CAPÍTULO 3 | A FITA

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CALLIOPE

A manhã seguinte amanheceu cinza, como se o mundo refletisse a nuvem de inquietação que pairava sobre minha mente. Eu mal dormira, os poucos momentos em que o sono chegava eram interrompidos por pesadelos sem rosto, uma presença invisível que me perseguia, sussurrando meu nome.

O café da manhã foi um ritual automático. Minha mãe continuava no seu estado apático, mexendo em seu chá sem realmente beber, seus olhos fixos em algo além da realidade. A fita cassete e a carta estavam escondidas dentro da minha bolsa, onde ninguém iria mexer. Eu não tinha coragem de ouvir a gravação ainda. Temia o que poderia encontrar lá. Sabia que era uma covardia, mas algo dentro de mim dizia que aquele era um abismo do qual eu talvez não conseguisse voltar.

A loja abria em uma hora, e eu precisava me preparar. Arrumei meu cabelo, escolhi um vestido simples de cor pastel e passei um pouco de perfume o mesmo que usei no dia em que conheci Noah. O cheiro cítrico misturado ao aroma floral sempre me trouxe paz, mas hoje parecia ter perdido parte de sua magia.

Cheguei à floricultura antes do horário, como de costume.

Laura, minha amiga e ajudante, já estava lá, ocupada com as encomendas de flores. Ela sempre foi uma das poucas constantes na minha vida, alguém em quem eu podia confiar, apesar do peso que ambas carregávamos.

Ela me lançou um olhar perspicaz quando entrei.

- Você parece péssima, Callie - Disse ela, largando os lírios que estava organizando. - Noite difícil?.

- Você não faz ideia - Respondi, jogando a bolsa no balcão. - Algo aconteceu ontem... Algo que eu não consigo entender.

Laura franziu a testa, seus olhos atentos me analisando. Ela sempre soube quando algo estava errado, e eu nunca consegui esconder nada dela por muito tempo.

- Callie, o que houve? - Ela deu a volta no balcão, parando à minha frente com uma expressão séria. - Ontem não foi o aniversário da sua mãe?, o que aconteceu de errado?.

Eu hesitei por um momento, considerando se deveria compartilhar com ela as cartas e a fita. Laura era a pessoa mais próxima de mim, mas o que eu tinha em mãos era perigoso. Mesmo assim, eu precisava desabafar com alguém.

- Recebi algo ontem, uma fita cassete e uma carta - Comecei, medindo minhas palavras. - Era de alguém... alguém que não conheço, mas que parece saber muito sobre mim, principalmente meu endereço.

Laura ergueu uma sobrancelha.

- O que?, seu endereço? - Perguntou chegando mais perto de mim. - E você ainda não ouviu a fita?.

Neguei com a cabeça olhando para o chão, não conseguia olhar para ela.

- Tenho medo do que vou encontrar.

Ela cruzou os braços, seu olhar se tornando mais intenso.

- Callie, isso parece sério. Você precisa descobrir o que está acontecendo antes que seja tarde demais. Não pode simplesmente ignorar. - Seu tom era firme, mas havia uma preocupação genuína por trás. - Temos que ir a polícia.

A palavra "polícia" fez meu estômago se revirar. A última coisa que eu queria era envolver a polícia nisso, expor meus medos, tornar tudo público.

- Polícia, não. Não quero que isso se torne um escândalo - Movi as mãos com um gesto nervoso, tentando encontrar uma solução que não envolvesse chamar atenção

Laura assentiu, mas seu olhar permaneceu preocupado. Ela sabia que eu estava apavorada, mas também sabia que, uma vez decidida, não havia como me fazer mudar de ideia.

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