Uma parte de mim já aceitava o destino cruel que se desenhava diante de nós. O silêncio que se seguiu era denso, carregado de uma tristeza que parecia invadir a alma. Cada um estava preso em seus próprios pensamentos sombrios, e o caminho à nossa frente se estendia, interminável. O sol, já se escondendo no horizonte, tingia tudo com um tom alaranjado, enquanto o vento soprava mais ameno, sem pressa, como se o tempo estivesse cansado de seguir adiante.
Me aproximei de Newt, que parecia mais perdido do que todos nós juntos. Seu olhar estava vazio, sem foco, como se a esperança tivesse sido arrancada dele de uma vez por todas. Thomas, percebendo a exaustão que nos consumia, sugeriu que procurássemos um lugar para passar a noite.
Após um dia inteiro de caminhada, encontramos alguns containers abandonados, espalhados como destroços de uma batalha esquecida. Precisávamos nos preparar para o frio que logo nos atingiria, então decidimos fazer uma fogueira. Cada um saiu em busca de algo útil para mantermos o calor e a vida.
Eu e Minho fomos encarregados de buscar madeira. Deixamos nossas bolsas de lado e nos afastamos do grupo. Já um pouco distantes, com o peso da tensão no ar, Minho quebrou o silêncio, me encarando de forma séria e inquieta.
—Você tá bem? — perguntou Minho, com aquele tom cauteloso que raramente usava.
—Sendo bem sincera, não estou nem perto disso — respondi, minha voz carregada de um cansaço que ia além do físico.
—Posso saber o motivo? — ele continuou, embora já soubesse, como todos ali. — Ouvir de novo nunca é demais, imagino...
Eu o encarei por um segundo, pensando em como era inútil explicar aquilo tudo mais uma vez, mas ao mesmo tempo sentindo a necessidade de externalizar o caos que me consumia. Não era algo simples de se colocar em palavras, mas ainda assim tentei.
—Sabe quando você tem certeza de que está lutando por nada? Quando tudo parece uma batalha perdida antes mesmo de começar? — minha voz tremia, e eu não conseguia evitar. — É isso que eu sinto. Como se cada esforço fosse um grito abafado pelo vazio...
Minho suspirou, cruzando os braços enquanto me observava em silêncio. Ele sabia o que era carregar o peso da sobrevivência, mas cada um carregava o seu de maneira diferente.
Voltamos, e montamos a fogueira, e logo as chamas começaram a dançar livremente no ar, espalhando um calor breve, mas reconfortante. Cada um de nós observava aquelas labaredas, hipnotizados pelo movimento suave que pareciam ecoar nosso próprio caos interno.
— Eu pensei que fôssemos imunes — disse Minho, rompendo o silêncio que parecia pesar como uma muralha entre nós.
— Nem todos, ao que parece — murmurou Teresa, seus olhos fixos nas chamas.
— Se o Winston foi infectado, então talvez... aconteça o mesmo com a gente, não é? — perguntou Newt, a voz trêmula, mal disfarçando o medo que todos sentíamos.
Caçarola respirou fundo, e vi as lágrimas se formarem em seus olhos. — Nunca pensei que diria isso... — sua voz falhou por um momento. — Mas sinto falta da Clareira.
Engoli em seco, lutando para segurar o choro. — Talvez nos colocaram no labirinto apenas para seu próprio entretenimento... e nada mais — falei, com um amargor que não consegui esconder.
Mais uma vez, o silêncio nos envolveu como um manto pesado. Cada um afundou nos próprios pensamentos, como âncoras se arrastando pelo fundo de um oceano sem fim. Levantei-me e caminhei até Minho, deitando ao seu lado, em busca de algum consolo no vazio. Assim como os outros, me perdi em minhas reflexões, deixado à deriva nas sombras da noite.
Eu me perguntava se a paz um dia nos alcançaria. Um pensamento quase absurdo, inalcançável, como um sonho quebrado antes mesmo de ser sonhado. A realidade era um labirinto de sombras, e sem perceber, Gally invadiu minha mente, como um eco distante de algo que eu preferia esquecer. Ele sempre trazia consigo uma mistura de culpa e dor, lembranças de uma luta sem fim que não conseguíamos evitar.
As memórias de suas palavras duras, da maneira como ele sempre parecia carregar o peso do mundo nos ombros, voltaram com força. E, de repente, me perguntei se ele também se perguntava se essa busca incessante por sobrevivência fazia algum sentido. Talvez ele já soubesse a resposta. Talvez já estivesse cansado de lutar, assim como eu.
O silêncio ao meu redor se tornou insuportável, pesado demais para ser ignorado. Como se cada segundo fosse uma nova tortura, uma nova forma de sofrimento.
Mas a paz... essa nunca viria. Não para nós.
—Ainda acordada? — a voz de Minho rompeu o silêncio, carregada de uma preocupação mal disfarçada.
—Dá pra dormir com essas vozes me assombrando? — respondi com um sorriso amargo, uma risada seca escapando antes que eu pudesse controlar.
Ele ficou quieto por um momento, talvez refletindo sobre o que eu tinha dito, ou talvez tentando encontrar as palavras certas para preencher o vazio entre nós. Mas a verdade é que não havia o que dizer. Não quando a escuridão parecia tão densa, quando as memórias se acumulavam como fantasmas que se recusavam a partir.
—Às vezes me pergunto se um dia elas vão parar — murmurei, quase para mim mesma. — Se essa sensação de estar sempre sendo perseguida por algo invisível, algo que não consigo escapar, vai embora.
Minho suspirou, sentando ao meu lado, os olhos fixos no nada. — Talvez as vozes nunca parem — disse ele. — Talvez sejam elas que nos mantêm acordados, que nos lembram do que perdemos. Do que não conseguimos consertar.
Havia uma verdade cruel nas suas palavras. Uma verdade que eu não queria admitir, mas que sabia ser real. As vozes eram a nossa consciência, os fragmentos do que restou de nós. E talvez, no fim, fossem elas que nos manteriam vivos.
—Tenta descansar. Amanhã temos um longo caminho pela frente — Minho disse, mas havia uma certa hesitação em sua voz, como se ele soubesse que descansar fosse impossível, tanto para mim quanto para ele.
—Eu vou tentar — murmurei, sabendo que eram apenas palavras vazias.
Minho sabia. Eu sabia. O descanso não viria, não quando a mente estava tão cheia de pesadelos acordados. Fechei os olhos, mas tudo o que encontrei foi a escuridão familiar, aquela que não oferecia consolo, só mais perguntas sem resposta.
Enquanto o silêncio se estendia entre nós, não pude evitar pensar no que Minho havia dito. A estrada à nossa frente... um longo caminho, ele disse. Mas será que esse caminho nos levaria a algum lugar? Ou era só mais uma viagem sem destino, como tantas outras? Às vezes parecia que estávamos apenas andando em círculos, sempre voltando ao ponto de partida, presos em uma espiral de dor e perda.
Talvez o descanso não fosse o que precisávamos. Talvez, no fundo, fosse a aceitação de que essa jornada nunca teria fim.
Um breve capítulo, para já já o caos começar.
Beijos e até breve.👋🏻