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Muito provavelmente após um pesadelo turbulento que durou todas as horas da inconsciência, Edgar sobressaltou-se, acordando na cama de seu quarto, suando frio.

O cômodo era abundante em silêncio, mas não do tipo de silêncio que reconfortaria um doente, e sim daqueles que assustam, o silêncio da espera constante, da contínua ausência de vida ao redor.

Edgar não conseguia olhar pela janela; a cortina fora fechada, entretanto, a julgar pela pouquíssima e amena luz cinzenta que lançava-se com dificuldade no chão do quarto, ele diria que já estava anoitecendo, e com previsão de chuva para a noite. O clima parecia tão confuso para ele no C.G.R.Y...

As últimas horas para ele foram apagadas de memória. Como muitas outras coisas. Onde estava antes de perder a consciência...? A valsa no jardim. Certificou-se de que cada momento daquele ocorrido ainda estava com ele. Depois... ah, a enfermaria. Yosano. Amnésia dissociativa. Fragmentos do dia começaram a se reconstruir em sua mente, e logo Poe ficou aliviado por não ter esquecido de nada.

Contudo, a paz não perdurou muito.

Porque ainda havia a questão de sua doença. E isso automaticamente reiterava aquele peso no peito que era capaz até de impedi-lo de levantar-se da cama.

O dia ainda não dava-se por encerrado, segundo o que ele estimou. Os vidros da janela rangeram de leve com a passagem brusca de uma ventania.

A realização desoladora de seu estado não concedia-lhe ânimo algum. Como quando as previsões prometem neve no inverno, mas ela não vem. Encarou a frieza do quarto; o seu tão querido par de tênis Coca-Cola fora posicionado no chão comportadamente. Estavam mais amarelados do que costumavam ser, observou ele. Tudo um dia já possuiu uma fase de beleza inédita, daquela que a mocidade das coisas exibe, porém isso se desgasta. A realidade da assombrosa passagem irremediável do tempo é o ácido que corrói e rompe essa impressão daquilo que é belo. São poucas as coisas que não sofrem por isso.

Foi divagando nessa perspectiva, ainda meio abatido, que três toques de uma batida à porta chamaram sua atenção. A princípio, um tremor o acometeu, fazendo-o receoso de que quem estava por vir era Yosano. Tinha certeza de que era ela, indagando sobre como ele estava se sentindo, anotando coisas numa folha sobre a prancheta e manuseando frascos de medicamentos, enquanto Poe se encontrava sob seu olhar analítico.

Todavia, para sua ilustre surpresa, não foi isso o que aconteceu, e sim algo muito mais inesperado.

-Entre... -murmurou, só assim percebendo a amena rouquidão em sua voz ao falar.

Tamanho foi seu espanto quando não recebeu a esperada visita da médica, ou de qualquer outra enfermeira, mas sim viu adentrar o cômodo um rapaz de óculos, gravata, e cabelos cor de ébano bagunçados, o indicador estendido por cima dos lábios sorridentes para pedir silêncio, os olhos esmeralda com um brilho contente, por mais que a situação atual de Poe não fosse exatamente algo com que se contentar.

-Ranpo...?!- Ele sussurrou, abismado, cruzando os braços sobre as cobertas- o que faz aqui?

-Shh! Ninguém pode saber que vim até aqui! Isso precisa ser nosso segredo, entendeu? -Ele sussurrou de volta, sem deixar de sorrir.

Por alguma razão, Edgar sentiu algo aquecer dentro dele assistindo Ranpo adentrar inesperadamente o quarto, como se o simples fato da presença dele o reconfortasse no lastimável estado de sua pessoa, portanto um pequeno sorriso despontou em sua boca.

O recém-chegado se aproximou da cama do doente e com um cuidado que transmitiu-lhe uma segurança além da puramente física. Ele sentou-se sobre os lençóis amassados, sem tomar conta de muito espaço com seu corpo estreito e exíguo, porém de certo modo atraente.

⋆°• Lovely Memories⋆⁺₊ ~{Ranpoe♡}~Onde histórias criam vida. Descubra agora