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O TRÂNSITO SURPREENDENTEMNTE, PARECIA estar ao meu favor pela primeira vez na vida. As luzes vermelhas estavam sincronizadas, e as ruas desertas me permitiram chegar em casa em tempo recorde. Eu mal acreditava na minha sorte. Ao entrar no meu apartamento, comecei a me trocar com a rapidez de quem está prestes a subir no palco de uma apresentação importante. Um confortável moletom tomou o lugar das roupas do dia, e me forcei a acreditar que tudo estava sob controle.
No entanto, quando a porta se abriu e meu pai entrou, seguido pela minha mãe, minha fachada começou a desmoronar. Sua presença, como sempre, era imponente, e antes mesmo de eu poder pensar em uma desculpa, minha mãe anunciou que iríamos jantar fora.
- Não podemos só ficar aqui e assistir a um filme? - tentei, em um último esforço.
Ela balançou a cabeça com um sorriso decidido.
- Hoje é um dia especial, vamos jantar fora.
Suspirei, percebendo que não tinha como escapar. Enquanto ajudava minha mãe na cozinha, preparando café, meu celular vibrava insistentemente no bolso do meu short. Cada vez que eu olhava para a tela, o nome "Saul" piscava. O coração disparava, e por mais que eu quisesse ignorar as mensagens, sabia que não conseguiria por muito tempo.
Decidi que responderia mais tarde. Eu sempre fui péssima em esconder minhas emoções, e não poderia arriscar que minha mãe percebesse a tensão que estava sentindo. Mexia nos fios do cabelo e mordia o lábio inferior, lutando para manter a conversa leve.
- Hoje eu almocei com a Kelly, - comentei casualmente, tentando desviar a atenção da ansiedade crescente.
Minha mãe sorriu, espalhando geleia nas torradas.
- Ela me disse que está por aqui.
Eu me encostei no balcão, cruzando os braços, observando-a enquanto a cozinha se enchia com o cheiro adocicado das torradas e do café. O contraste das cores, o brilho da geleia sobre a crocância dourada da torrada, quase me distraía do incômodo que o nome "Saul" continuava a causar.
- E o Sid? - perguntei, curiosa.
- Sim, ele também está. - Ela sorriu de canto, parecendo lembrar de algo engraçado.
Sid, marido de Kelly, sempre me causava uma leve estranheza. Sem a máscara, ele era quase irreconhecível para mim, tão diferente do personagem que encarnava no palco com o Slipknot. Era difícil associá-lo à figura casual que aparecia nos jantares em família.
- Eu chamei eles para irem conosco hoje à noite, - minha mãe comentou casualmente, enquanto arrumava a mesa.
Eu assenti, mordendo a torrada com geleia. A ideia de tê-los por perto me agradava, Kelly sempre trazia uma energia leve, e Sid, com sua aura magnética, tornava tudo mais interessante.
