1

180 25 1
                                    

UM

Em Xangai, na China carros
Vermelhos são proibidos

Vários meses depois...
Wei Wuxian
Algumas pessoas dizem que eu nasci com óleo de motor em minhas veias.
Que a chamada de uma estrada aberta e um carro com um tanque cheio de gás era a razão pela qual eu vivia e respirava.
Eu amo carros demais. Amei a forma como o motor acelerou quando virei à primeira vez a chave, o cheiro de couro recém-polido, e a sensação do volante sob minhas mãos.
Acima de tudo, amei a velocidade.
Eu amava voar pelo asfalto em um ritmo que poderia me colocar na cadeia... Ou pior. Eu amava a emoção de transpor uma linha tênue entre a vida e a morte, e que um pequeno erro poderia literalmente me deixar em um caixão.
Mórbido?
Poderia ser se eu tivesse um desejo de morte. Eu não tinha planos de morrer, não tão cedo. Mas isso não me impedia de viver como queria. Havia algo tão incrivelmente libertador sobre quebrar todas as regras quando eu estava na estrada.
Algo sobre a liberdade que me abraçava.
Mesmo que a adrenalina fosse a minha droga, eu ainda era um homem.
Eu ainda era humano.
Quando me cortava, não era um óleo espesso e preto que vazava de minhas veias. Era sangue. O mesmo sangue vermelho que todos os outros tinham.
Ainda assim, deixava todos pensarem que eu era um pouco menos humano do que eles. Eu alimentava a percepção de que talvez houvesse algo a mais dentro de mim que me dava uma vantagem.
Eu faria o que fosse preciso para chegar à linha de chegada.
Foi precisamente com essa atitude que fui ganhando um nome no circuito de velocidade aqui em Maryland. Foi a minha condução “sem-pé-no-freio,”, até que meus pneus ficassem logo carecas e os nós dos meus dedos ficassem brancos ao volante, até as línguas balançarem.
E em se tratando de carros, uma conversa era a metade da batalha.
A outra metade?
A forma como um homem dirigia.
Inferno, o tipo de motorista que você era, pode ser até mais importante do que a coisa real que você dirigia. Porque quando chegava à hora...
Não era o tamanho do motor do carro.
Era o tamanho do motor do homem.
O meu motor?
Era tão grande que era edição limitada.
Eu ficava na minha, também. Se alguém quisesse saber quem eu era, eles podiam entrar no banco do passageiro, e eu lhes mostrava. Eu não precisava falar de heróis; só precisava dirigir.
O autódromo de Chesapeake era a maior pista desse lado de Maryland. Mas, na outra direção do estado, perto das grandes cidades, onde os Knights (a nossa equipe de futebol do estado) tinha a base, havia uma pista ainda maior, onde alguns grandes eventos aconteciam ao longo dos anos. Mas essa pista era um nível mais profissional. Pelo menos em termos de concorrência.
Eu não podia apenas entrar naquela pista e correr. Para chegar lá, eu precisaria de patrocinadores. Eu precisava de um carro melhor e um nome maior.
Basicamente, no mundo das corridas, o dinheiro falava mais alto, e assim, você faz o que pode.
Mesmo que eu estivesse pilotando desde que tinha cinco anos, estava basicamente começando de baixo. Crescendo na Carolina do Norte, a corrida era apenas um hobby. Era apenas algo a mais que meus pais me deixavam fazer, porque se não o fizessem, eles me encontrariam na garagem, tentando purificar o cortador de grama para torná-lo mais rápido.
Ou usar um capacete e subir em um kart caseiro para descer da colina no meu quintal.
Kart = era um antigo carro de corrida com rodas, onde tirei as grades e coloquei um volante velho e sobressalente no topo.
Minha mãe quase teve um ataque cardíaco naquele dia.
Eu ainda não sei o motivo de toda aquela confusão. Eu tinha usado um capacete.
Enfim, tive que atender a minha necessidade de velocidade de uma forma mais controlada, e devia ter permissão para fazer “máquinas de morte” caseiras (palavras da minha mãe, não minhas). Mesmo que tudo na minha vida girasse em torno da pista, ainda esperavam que eu fosse crescer fora dela.
Dirigir nunca seria algum tipo de escolha de carreira.
Minha carreira foi decidida muito antes de eu sequer pegar em um molho de chaves. Meu pai queria um filho que seguisse seus passos, um filho que fosse aquilo que ele queria. Quando saí de casa, o meu destino estava selado.
Pelo menos até exatamente seis meses atrás.
Até então, eu havia feito tudo o que esperavam de mim. Terminei o ensino médio, fui para uma faculdade de alto nível, e me destaquei em TI (tecnologia da informação) e ciência da computação. Não surpreendentemente, também me destaquei em design gráfico, provavelmente porque era muito mais divertido do que a ciência do software. Mas, ainda assim, superei ambas as matérias.
O que posso dizer? Eu tenho um grande cérebro para correr junto com o grande motor dentro de mim.
Meu pai estava recheado de orgulho como um peru no Dia de Ação de Graças. Depois da faculdade, fiz um estágio em uma empresa de software e tecnologia, fazendo café todos os dias, gastando tanto tempo o quanto fosse possível nos elevadores, e tentando não morrer por dentro.
Quando eu ligava ou ia para casa, agia como se tudo estivesse ótimo, como se a minha vida no mundo da informática fosse exatamente o que eu queria.
Mas não era.
Na verdade, quanto mais tempo passava naquele prédio de escritórios, mais enjaulado eu me sentia.
A única coisa que me impediu de perder a cabeça completamente foi às longas viagens de carro que eu fazia depois do trabalho. E o tempo que passava na pista local (que era pouco mais que um caminho de terra circular).
Quando o estágio terminou, fui para casa sabendo que meu pai já estava marcando filas de entrevistas e oportunidades de trabalho para que eu pudesse começar a minha carreira com seriedade.
Eu tinha que ficar longe dele.
Eu precisava respirar.
Quando fiquei sabendo que a minha irmã Qing foi morar com um cara que nenhum de nós conhecia, eu decolei. Foi à desculpa perfeita para ir embora. Afinal de contas, sempre fui muito protetor de Qing. E meu pai não podia dizer nada por eu ter que dirigir até lá. Ele queria que sua filha ficasse bem.
Então, sim, talvez eu tivesse usado a minha irmã como uma desculpa para me dar um pouco de férias.
Mas então, acabei parando em uma bela entrada de garagem.
Bati na porta da frente de uma casa em um bairro chique.
A visão de minha irmã me fez esquecer a razão pela qual eu tinha acelerado na interestadual para chegar lá. Claro, mesmo que a sua escolha de companheiro não fosse a minha favorita, mas, depois que realmente conheci o cara, as coisas mudaram. E não apenas o Cheng...
Qing tinha uma família inteira aqui.
Uma família que me senti uma parte quase que imediatamente.
E, de muitas maneiras, mais do que eu já tinha com a família que nasci.
Era quase perturbador. Olhando para as pessoas que eu não conhecia há muito tempo, me senti como se fosse à pessoa que estava destinado a ser – a que eu havia suprimido em minha vida para agradar ao meu pai – era aceito por eles e eles me aceitavam.
De repente, não parecia que eu estava fugindo de alguma coisa, mas para alguma coisa.
Para a vida que eu realmente queria. A vida que nunca considerei que pudesse ter. Meu hobby, minha paixão poderia ser mais do que isso.
Era como se eu fosse um carro descobrindo que estava dirigindo com o meu freio de emergência puxado.
Talvez por isso eu fosse esse viciado em adrenalina agora. Eu havia perdido tempo, e tinha que compensar.
Dizer ao meu pai que eu não voltaria para casa, que não iria trabalhar naquelas grandes empresas, de alto perfil e com salários iniciais polpudos, não havia sido fácil. Dizer ao meu pai, um homem que eu amava; que eu estava rejeitando tudo o que ele queria para mim foi provavelmente a coisa mais difícil que eu já havia feito.
Mas Qing me deu coragem e também um gosto da vida que eu poderia ter aqui.
Ele não ficou feliz com isso, mas não foi à luta que eu imaginava que seria. Ele ficou muito mais tranquilo com a minha escolha, acabou aceitando. Até Qing parecia levemente surpresa.
Não questionei isso.
Por que eu deveria?
Que tipo de homem procura problemas quando é a última coisa que quer?
Um burro.
E já foi observado que eu não sou burro.
O som de carros trocando as marchas e gritando fora da pista me trouxe de volta ao presente.
Era raro eu perder o foco na pista de corrida.
Claramente, eu estava entediado.
Acho que esta pista não era a corrida que eu precisava esta noite.
Ou talvez fosse o fato de eu já ter vencido as duas vezes que corri esta noite.
Eu vi dois carros na pista, um Camaro de modelo mais antigo e um SS Monte Carlo, correndo.
O Monte Carlo diminuiu o nitro um pouco perto da linha de chegada.
Custou-lhe a vitória.
O Camaro estava em aceleração máxima durante todo o tempo. Totalmente comprometido em cada volta. Era exatamente por isso que ele tinha que perder uma corrida esta noite.
Até agora.
Eu deslizei o meu Mustang até a linha de partida quando fui liberado para fazê-lo. O homem que gerenciava a linha me deu um OK e estava prestes a dizer-me para voltar, mas eu o joguei no acostamento e escancarei a porta do motorista.
“O que ...” ele gritou, andando na minha direção.
Eu levantei uma mão e apontei. O Camaro estava chegando e era provável que fosse fazer outra corrida.
Eu plantei as botas que usava na calçada e encontrei os olhos do motorista mais à frente.
Era um desafio, direto e claro.
Já havia me decidido, e como já estava na fila, uma vez que era a minha vez, teria uma última corrida.
E ia ser uma boa corrida.
Senti os olhos da multidão me assistindo, e sabia que eles estavam confusos. Então, levantei o braço, estendi minha mão e apontei para o carro preto e lustroso, invicto esta noite.
Eu ainda não tinha visto aquele Camaro por aqui; este piloto não era um regular.
Isso significava que ele era novo em corridas ou apenas estava de passagem. De qualquer maneira, eu aproveitaria a oportunidade de correr com alguém novo.
O movimento de pessoas nas proximidades aumentou, todos começaram a aplaudir e gritar, claramente entretidos com o meu desafio.
Geralmente, fazer corridas nesta pista em uma noite como está não era assim. Você tinha que entrar na fila, esperar a sua vez, e correr com o cara ao seu lado.
O motorista não escolhia o seu adversário. Ele corria com quem estava na fila. Nossos tempos eram escrito em um quadro branco, e todos nós tentávamos correr para baixar esse tempo.
Bem, eu principalmente tentava bater o meu tempo.
Eu sou muito competitivo comigo mesmo.
Então, mais tarde, em noites mais planejadas, os pilotos com os melhores tempos voltavam a correr, era o tipo de corrida onde apenas corriam os melhores tempos.
Olhei para o homem que supervisionava a linha para ver se ele se oporia, mas parecia bastante divertido, conhecia o meu jeito.
Abaixei o meu braço e olhei para o Camaro. Ele diminuiu a velocidade, e pude sentir os olhos do motorista. Eu o vi, e ele hesitou. Eu estava surpreso.
Ele não estava aqui para correr?
Os contornos de sua cabeça e dos ombros se contorciam, como se ele estivesse olhando por cima do ombro, ou procurando alguém.
Olhei para além do seu carro, além da multidão. Havia uma tonelada de carros estacionados ao redor. Não havia jeito de saber o que ele estava procurando.
Tão rapidamente quanto ele virou, ele voltou. O Camaro mudou sua direção, atravessando a pista até a faixa de largada.
Todos aplaudiram.
Sorri e voltei para o Mustang.
Quando o Camaro emparelhou, acenei para o piloto da vez que eu iria correr com outro piloto; dando uma volta completa até a linha de chegada. Dei uma saudação simulada em agradecimento por deixar esse cara entrar na linha.
Antes de colocar o cinto, me virei para olhar por cima do ombro, procurando por Lan Zhan, que estava nas proximidades. Ele usava um boné de beisebol preto, virado para trás de sua cabeça, seus braços estavam cruzados sobre o peito, e ele estava sorrindo.
Eu sorri e acenei.
Alguns instantes depois, ambos os nossos carros foram verificados para garantir que estavam no mesmo lugar na linha de partida, e, em seguida, uma garota com uma saia minúscula de cotton, com um top e saltos altíssimos ficou entre nós. Em sua mão estava uma bandeira quadriculada.
Ela apontou primeiro para o motorista ao volante do Camaro.
Em resposta, o motor acelerou em voz alta, mas foi um som suave e poderoso. Em seguida, a menina da bandeira apontou para mim. O Mustang rosnou em resposta.
Segurei o volante quando uma onda de excitação salpicou em minhas entranhas.
Isso era o que faltava.
A mulher levantou as mãos. A bandeira voou para a direita com o vento.
Baixei os óculos de sol que estavam apoiados na minha cabeça. Sim, já era noite e não estava ensolarado. Mas os óculos de sol me davam uma vantagem.
Ele escurecia tudo ao meu redor, só um pouco. Para qualquer outra pessoa, isso poderia ser um inconveniente.
Mas, o fato da variação de tons ajudava com o meu tempo de reação na pista. Sim, eu sei. Eu parecia até uma vovozinha supersticiosa divulgando os benefícios de dormir com alho em sua gaveta de meias ou alguma merda assim.
Mas isso era um fato.
É realmente um fato comprovado que usar óculos de sol pode ajudar um motorista com o seu tempo de reação. O olho humano capta melhor a luz no escuro. Ou seja, no mesmo segundo que recebesse a liberação para correr, eu poderia vê-lo imediatamente. Não haveria perda dos preciosos milissegundos, enquanto esperava que a minha mente fosse se recuperar.
Sabendo que estávamos prontos para voar, a menina da bandeira apontou para uma luz nas proximidades, indicando o sinal da largada.
Uma vez que a pista estava liberada, respirei fundo e segurei firme o volante, deixando a onda familiar de adrenalina correr em meus membros.
A luz mudou para verde, e arranquei da linha de partida imediatamente. Eu segurei o volante com firmeza para manter o Mustang em linha reta, me mantendo à direita no caminho, onde já havia marcas de pneus das antigas corridas desta noite.
Borracha adere à borracha.
E isso significava que os meus pneus teriam melhor tração e aderência enquanto pudesse dirigi ao longo dessas marcas. Era como seguir alguém em uma tempestade de neve. Era mais fácil andar em cima dos seus passos ao invés de criar o seu próprio caminho.
O motorista do Camaro era rápido também. O cheiro de pneus queimando e o ronco do motor dos carros era inebriante.
Eu acionei o nitro, mas não usei tudo.
Eu já havia assistido várias corridas de carros esta noite, e não precisava acionar todo o poder do V8 do meu Mustang, porque eu poderia ganhar desse cara sem ele.
Era mais um dos meus truques. Nunca mostrar-lhes tudo o que tinha; manter um pouco de reserva até que fosse absolutamente necessário. Ele não precisa conhecer a minha velocidade máxima. Eu só precisava ser um segundo mais rápido.
Um segundo era o suficiente.
Um segundo era à diferença entre ganhar e perder.
Acelerei imediatamente, e todo o resto desapareceu. Tudo o que sentia era à força do motor do carro abaixo de mim, e a forma como os meus pés vibravam com a velocidade que eu estava viajando.
No meio do caminho, o Mustang alcançou a velocidade máxima, não era o suficiente ainda para ganhá-lo. Agora, eu estava acelerando.
Meu grito vibrou no interior do carro, e olhei rapidamente para o Camaro.
Ele estava bem ao meu lado. Estávamos lado a lado.
Venha! Eu silenciosamente gritava para ele.
Ele observou o quão bem emparelhado nós estávamos. E acabei sentindo um cheiro diferente no ar com a nossa disputa.
Calmamente, olhei para trás e acionei o nitro, arrancando para frente.
Usei o nitro apenas o suficiente para cruzar a linha de chegada em primeiro lugar.
Eu vi o outro motorista ao volante enquanto alcançava a linha de chegada. Ele ainda estava correndo a todo vapor. Desliguei o nitro e ele continuou.
“Otário,” eu murmurei e fiz uma curva brusca imediatamente. A extremidade traseira da carroceria derrapou um pouco com a força da minha guinada, mas os pneus seguraram, e deslizei para frente.
Ao longo da pista, procurei a pessoa que eu queria compartilhar a minha vitória. O meu melhor amigo. Lan Zhan estava com dois dedos na boca, assobiando com a minha vitória. Vi quando ele baixou as mãos e começou a bater palmas.
Momentos depois, parei perto de onde ele estava. Ele abriu a porta do seu carro e correu a curta distância entre nós. Abaixei a minha janela, e ele descansou as mãos no peitoril da porta.
O boné escuro que ele usava cobria a maior parte de sua cabeça, destacando os seus olhos. Normalmente, eles eram de uma cor mais clara, mas na noite escura, parecia uma máscara profunda de âmbar.
“Esse foi um exemplo excelente de condução!” Ele bateu na porta.
“Ainda estou entediado,” eu disse lentamente, inclinando a cabeça para trás contra o encosto de cabeça e sorrindo para ele.
Um sorriso malicioso curvou sua boca. E aquele dente dele, ligeiramente torto na frente, fez o meu sorriso aumentar. “Siga-me,” Lan Zhan concordou e voltou para o seu Mustang.
Segundos depois, o carro acinzentado na minha frente, me acompanhou no asfalto.
Acionei o nitro, e afundei a minha bunda no banco, rumo à estrada principal.
Era hora de se divertir.

♧♧♧♧♧♧♧♧♧♧

#JunkieOnde histórias criam vida. Descubra agora