguém lhe dava essa idade, no entanto.
— Já chega — sentenciou Vinte e Duas. Jó parou de tocar o pente.
Arnaldão pegou sua pastinha e foi saindo. Sua expressão era fleumática, grave. Seguido
pelos outros boys, dirigiu-se a uma agência bancária em frente.
— O que é que está acontecendo? — perguntou Eugênio.
— Uma aula — respondeu Edmundo, com um sorriso indecifrável no rosto.
A platéia ficou do lado de fora. Esperando. O garoto tomou a fila mais longa.
Aos poucos, as pessoas na fila começaram a olhar em volta, a se mexer... a farejar. A
fila foi se dispersando. Uns, mais afoitos; outros, disfarçadamente. Mas todos tapando o nariz.
— Isso é estilo — declarou Calixto, chorando de tanto rir. Calmamente, Arnaldão Vinte e
Duas se aproximou do caixa.
E começou a pagar as contas. Do outro lado da rua, os boys aplaudiam.
Edmundo se virou para Eugênio:
— Você acaba de conhecer um profissional.
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Office-boy em apuros - Bosco Brasil
Roman pour AdolescentsO cotidiano cheio de encrencas de um office-boy que tem de aguentar a perseguição do chefe e descobrir qual das garotas gêmeas é sua verdadeira paixão. Com suplemento de atividades.