16 - I know everything

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Assim que senti-me desperta tentei mexer os braços mas estes pareciam que não queriam ser levantados. Abri os olhos assustada, estava amarrada, tantos os meus braços e pernas estavam presos aos ferros da cama deixando-me imóvel.

E novamente, estava Alexis, o médico e o enfermeiro ali, especados a olhar para mim à espera de um reação louca vinda pela minha parte. Sentia-me estranha por estar ali, estava com medo de estar ali.

- Está tudo bem menina Caitlin - disse o médico do qual eu esqueci-me do nome - Achamos melhor deixa-la assim para não ter mais um ataque.

- Ataque? - perguntei perplexa.

- Sim, conte-nos o que aconteceu para ter ficado naquele estado - fiquei a olhar assustada para ele. Ele quer que eu lhe conte o que aconteceu comigo? Quer que eu relembre aquela noite onde fui posta como refém?

- Eu já lhe contei, ela não precisa de dizer nada - disse Alexis sorrindo fraco para mim - Eu não quero que ela viva esse dia novamente - preocupação era notória na sua voz deixando-me mais descansada para o quer que o médico queira de mim.

- Mas eu quero ouvir por ela - acenei negativamente ao médico ao mesmo tempo que tentava debater-me daquela cama onde estava presa.

- Desprendem-me por favor - supliquei não aguentando mais ter aquelas espécies de fivelas enroladas a mim. Ficou a olhar para mim duvidoso - Eu não sou uma louca para me manter assim presa - murmurei sem força para mais.

- Eu sei que não - outra pessoa entrou deixando o meu coração acelerado - Sou um psicólogo, se quiser trate-me por apenas Gail. Assisti ao teu ataque de ontem.

Aproximou-se de mim, mordi o interior da bochecha sentindo os seus dedos sobre as minhas mãos enquanto desprendia-me da cama. Não vou ficar com medo, não agora. Respirei fundo vendo-o a aproximar-se dos meus pés, agarrou o calcanhar e por instinto juntei os joelhos. Acho que não aguento mais toque de ninguém.

- Eu sei de tudo Caitlin, a tua cara diz-me tudo o que preciso de saber para não queres sair das ruas - olhei para ele confusa - Tu tens medo das pessoas em geral, mas mais precisamente daquelas que tens mais confiança porque são aquelas que te tocam mais, no teu corpo, com um simples beijo ou abraço. É como se tudo fizesse lembrar ele, o primeiro de todos.

- Doutor Ga - Alexis ia dizer algo mas ele ignorou-a continuando com o seu discurso.

- Se voltares para a sociedade, assim dizendo, outra vez, terás que aprender a lidar com esse medo que tens, mas tu não sabes como. Não fazes a mínima ideia de como tens de o suportar durante todo o dia para apenas as pessoas pensarem que és como uma delas. Como irás arranjar trabalho se tens medo que te toquem nas mãos sempre que tens uma descaída? Como irás conseguir olhar-lhes nos olhos e dizeres o que queres se tens medo de o encontrares no meio deles? 

- Não acha que - e novamente não conseguiu acabar a sua frase.

- Mas ao viveres nas ruas não precisas de lidar com esse teu receio, até posso confirmar como um trauma, porque simplesmente ninguém te quer tocar, apenas deixam uma moeda ou algo perto de ti, e não te sentes ameaçada porque as pessoas nem sequer um sorriso forçado se dão ao trabalho de dar. E quanto ao outros sem abrigos? Tu queres acreditar que partilham o mesmo anseio que tu, sabendo perfeitamente que não é verdade, mas foi este o teu mecanismo de defesa. 

- Sabe que ela tem amigos?

- Porque vieram antes do sucedido - disse virando-se para ela, depois voltou a encarar-me - Pensavas que o mundo tinha um pouco de compaixão apesar de terem-te tirado tudo o que tinhas e não tinhas. Mas ele tirou-te essa pequena inocência que tinhas deixando-te com nada, apenas com um medo. E quando pensaste que finalmente tudo iria ficar bem, que encontras-te alguém que pudesses confiar algo tão grande de como é seres tu, entregares-te completamente, algo novamente acontece deixando-te perplexa com o porque de seres tu a escolhida, por duas vezes.

- E o que isso tem haver com o tratamento?

- Menina Alexis, tem tudo haver - falou como se fosse óbvio, e é - Porque é que ela se vai submeter a algo que não irá mudar a maneira de como ela vê daqui adiante a sua vida? A Caitlin quer morrer, porque a vida resume-se a tudo o que ela nunca quis admitir que lhe falta. Agora que tudo virou de pernas para o ar, agora que a vida dela deu uma volta de 180º e rodou outros 90, ela apenas quer desaparecer no mundo. Porque daqui adiante ela não irá aceitar que as pessoas são bondosas e simpáticas, apenas cruéis que querem sempre algo em troca. Não bastou terem-lhe tirado uma vez a inocência toda, que tiveram de lhe tirar todo o trabalho que teve para voltar a reconstruir a sua vida de novo, como se nada tivesse acontecido. Não estou certo?

Olhou para mim esperando pela minha confirmação. Senti uma grande tensão por todo o quarto, a Alexis estava com aquela expressão que não queria acreditar no quer que ele estivesse a dizer, mas era verdade. 

- Sim - respondi - Agora já posso ir?

- Não - respondeu deixando, novamente, confusa.

- Por favor - pedi olhando para os seus olhos procurando algo que me fizesse ganhar esperança.

- Não são essas as políticas do hospital, és menor, irás ter de te submeter a um tratamento para a infeção, iremos fazer-lhe uma dieta rígida para alterar esses hábitos alimentares. Depois ficará internada num centro de traumas, eu irei ficar encarregue de a fazer passar por cima disto tudo.

- Como eu vou acreditar que você me irá ajudar a esquecer aquilo tudo?

- O meu objetivo não é a fazer esquecer, mas sim ajudá-la a viver com o que tem.

- E o que eu tenho?

- Um trauma, tem medo de pessoas e do que são capazes, do seu toque.

- E o que irá fazer contra isso? 

- Confiança, tudo anda à volta da confiança menina Caitlin.

- Como irá decorrer o processo? 

- Todos os teus amigos irão estar envolvidos nisto.

- E o Michael? - perguntei trémula, o meu coração acelerou e senti que as minhas mãos já suavam devido ao nervosismo que sentia neste exato momento.

- Também, mas tudo a seu tempo.

Quero fugir. Por favor, alguém que me venha buscar e me leve para bem longe disto tudo. Que me leve para o meio da rua onde eu posso ser eu, apenas eu e mais ninguém. Que me deixei estender o chapéu para pedir alguma esmola, ver o olhar ignorante das pessoas que me faz pensar no quanto a sociedade está perdido pelo preço e imagem das coisas. Quero fugir, alguém que me ajude. Por favor.

Homeless || Michael Clifford (Short Fanfiction)Onde histórias criam vida. Descubra agora