Continuamos andando pela rua até o final, atravessando um portão enferrujado que rangeu em protesto. Do outro lado, o que vi parecia uma distorção da realidade, uma miragem quase absurda. Entre os prédios destruídos e as ruínas cinzentas, havia vida. Barricadas feitas de destroços, carros convertidos em abrigos, e tendas improvisadas espalhadas caoticamente pelo cenário. A sobrevivência parecia um teatro cruel, onde a esperança era tão precária quanto as estruturas ao nosso redor.
-Tentem passar despercebidos -murmurou Brenda, sua voz baixa mas carregada de tensão. Assenti, sentindo o peso crescente dessa missão impossível. Enquanto caminhávamos por entre os destroços, passei por um grupo de pessoas ao redor de uma fogueira, cozinhando suas refeições. O aroma denso de comida me atingiu com força, fazendo minha barriga roncar alto. A fome era um lembrete cruel do quanto estávamos no limite. Precisávamos de ajuda, e Marcus era a nossa última chance.
Chegamos, finalmente, diante de um edifício imponente, sua fachada vermelha desbotada pelo tempo exibindo em letras desgastadas: "ZONA A". O prédio branco, com pilastras que lembravam uma era esquecida, parecia deslocado naquele caos. Ao redor, pessoas se amontoavam, conversando, algumas claramente embriagadas, outras com olhares exaustos, tão quebradas quanto o mundo que as cercava.
-Tem certeza que é aqui? -Thomas perguntou, sua desconfiança óbvia enquanto fitava a entrada com uma expressão sombria.
Antes que alguém pudesse responder, uma voz feminina soou atrás de nós.
-Vieram para a festa? -A voz era casual, mas havia algo nela que me fez virar bruscamente. Diante de nós, uma mulher loira, com um sorriso enigmático nos lábios e olhos azuis afiados como lâminas, nos observava. Sua postura era firme, quase desafiadora, como se soubesse exatamente o que procurávamos.
-Não, estamos procurando Marcus -respondeu Brenda, firme, seus olhos fixos na mulher. Havia um tom de desafio em sua voz, como se estivesse pronta para qualquer reação.
Eu me mantive alerta, analisando a mulher de cima a baixo. Cada detalhe dela parecia um aviso de que ali, nada seria simples. Seus olhos azuis me atravessavam com uma familiaridade desconfortável, e por um instante, me senti como uma peça menor em um jogo que ainda não compreendia.
-Eu soube que ele morava aqui -Brenda continuou, suas palavras rápidas.
Antes que a loira pudesse responder, uma risada suave veio de trás de nós, e quando me virei, vi um homem encostado casualmente no batente da porta. Ele tinha uma postura altiva, um copo de bebida na mão e um sorriso insolente nos lábios.
-Marcus não mora mais aqui -disse ele, sua voz carregada de uma calma perturbadora.
O ar ao nosso redor parecia ficar mais pesado, e um arrepio frio percorreu minha espinha. Esse era Marcus? Aquele homem com cabelos curtos, barba por fazer e uma jaqueta vinho que contrastava violentamente com o branco desgastado do prédio? Havia algo nos olhos dele, penetrantes, quase predatórios, que me fez sentir como se estivéssemos em território perigoso.