O homem das mil caras - IV

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Franka e seus cientistas faziam uma revisão diária, de rotina, da informação brindada pelos implantes que quase todos os garotos tinham. Tentavam registrar através destes dispositivos alguma atividade neural extraordinária, devido ao vínculo do portal com os habitantes da casa. Numa tarde, enquanto cumpriam a rotina analisando a Lleca, o painel teve uma sobrecarga de tensão por um instante, e depois de um momento de sobressalto, se relaxaram ao ver que nada havia ocorrido.

Nesse momento, Lleca estava conversando com Tacho e Luca, e de repente ficou como congelado, com o olhar perdido e uma frase interrompida. Tacho e Luca o olharam, e pensaram que seria outra de suas brincadeiras, mas Lleca não estava ali, e sim imerso em uma recordação que havia apagado: uma mulher e um homem lhe aproximavam um bolo, com duas velinhas, enquanto lhe cantavam feliz aniversário.

"Feliz aniversário, Leon! Muitas felicidades, muitos anos de vida!"

- Leon! Me chamo Leon! - exclamou Lleca, voltando a si.

Tacho e Luca o olharam desacreditados, mas o menino saiu correndo, desesperado para encontrar Nico. O processo que Franka havia estado realizando, por alguma razão desconhecida, tinha produzido um efeito químico no cérebro de Lleca, trazendo a sua consciência uma lembrança reprimida do dia que completou dois anos. Como Nico não estava em casa, recorreu a Cielo.

- Estava conversando com os garotos - explicou Lleca, acelerado - e de repente, pum, vejo uma nami, linda, loira, que me cantava parabéns pra você. E atrás dela tinha um boncha, não o vi bem. E me disseram: "Leon".

- Terá sido um sonho, Lleca? - arriscou ela.

- Não, Cielo, não! Não foi um sonho, eu estava acordado. Foi uma lembrança, entende? Me lembrei dos meus pais... e do meu nome. Você não se lembra, mas eu procuro meus pais, e eu não sabia como me chamava... Mas me chamo Leon!

Esse descobrimento era muito importante para ele, já que era o único de todos seus amigos que não sabia seu nome, e apesar de que tinham tentado lhe batizar em várias ocasiões, ele sempre havia se recusado, pois havia decidido esperar até descobrir seu verdadeiro nome. E isso, por fim, tinha ocorrido. Era uma certeza: se chamava Leon. E, para dizer a verdade, adorou seu nome. Mas isso não era tudo: havia tido uma lembrança de seus pais, aos que sempre havia buscado. Agora, pelo menos, tinha uma pista concreta para desvendar o quebra-cabeças de sua história.

Como ele parecia estar bastante convencido de que aquela visão era uma recordação, Cielo lhe pediu que descrevesse as pessoas que havia visto.

Ao homem não o tinha claramente, pois não tinha conseguido vê-lo bem, mas da mulher pôde dar muitos detalhes. Para ajudá-lo, Cielo lhe propôs fazer um retrato-falado, e Lleca ficou confuso ao descobrir que agora ela também era uma desenhista muito talentosa. Depois de algumas horas, Cielo tinha elaborado um desenho da suposta mãe de Lleca, ou Leon, e ele considerou que o retrato-falado se parecia muitíssimo a mulher que ele tinha se lembrado. Agora tinham uma ferramenta concreta para começar a buscá-la.

Quando Nico regressou da estância, ela comentou com ele o ocorrido com Lleca, e ele lhe informou o assombroso descobrimento que ele e Salvador haviam feito ali.

- Um relógio igual a este? - perguntou Cielo.

- Idêntico. E já sabemos que este relógio é um portal. Possivelmente não é o único, e aquele que Charlie tinha no campo talvez fosse outro.

- Se for isso mesmo, algo tão impactante nas mãos dessa gente é um perigo - concluiu Cielo, e Nico concordou com ela.

Ele já vinha pensando desde um tempo atrás que tinha chegado a hora de enfrentar realmente essa gente. O que no início foi algo ameaçador havia se convertido em algo muito perigoso. Já haviam sequestrado Cielo, tentado matar Malvina, e por causa desses implantes, Thiago esteve a ponto de morrer.

Quase Anjos - O Homem das Mil CarasOnde histórias criam vida. Descubra agora