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RAFAELLA
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Gizelly e eu chegamos a Kauai depois da hora do jantar na noite seguinte. Em vez de nos aventurarmos no restaurante do hotel, o que exigiria muito esforço, pedimos serviço de quarto e nos instalamos na sala de estar da villa. Fiel à sua maneira, Gizelly deu uma olhada no quarto que François reservou para mim e nos remanejou para a última villa restante. Dei uma espiada nela enquanto comíamos em um silêncio amigável.
Ela se recostou em seu lado do sofá, parecendo irritantemente sexy com sua camisa amarrotada e cabelos desgrenhados. Nós duas estavámos cansadas e não daríamos o nosso melhor depois de viajar o dia todo, mas seu desleixo só a deixou ainda mais gostosa.

— Gosta do que está vendo?.- Ela falou.

— Sim.- Fiz questão de olhar ao redor da linda casa. Ela ostentava vistas deslumbrantes sobre o Pacífico, e a sala de estar se abria para uma varanda mobiliada, que por sua vez levava diretamente à nossa praia particular. — Este lugar é deslumbrante.

Não era isso que ela estava perguntando, mas não havia necessidade de inflar seu ego. Ela sabia que eu sabia que ela era gostosa, então qual era o sentido de dizer isso?! A risada de Gizelly aqueceu meu estômago.

Havia uma certa magia em vê-la fora dos limites de suas empresas. Como no
jantar de José, ela caiu em uma versão mais relaxada de si mesma. Sem sua roupa social, riso fácil.

— Eu gosto dessa versão de você.- Segurei minha caneca perto da minha boca. — Você é mais...- Procurei a palavra certa. — Acessível.

Um sorriso brincou nos cantos de sua boca. — Eu sou?

— Vamos colocar desta forma. Gizelly no brasil parece que iria matar se a cortassem no trânsito. Gizelly no Havaí parece que lhe daria uma carona se visse seu carro quebrado na beira da estrada.

O som de sua risada encheu os cantos da sala mais uma vez.

— Estamos no Havaí há menos de duas horas, Rafaella.

— Exatamente. Imagine o que três dias no paraíso farão com você.- Tomei um gole de chá pensativa. — Dançando em uma camisa com estampa havaiana? Juntando-se a mim para a yoga do nascer do sol?

— Rafaella.- Ela se inclinou para frente, seu rosto sério. — O dia em que eu usar uma camisa com estampa havaiana é o dia em que as vacas voarão.

— Você nunca sabe a velocidade com que a tecnologia está progredindo. Pode acontecer.- Respondi. — Você sabe qual
é o seu problema?

— Por favor, diga. Estou muito interessada na resposta.
Ignorei seu sarcasmo inútil. — Você se leva muito a sério e trabalha demais. Você deveria tirar mais férias, ou pelo menos se conectar com a natureza de vez em quando. Faz bem para a alma.

— É tarde demais para minha alma, Rafaella.

Apesar de seu tom leve, senti que ela não estava brincando.

Meu sorriso desapareceu. — Falou como uma verdadeira pessimista.

— Realista.

— Cínica.

— Cética.- Os lábios de Gizelly puxaram para cima na minha carranca. —Devemos continuar jogando o dicionário de sinônimos ou passar para um tópico mais interessante?

— Nós vamos seguir em frente, mas só porque eu quero poupá-la da indignidade de perder.- Respondi majestosamente.

— É muita gentileza da sua parte, senhorita.
Eu não apreciei o riso conhecedor soando em sua voz, mas deixei passar. Ela estava pagando por esta bela villa, afinal, e ela me salvou de passar dez horas em um assento de avião apertado, assistindo a filmes antigos e tentando evitar que minhas pernas adormecessem. Havia poucas coisas mais desconfortáveis do que ser uma pessoa grande na econômica.

Obsessão (Girafa) G!POnde histórias criam vida. Descubra agora