2 Capítulo : MELISSA

26 3 2
                                    


Idiota.

Era a única palavra que conseguia pensar para me definir nesse momento, enquanto o motorista do aplicativo que havia solicitado para me buscar na sede dos laboratórios Thompson, dirigia pelas ruas molhadas de Londres.

Como pude soltar um comentário tão antiprofissional na frente dos meus futuros chefes? Eles não precisam saber que nutria uma admiração pelo farmacêutico chefe, Ben Thompson, que era uma lenda pelos corredores do curso de farmácia, todos os alunos queriam chegar onde ele estava, com menos de trinta anos havia conseguido ampliar os laboratórios da família, assim como o projeto de distribuição de remédios gratuitos para os necessitados, coordenado pela empresa. Seria uma honra e uma grande oportunidade trabalhar ao lado dele, afinal havia dedicado minha vida apenas ao estudo e esse seria o meu primeiro emprego, o que me deixou nervosa durante toda a entrevista, mas no final tudo deu certo.

Enquanto o carro se movia pelas ruas, foi impossível não lembrar da conversa que tive com Ária, assim que ficamos a sós.

-Espero que você não seja daquelas que desistam na primeira dificuldade. - Ária disse assim que seu irmão saiu da sala feito um furacão sem ao menos se despedir, uma atitude que me deixou confusa.

-Porque desistiria? Sempre quis trabalhar aqui. - expliquei voltando a vê-la e ela suspirou cansada.

-Benjamin, não quer um assistente. Ele acha que pode dar conta de tudo sozinho, justiça seja feita, ele tem dado conta de forma impecável, mas faz anos que meu farmacêutico chefe não sabe o que são férias e queria lhe dar uma folga. Desde que se formou e assumiu os laboratórios, meu irmão não teve tempo para cuidar da própria vida, sinto que lhe devo um descanso. - ela disse pensativa antes de voltar a sua atenção a mim. -Me desculpe por despejar as minhas preocupações em você, senhorita Hastings.

-Me chame de Mel, por favor. E tudo bem, sei como é, também tenho irmãos.

-Você é a mais velha? - ela questionou interessada e sorri negando.

-Sou a caçula, cresci com dois irmãos mais velhos, a nossa diferença de idade é de quatro anos.- disse e Ária sorriu surpresa.

-Sou a mais velha de dois irmãos. Acho que podemos montar um clube, as sobreviventes do universo masculino, o que acha?

-Acho que seria maravilhoso. - disse sorrindo antes de Ária voltar a parte formal da entrevista.

-Senhorita, chegamos. - o motorista disse me tirando dos meus pensamentos e pisquei antes de pegar a minha bolsa, percebendo que a minha echarpe da sorte, presente da minha avó para que a usasse na minha entrevista, havia sumido.

Desesperada, procurei a minha echarpe pelo carro, mas não havia nenhum sinal dela.

-Está tudo bem senhorita? - o motorista perguntou confuso por me flagrar vasculhando o banco de trás do seu carro.

-Sim.- disse triste por ter perdido o meu amuleto da sorte.

Desolada, me despedi do motorista e sai do seu carro caminhando em direção a minha casa.

-Pela sua cara, a entrevista não deve ter sido boa. - meu pai disse preocupado assim que entrei em casa e ele desviou a atenção do livro que lia para me ver.

Assim que fez cinquenta anos, meu pai se aposentou da universidade onde foi professor de literatura inglesa durante anos, desde então, dedicava seus dias a ler grandes peças enquanto provava as experiências culinárias da minha mãe, que dedicou a sua vida a cuidar dos três filhos.

-Diria incomum, mas no final deu tudo certo. - disse suave antes de me inclinar para beijar a bochecha do meu pai. - Só estou triste porque perdi a echarpe que ganhei da vovó.

O LegadoOnde histórias criam vida. Descubra agora