· Escoltomo

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Suguru Geto

Deixando cair a cabeça nas mãos, pressiono as palmas nas órbitas dos olhos, criando caleidoscópios de manchas de cor na minha visão.

Uma veia na minha têmpora lateja dolorosa e loucamente, enquanto me
debruço na lista de possíveis endereços IP do culpado pelo pen drive, ficando mais agitado com a incompetência da Ivers em encontrar a pessoa.

Hoje de manhã, apareceu um terceiro pen drive, a mesma filmagem granulada não atribuída à minha segurança de última geração, mas filmada com a câmera de uma pessoa de fora.

Shoko o trouxe com o correio, e quando o liguei ao computador, encontrei a prova em preto e branco de quando expus a alma ao meu homem, ambos nus no mar.

De alguma forma, em comparação com os outros que nos pegaram no meio de atos lascivos, este parecia mais íntimo. Mais revelador.

Mais proposital.

Só não consigo entender por que esses vídeos estão aparecendo.

Se fosse para me expor à imprensa, por qualquer número de crimes que eu tinha expurgado do meu registro ao longo dos anos, é provável que já teriam vazado.

Se fosse obra de Rafe, tenho dificuldade em imaginar por que ele concordaria em me dar Satoru, rescindindo o contrato com a Bollente Comunicações e fodendo o império criminoso medíocre que ele construiu.

Mesmo que seu nome não tenha tanto peso em Boston quanto antes, ainda não o vejo recorrendo à autossabotagem e tentando me extorquir no processo.

Inclinando-me para trás na cadeira do escritório, encaro o teto abobadado, perdendo-me em pensamentos durante vários minutos. A casa está silenciosa esta noite, Satoru tendo se deitado com uma nova cópia de “Um teto todo seu” da Virginia Woolf que ela comprou na única livraria da ilha.

Pela primeira vez em muito tempo, coloco a mão debaixo da cômoda, passando pela pistola presa logo acima da minha coxa e arranco a Polaroid colada com fita adesiva na parte inferior.

Ao contrário da amassada e velha que mantenho comigo de Violet, é tão raro esta ser manuseada que ainda está em ótimas condições; as bordas permanecem retas, as cores na própria imagem apenas um pouco deformadas devido ao tempo. Fora isso, é como se a foto tivesse acabado de sair da câmera.

Minha mãe está sentada em uma cama de hospital, uma bandana rosa bem amarrada na cabeça, porque ela tinha acabado de começar a perder o cabelo depois de reiniciar os tratamentos de quimioterapia.
Ela está tirando pudim de chocolate de um copo de plástico, olhando para quem está atrás da câmera, mas o sorriso dela é para mim. Mesmo sentada ali, seu corpo se consumindo de dentro para fora, ela está tentando me garantir que está tudo bem.
Que vai ficar tudo bem.

Esse é o amor de uma mãe — as enfermeiras diziam às vezes, porque
manter o alto-astral ao tentar combater uma doença terminal não é algo que
todos possam fazer, ano após ano, dia após dia. E, no entanto, ela fez questão de, sempre tentar me fazer ver o lado bom das coisas.

Aquele sorriso grande e dentuço dela causa uma dor dentro de mim que não me deixo sentir há anos, e uma nova dose de vergonha se injeta em minhas veias, porque não consigo parar de pensar em como ela ficaria decepcionada com o jeito que minha vida está.

Parece que você viu um fantasma.

A voz de Satoru me puxa da minha introspecção, e eu me levanto, endireitando a coluna quando ele entra no escritório. Ele se aproxima, sentando-se no meu colo antes que eu consiga pedir.

-» Devotion / SatosuguOnde histórias criam vida. Descubra agora