34. Não é o amor

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"Que piada sem graça essa do universo quando me deixou rever você.
Quando te deixou me ferir e me quebrar em vários pedaços,
Cacos e mais cacos,
Espalhados pelo caminho que andei sozinho.

Eu odeio andar sozinho...

Que audácia me culpar pelas suas feridas,
Quando foi você que me fez em vários pedaços ser partida.
Tão quebrada e impossível de colar sozinha.

Que ousadia,
Me culpar pelo teu sangue derramado,
Se foi você quem me seguiu e pisou em cada caco caído no chão.
Cada um que você quebrou!
Piada...
É uma piada sem graça você querer — só agora — segurar minha mão.

Que ridícula sua tentativa de colar cada parte que quebrou,
Com esse resquício mesquinho de amor.
Egoísta.
Esperou que eu sangrasse por toda a pista para vir com o remédio.
Esperou que eu sofresse, desistisse de lutar, para que, no fim, não você, mas eu
Ficasse com o mérito pelo nosso final.

É, que ousadia... até eu fiquei incrédulo.

Santo Deus, como você é...

Chega, você não cabe mais em minha poesia."

O cupido coloca o papel de volta sobre o móvel, os olhos marejados. Nem percebe quando fica alguns minutos assim, apenas encarando aquelas palavras. A letra bonita de Augusto lhe causando angústia.

O poeta entrou no quarto, vestindo um roupão. Esse era "seu" quarto, já que não dormiam mais juntos.

— Áquila? — chamou o amado.

Os olhos castanhos observavam o cupido com cuidado. Augusto nunca se importou que ele lesse suas coisas, e não era agora que ficaria bravo.

— Isso é sobre nós?

— Não, quer dizer, não sei... qual é esse? — se aproximou e olhou o início do poema. — Não é sobre nós.

O baixinho suspirou, tirando o elástico que estava em seu braço para prender o cabelo em um pequeno rabo de cavalo.

— Ok, se você diz. — Ele colocou as mãos nos bolsos do roupão. — Você escreveu isso logo depois dessa cena ridícula que tivemos hoje.

O dia havia sido difícil.

— Não, Áquila. — Ele fechou o caderno. — De novo não.

Com um suspiro, o poeta se afastou, indo para o closet. Diferente do que acontecia normalmente, Áquila sentou-se na cama. Não o seguiu nem saiu do quarto.

— Eu te amo e... esse poema não é sobre nós, mas eu estou cansado, Áquila. — Jogou a roupa que iria vestir sobre a cama. — Preciso falar todo dia como eu te amo. Você simplesmente colocou na cabeça que não, e não importa o que eu faça ou diga... você não acredita em mim. Tudo por causa dessa situação. Me diz, Áquila: se fosse o contrário, se fosse eu que não aguentasse, você deixaria de me amar?

— Não, é claro que não! Já te disse isso!

— Sim, você já me disse, e eu acredito nisso. Então por que diabos você continua com isso? Até meus poemas você acha que são sobre nós, e não são! Eu sou um poeta, eu finjo quando escrevo, a maior parte das vezes! Você sabe disso.

Enquanto Não Me Lembro De Nós | Livro I Onde histórias criam vida. Descubra agora